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Famílias do campo despejadas pelo poder privado dobram em 2007

Comissão Pastoral da Terra (CPT) divulga dados parciais dos conflitos no campo. Famílias expulsas da terra por agentes privados e número de envolvidos em conflito por água dobraram; mortes e ocupações diminuíram

A Comissão Pastoral da Terra (CPT) divulgou, nesta segunda-feira (10), o relatório parcial do caderno "Conflitos no Campo Brasil 2007", com dados de janeiro até setembro deste ano. As famílias expulsas da terra pelo poder privado e o número de pessoas envolvidas em conflitos pela água mais do que dobraram entre 2006 e 2007. Os conflitos exclusivamente por terra, as ocupações e os assassinatos no Brasil rural diminuíram nos dados comparativos até setembro.

O maior aumento de expulsões por agentes privados se deu na Região Sul: de 49, em 2006, para 710, em 2007 (de um total de 2.711 desocupações no país todo neste ano; ante 1.317 em 2006). No Centro-Oeste, o número saltou de zero para 318 famílias. A Região Norte continua a ser a campeã em expulsão de pessoas pelo poder privado, com 757 famílias – em 2006, foram 714.

José Batista Afonso, membro da coordenação nacional da CPT, considera que o aumento de ações privadas está vinculado à situação de desamparo estatal. "Quando o governo abre mão de assumir a reforma agrária como política prioritária, deixa as famílias reféns desses grupos ligados ao latifúndio", critica. "Quanto mais as famílias ficam expostas, mais as milícias têm condições para agir." Para ele, a "vista grossa" do aparato de segurança pública e do Judiciário contribui para esse tipo de conflito . "A impunidade nesse tipo de crime mostra que a Justiça opera sempre com dois pesos e duas medidas, quando se trata de trabalhadores sem-terra e fazendeiros."

Grandes obras
O relatório parcial também aponta que a quantidade de pessoas envoilvidas em conflitos por água dobrou de 12.632, em 2006, para 25.919, em 2007. José Batista considera que o aumento se relaciona diretamente à política do governo federal de realizar obras de infra-estrutura de grande porte, como as que estão previstas no Programa de Aceleração do Crescimento (PAC). "Se analisarmos onde estão localizados esses conflitos, veremos grandes empreendimentos voltados para o agronegócio", pontua.

Dos 40 conflitos computados pela Pastoral da Terra, 42,5% estão em estados banhados pelo Rio São Francisco, que está no epicentro da polêmica obra de transposição para abastecimento do Nordeste Setentrional. "Toda essa política de transposição e expansão de monoculturas, que tem necessidade de utilizar cada vez mais a água e outros recursos, provoca o surgimento de novos conflitos. É como o trabalho escravo, que continua sendo uma violência presente principalmente nos estados de expansão agrícola", sentencia.

Refluxo
Na opinião da CPT, a queda no número de mortes – de 39 para 25 casos – não é resultado da política agrária oficial. Para a instituição, a diminuição dos assassinatos está ligada à redução de ocupações de terra, que costumam expor os camponeses à violência por parte do Estado ou do poder privado.

O menor número de ocupações, na opinião de Batista, se deve principalmente a três motivos. De um lado, a postura do governo em não priorizar a reforma agrária traz decepção e desânimo aos trabalhadores rurais sem-terra, que não vêem resultado em seus instrumentos de pressão. Por outro, a postura do governo, de dialogar com os movimentos e negociar pequenas mudanças, também acaba por impedir mais ocupações. Por último, ele lembra a ligação que os movimentos de caráter sindical têm com o Partido dos Trabalhadores (PT). "Muitas lideranças são próximas do PT ou filiadas. Também por esse motivo percebemos uma certa acomodação", conclui.

O caderno "Conflitos no Campo Brasil 2007, com dados completos até dezembro deste ano, deve ser lançado em abril de 2008.

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