O auditor fiscal do trabalho Valdiney Arruda é o novo titular da Superintendência Regional do Trabalho e Emprego do Mato Grosso (SRTE-MT). Ele está na profissão desde 1996 e tem histórico na luta contra o trabalho escravo: atuou como coordenador de ações do grupo móvel de fiscalização do Ministério do Trabalho e Emprego (MTE) e ajudou a fundar a Comissão Estadual de Erradicação do Trabalho Escravo (Coetrae) do Mato Grosso, que busca implementar o plano estadual contra esse tipo de crime.
O superintendente, que assumiu o posto em 20 de junho, já tem algumas metas. A principal é dar condições para que os 92 novos auditores do Mato Grosso, que começaram a trabalhar no início deste ano, possam agir para a erradicação do trabalho escravo e infantil. "O papel do superintendente nesse processo é de ser um facilitador, articulador entre diversos órgãos estaduais para que possamos dar resposta ao decreto [presidencial, que possibilitou a contratação dos auditores] com eficiência e eficácia".
Outra "resposta" prevista pelo superintendente consiste no fortalecimento da atuação dos fiscais do trabalho no interior do Mato Grosso. No norte do estado, área de fronteira agrícola, há uma forte demanda por ações fiscalizatórias, sobretudo acerca de denúncias de trabalho escravo na pecuária. Por falta de auditores, muitas delas deixaram de serem atendidas. Apenas em 2007, o Ofício de Alta Floresta (MT), por exemplo, coordenou pelo menos dez operações de fiscalização acompanhado apenas de força policial.
Valdiney prevê inclusive instalar uma agência do MTE em Alta Floresta (MT). "O estabelecimento de uma agência também facilita a implementação de políticas públicas de trabalho e emprego, que é outra das funções que tenho de exercer como superintendente".
Segundo Valdiney, o reforço no contigente já tem permitido que a demanda seja atendida, "sem contar as denúncias velhas". Desde maio, a SRTE-MT se deslocou para averiguar a totalidade de chamados realizados, no campo e na cidade. "O intervalo entre a chegada da denúncia e a ação de fiscalização é o tempo burocrático que se leva para reunir a Polícia Federal e a Procuradoria [Regional do Trabalho] e montar o grupo".
Também faz parte das metas da gestão de Valdiney Arruda a promoção da "agenda do trabalho decente" no estado. "O Mato Grosso ainda está estigmatizado por ser o segundo lugar no ranking no trabalho escravo. É primordial que estejamos na agenda do trabalho decente", justifica. Ele frisa, no entanto, que essa elaboração terá que ser um movimento da sociedade.
Negociações
A construção de políticas públicas também depende da articulação com o governo estadual de Blairo Maggi (PR), fazendeiro identificado com a defesa dos interesses do agronegócio que comanda o estado desde 2003. Em 2006, antes de sua reeleição, o governador prometeu elaborar o plano de erradicação do trabalho escravo do estado, que ainda não foi lançado. Até aqui, os principais avanços com relação ao plano podem ser creditados mais aos esforços da sociedade civil do que propriamente ao governo estadual.
Contudo, Valdiney se mostra otimista com relação às parcerias que podem ser desenvolvidas. "Pretendo agir da mesma forma que agimos quando construímos a Coetrae-MT. Iniciamos uma negociação com o governo e fomos propositivos", exemplifica. "A Coetrae agora se reúne, está constituída oficialmente. Ainda não tem o funcionamento ideal, mas já é um avanço".
"Dentro do governo estadual nós temos aliados, pessoas sensibilizadas com o tema do trabalho escravo", completa o superintendente. "Hoje eu vejo que ele [Blairo Maggi] também assume o papel de Estado, não é [apenas] o poder econômico no poder", pondera. "Essa negociação não será fácil, mas não temos mais saída: ou assumimos que não queremos mais essa mancha do trabalho escravo e infantil ou vamos ter que conviver com ela. Temos que chamar essa posição de Estado do governador para limpar essa mancha".
Para assumir o cargo, Valdiney Arruda deixou a chefia da fiscalização rural da SRTE-MT. Também se licenciou da presidência da Associação Matogrossense de Auditores Fiscais do Trabalho (Amafit) e de seu cargo na atual direção do Sindicato Nacional dos Auditores Fiscais do Trabalho (Sinait).
Mudança
A nomeação de Valdiney Arruda para a SRTE-MT foi surpresa até para os movimentos sociais, que pleiteavam o cargo para um auditor fiscal de carreira, mas já aguardavam nomeações de fora do quadro funcional. Até meados de abril, o cotado para assumir o posto era Rodrigo Rodrigues, quadro do PDT matogrossense e assessor parlamentar do deputado estadual e empresário rural Otaviano Pivetta (PDT), outro defensor do agronegócio no estado. Pelo menos em outros dois estados críticos com relação ao problema da escravidão contemporânea – Pará e Tocantins – o ministro Carlos Lupi nomeou quadros diretamente ligados ao seu partido, o PDT, para o comando das superintendências. No caso do Pará, houve até um pedido de exoneração de Fernando Coimbra por parte do Sinait em função do caso Pagrisa.
Rodrigo Rodrigues chegou a se comprometer com o combate à escravidão, em reunião informal com entidades do Fórum Estadual pela Erradicação do Trabalho Escravo. No início de abril, a escolha do pedetista era dada como certa. No entanto, ele desistiu da posição, em carta entregue ao ministro do Trabalho e à Casa Civil. Segundo o documento, sua abdicação tem origem em compromissos assumidos junto ao gabinete do deputado Otaviano Pivetta.
Com a posição novamente em disputa, o Fórum iniciou então uma campanha pela nomeação de Valdiney Arruda. Foi feito um trabalho de convencimento na Assembléia Legislativa do estado a favor do auditor de carreira. "Toda essa articulação mudou em três semanas", lembra o novo superintendente. Ele ressalta que o Sinait também teve peso político relevante na decisão do MTE. "O ministro assumiu o nome e fez a indicação. No final, a palavra é dele e acho que pesou a escolha de uma pessoa comprometida com a causa".
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