A Repórter Brasil está sob censura judicial desde o dia 9 de outubro de 2015. Saiba mais.

Juiz condena 27 em processos por trabalho escravo no Pará

Em iniciativa inédita, o juiz Carlos Henrique Haddad, da Vara Federal de Marabá, julgou 32 processos de trabalho escravo e condenou 27 pessoas. Um único fazendeiro da região foi condenado por dois processos diferentes

De uma só vez, julgamentos em bloco de 32 casos de trabalho escravo resultaram na condenação de 27 réus na Vara Federal de Marabá (PA). Trata-se de uma iniciativa inédita do Poder Judiciário no sentido de agilizar processos dessa natureza em primeira instância. Em 2008, o Pará foi o segundo Estado com maior número de pessoas libertadas no país, com 811 de um total de 5.244, de acordo com a Comissão Pastoral da Terra (CPT).

As sentenças foram assinadas pelo juiz federal Carlos Henrique Borlido Haddad e divulgadas nesta quarta-feira (4). No total, 24 réus foram sentenciados pelo crime de redução à condição análoga à de escravo, previsto no Artigo 149 do Código Penal. Em seis processos, três réus foram absolvidos da acusação de  trabalho escravo, mas acabaram condenados por outras infrações.

“A opção por julgá-los `englobadamente` foi para agilizar os processos e ter uma percepção melhor dos casos, que eram bastantes similares. Assim, não há penas incongruentes”, explicou o magistrado à Repórter Brasil.

Outro fator fundamental para destravar os processos foi a definição de um imbróglio jurídico. O Supremo Tribunal Federal (STF) definiu a competência da Justiça Federal para julgar casos de trabalho escravo. Antes disso, os processos ficavam paralisados ou transitando entre a Justiça Federal e a Estadual. Para Carlos Henrique, o posicionamento do STF permitiu que os processos de escravidão possam progredir com mais celeridade.

Em entrevista à Repórter Brasil em maio do ano passado, o juiz Carlos Henrique apontou outro motivo substantivo para a aceleração dos processos sobre exploração de mão-de-obra escrava. “Tudo decorre da ênfase dada às fiscalizações pelo Ministério do Trabalho e Emprego nos últimos anos. O trabalho do grupo móvel, traduzido nas ações dos procuradores do Ministério Público do Trabalho, gerou mais processos na Justiça. A fiscalização mais intensa possibilita que haja mais decisões e punições em casos de trabalho escravo”. Naquela ocasião, o juiz adiantou que dezenas de decisões referentes ao crime de trabalho escravo iriam ser concluídas nos próximos meses.

“Atualmente há outros processos de trabalho escravo aqui na Vara de Marabá, mas ainda não estão prontos para serem julgados. Provavelmente julgaremos o maior número possível de casos para continuar agilizando os processos”, informa o magistrado da Vara Federal de Marabá.

Entre os condenados, há donos de propriedades onde os crimes foram flagrados, mas também há funcionários e os agenciadores de mão-de-obra, os “gatos”. As penas variam: alguns acusados foram sentenciados a dez anos de prisão, e outros a pouco mais de três anos. A todas as sentenças cabem recursos ao Tribunal Regional Federal da 1ª Região, em Brasília (DF).

Ao julgar o processo de João Andrade Barroso, que foi absolvido, o juiz conclui que uma equipe de fiscalização do Ministério do Trabalho e Emprego (MTE) “atuou, senão de maneira leviana e arbitrária, de forma equivocada”. A sentença diz ainda que Barroso e Nestor de Jesus Corrêa, uma das testemunhas, afirmaram que os servidores do MTE não lhes permitiram falar nada, quando foram chamados a prestar esclarecimentos sobre supostos ilícitos que teriam sido cometidos na Fazenda Urtigão.

O juiz mandou remeter uma cópia da sentença, do relatório de fiscalização, da denúncia e da prova oral ao corregedor da Secretaria-Executiva do MTE, Ivando Pinto da Silva, “a fim de apurar a conduta dos servidores que integraram a equipe de fiscalização”. Determinou ainda que os mesmos documentos sejam encaminhados à coordenadora nacional do grupo móvel de fiscalização e secretária de Inspeção do Trabalho, Ruth Beatriz Vasconcelos Vilela, “para que tome ciência dos fatos ocorridos nestes autos.”

O fazendeiro Wilson Ferreira da Rocha foi sentenciado a nove anos, em dois processos diferentes. Um deles foi gerado por uma autuação de 2003, quando foram resgatados 23 trabalhadores que, sob condições degradantes, operavam fornos de carvão, em sua fazenda, no município de Goianésia (PA). Wilson Ferreira Rocha fornecia o produto para a Companhia Siderúrgica do Pará (Cosipar), que, em um acordo com o MPT, pagou R$ 1 milhão de indenização em 2005. Ele figurou na “lista suja” do trabalho escravo de 2004.

Confira a lista dos condenados (por trabalho escravo ou outros crimes) e a pena

Jerônimo Aparecido de Freitas, condenado a 3 anos e 9 meses de prisão.
Francisco Sérgio da Silva Siqueira, condenado a 4 anos.
– Marco Antonio Chaves Fernandes de Queiroz e José Fernandes de Queiroz, condenados e 6 anos
– Oseon Oseas de Macedo, condenado a 6 anos
– Valdemir Machado Cordeiro, condenado a 4 anos e 8 meses
– Paulo César de Oliveira, condenado a 6 anos
Humberto Eustáquio de Queiroz, condenado a 4 anos.
– Erismar de Faria Salgado, condenado a 4 anos
– Cezar Augusto de Oliveira, condenado a 5 anos e 4 meses
– Manoel Clementino Teixeira, condenado a 3 anos e 4 meses
– Francisco Vitalino de Oliveira Franco, condenado a 5 anos
Valdemar Rodrigues do Vale, condenado a 3 anos e 9 meses
– Fábio Oliveira Ribeiro, condenado a 4 anos e 8 meses
– Milton Martins da Costa, condenado a 5 anos e 3 meses
Walderez Fernando Resende Barbosa, Antônio Vieira de Sá e José   Aparecido Mendes Paulo, condenados a 8 anos e 3 meses
– Rubens Francisco Miranda da Silva, condenado a 4 anos
– Magnon Coelho de Carvalho, condenado a 6 anos
– Joyce Anne Ramalho, condenado a 3 anos e 4 meses.
– Raimundo Rocha Martins Filho, condenado a 5 anos e 5 meses e 10 dias
– Vicente Medeiros, condenado a 6 anos, 6 meses e 22 dias
– José Régis da Silva, condenado a 10 anos e 6 meses.
– Rogério Queiroz de Araújo, condenado a 3 anos e 9 meses.
– Reinaldo José Zucatelli e Helmo Oliveira Lima, condenados a 6 anos e 9 meses (foi absolvido da acusação de trabalho escravo)
Wilson Ferreira da Rocha, condenado a 3 anos e em outro processo a 6 anos

Notícia relacionada:
Juiz anuncia “pacote” de decisões sobre casos de escravidão


Apoie a Repórter Brasil

saiba como

4 Comentários

  1. Gilberto Toledo Garcia de Ameida

    “Alguns juízes são absolutamente incorruptíveis. Ninguém consegue induzi-los a fazer justiça.” (Bertolt Brecht), ainda bem que o Brecht não generarizou, o Esxelentismo justo Juíz embora cumprindo sua obrigação merece eternos aplausos. É pena que a venal mídia é omissa, quando assuntos que retratam escravidão do homem pelos homens que dão lucros também a essa mídia pervesa, que não estampam nas suas vitrines um fato de coragem fora da esfera da nossa justiça injusta ,que usa vendas transparentes e sempre declina para o prato da balança onde estão os talentos de ouro.Se o Juiz estivesse envolvido em corrupção ou escândalo sexual, decerto que a mídia já o teria crucificado .

  2. Pedro A Dias

    É preciso ampliar uma decisão desta. Chamemos os responsáveis também pela anarquia no campo, os descamisados e famintos e os maltratos escancarados diariamente na midia em relação aos atendimentos na rede pública de saude de nossa amada nação…

  3. zepires

    O bom, seria que os fazendeiros que se utilizam de trabalho escravo tivessem que idenizar os trabalhadores com terra a base de 100Ha por cada escravizado (deveria haver lei nesse sentido…). Punir tais situações com prisão ao meu ver é medida inócua haja vista que o apenado alega “Nivel Superior” e quando não, a própria lei termina por beneficia-lo diante do “bom comportamento”, “residencia fixa”, “liberdade condicional” não “representante” de risco para a sociedade” entre outras coisas previstas no Código Penal, que parece existir para beneficiar determinado tipo de criminoso.
    zepires

  4. ANDERSON KENNETH

    Eu acho a forma de punição muito injusta, falo por ver meu PAI Francisco Vitalino de Oliveira Franco em uma situação injusta. Só por não ter estudo e não saber sobre assinar cartira dos trabalhadores, mas ele foi uma pessoa que sempre pagava os salários em dias, além disso dava bezerros de presentes, doações de lotes para pessoas carentes, locais para fazer igrejas, sempre tratando todos funcionários muito bem. Ai chega esse pessoal da lei nas terras para fazer vistorias, simplesmente porque os trabalhadores não tem carteira, já vem alegando trabalho escravo. É tanto que tem funcionários que estavam com meu pai quando eu tinha 5 anos que trabalham lá com ele até hoje aos meus 34 anos, e esse foi um dos que falaram bem dele nas audiências. Mas mesmo assim a justiça continua fazendo tudo errado. Fazer o que, alguém tem que pagar pelos errados…

Trackbacks/Pingbacks

  1. Combate Racismo Ambiental » Quem são os pecuaristas da ‘lista suja’ da escravidão? - [...] Justiça Os responsáveis pelo crime de submeter pessoas à escravidão, previsto no artigo 149 do Código Penal, aparecem, com frequência,…