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Trabalhador rural é submetido a 20 anos de escravidão

Outros 5 trabalhadores também foram libertados graças à denúncia do filho de um deles à Superintendência Regional do Trabalho e Emprego do Espírito Santo. Ninguém recebia salário. Dono fornecia álcool para "prender" grupo

Um agricultor de 55 anos permaneceu duas décadas de sua vida em condições análogas à escravidão. Ele trabalhava sem descanso semanal, sem receber salários, em troca de comida e bebida alcoólica. Outros cinco trabalhadores viviam na mesma situação – alguns há quatro, cinco e sete anos. Eles foram libertados da Fazenda Jerusalém, no município de Alegre (ES), pela Superintendência Regional do Trabalho e Emprego do Espírito Santo (SRTE/ES), em ação conjunta com o Ministério Público do Trabalho (MPT) e a Polícia Federal (PF). A fazenda pertence a Peris Vieira Gouveia.

A fiscalização foi motivada pela denúncia do filho de um dos libertados. O grupo de empregados era composto por negros, uma pessoa com deficiência visual parcial e um homossexual – grupos que já sofrem preconceitos e discriminação na sociedade. "Visivelmente são pessoas excluídas da sociedade. Ali encontraram um espaço de exploração perversa, mas onde podiam, ao menos, comer", relata Afonso Celso Passos Gonçalves, auditor fiscal do trabalho que coordenou a ação na propriedade capixaba.

Os trabalhadores eram dependentes de álcool, que era fornecido pelo empregador, principalmente nos finais de semana. O auditor fiscal descreve que a fiscalização chegou por volta das 6h da manhã de segunda-feira (16), e constatou que os empregados ainda estavam dormindo. Afonso lembra que isso "não é muito comum para quem desenvolve atividades rurais".

"O proprietário se aproveitava da dependência dos empregados para mantê-los no trabalho. Isso ficou evidente", completa. O dono de um mercado próximo à Fazenda Jerusalém relatou aos fiscais que Peris Vieira comprava muitas garrafas de cachaça com freqüência.

O fazendeiro foi preso em flagrante pelo delegado da PF de Cachoeiro do Itapemirim (ES), pelo crime de redução de vítimas à condição análoga à de escravos, previsto no Art. 149 do Código Penal. Ele continua preso, segundo informações da PFl e da 2ª Vara Federal do Espírito Santo.

O salário era uma mera promessa. A fiscalização encontrou mais de dez cadernos com anotações das dívidas dos empregados, que nunca receberam um pagamento pelo trabalho realizado. Os funcionários dormiam no chão de um barraco. No local, não havia sanitários ou instalações elétricas. A água utilizada pelos empregados não era potável. Os fogões a lenha ficavam no mesmo ambiente onde dormiam. Eles não tinham Equipamentos de Proteção Individual (EPIs) e realizavam as atividades descalços e sem camisa. Os trabalhadores eram responsáveis por capinar, plantar e colher o café, além de cuidar de 30 cabeças de gado.

O proprietário disse que mantinha uma relação de amizade com os empregados e apresentou contratos de parceria com assinaturas reconhecidas em cartório. Oa auditor fiscal adverte, porém, que esses documentos não têm valor legal. "Era só um papel, que ele pensou ser uma garantia. Os trabalhadores disseram que o contrato nunca foi cumprido", conta Afonso Celso. Apesar das negativas, os fiscais estimam que os trabalhadores podem ter sofrido maus tratos (físicos e psicológicos) do empregador.

Os trabalhadores não receberam as verbas rescisórias porque Peris Vieira disse não ter condições de efetuar o pagamento. O procurador do Trabalho Djailson Matos Rocha entrou com as medidas para bloquear os bens do fazendeiro. "Na hora da fiscalização, o proprietário não apresentou condições para pagar os empregados. Então, entrei com uma liminar para bloquear as contas bancárias, além de requerer o arresto dos bens do fazendeiro", conta o procurador. Peris possui outras sete propriedades rurais.

A SRTE/ES está providenciando Carteiras de Trabalho e da Previdência Social (CPTS) aos libertados. Alguns não tinham sequer registro de nascimento.

A Superintendência Regional do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) no Espírito Santo pediu, na semana passada, as certidões da Fazenda Jerusalém ao Cartório de Imóveis de Alegre (ES). Também solicitou o encaminhamento da documentação relativa à fiscalização ao MPT, para que seja anexado ao processo administrativo. 

Segundo informações do Incra, estão sendo feitos levantamentos administrativos para efeito de vistoria no imóvel a fim de iniciar um processo para a desapropriação da Fazenda Jerusalém pelo não cumprimento da função social da terra. De acordo com o procurador Djailson, que enviou a documentação para o Incra, a prioridade é assentar os libertados.

Após a fiscalização, o procurador do Trabalho encaminhou as vítimas para a Secretaria de Ação Social, do município de Alegre (ES). Porém, a prefeitura entregou uma quantia em dinheiro aos trabalhadores para que voltassem a seus lares. No entanto, os libertados acabaram gastando o dinheiro com bebidas e permaneceram na cidade. Quando a SRTE/ES precisou falar com o grupo para providenciar os documentos que faltavam para dar entrada no Seguro Desemprego, descobriu a situação. A Secretaria de Ação Social foi novamente acionada para que encontrasse os trabalhadores.

A Repórter Brasil entrou em contato com a Secretaria de Ação Social, que informou já ter providenciado uma casa, além de ter destacado assistentes sociais para atender as vítimas. A secretaria se comprometeu a encaminhá-los para tratamento da dependência de álcool.


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17 Comentários

  1. Albert Fiuza de Azeredo

    Bom dia !

    É com pesar que leio uma matéria como esta em pleno século XXI e ao mesmo tempo como muita alegria por saber que ainda existem Instituições e pessoas sérias no combate a tais atrocidades. Por quase dois anos atuei como Téc. Seg. Trab. na Lasa e na Verdebrás ambas situadas em Linhares e pude constatar que a Sub-DRT daí é atuante e respeitada, o que infelizmente não acontece em minha cidade – Campos do Goytacazes – RJ. Prova disto é que sou profissional a quase 12 anos e até hoje, não tive o prazer de atuar aqui, devido a diversos fatores, entre eles o desrespeito a nossa Classe que visa implantar o Prevencionismo. Aqui existem mais de 100 Olarias, teriam escravos também ?

  2. Hamilton Caldas Silva

    Favor divulgar se esse cidadão é somente fazendeiro ou é politico, magistrado, advogado.

  3. Humberto Capellari

    Fiquem calmos! O Sentinela da Justiça Gilmar Mender vai dar um jeito de enfiar o fazendeiro atrás das grades…

  4. Antonio José

    Pode até haver falhas, mas em tempo algum em nosso País o Ministério do Trabalho e a Justiça do Trabalho com a Polícia Federal dedicaram tanto esforço para coibir e punir crimes dessa natureza. Não se pode tolerar que o homem explore o homem pela escravidão. A corrupção é uma chaga que degrada o mundo mas não se pode tolerar essa chaga. Parabens aos Órgãos que investigam a corrupção em todas as áreas e as tornam públicas para a Sociedade conhecer aqueles que tem de ser excluidos de funções publicas, processados e criminalizados por seus atos.

  5. Nabor

    Espero que este, não seja mais um caso de injustiça e impunidade. Em que o réu vira inocente e o inocente reu, áh, é bom relembrar: onde está o Protógenes? E os bandidos lavadores de dinheiro público? será que o dinheiro já secou?

  6. Gilberto Toledo Garcia de Almeida

    É assustador o crescimento de ex-escravos nos últimos anos em nosso Brasil, diante dessa evidência, aconselho ao caridoso e inebriante falante Presidente Lula, a instituir um cadastro nacional de ex-trabalhadores escravos para que também tenham direiro às bolsas família e gás como também às bolsas caninha ou então uma polpuda aposentadoria isenta do leão; com essa sacada Presidente! seu vox populi chegaria perto de 100% – seria uma outra boa extratégia eleitoreira; afinal aproxima-se tempo de eleição e os petistas não podem perder mais uma boa oportunidade de atrair os votos desses pobres incultos que não sabem votar – ou melhor falando, trocam seus votos por alguns quilos de ração.

  7. Maria Suely Pinheiro Alves dos Santos

    Felizmente temos os valorosos e corajosos Auditores Fiscais do Trabalho que junto com a PF e o MP estão agindo para um dia estas questões vergonhosas para o Brasil fiquem apenas no passado.

  8. Everaldo Lopes

    Gente, o presidente Lula não tem nada a ver com o trabalho escravo, muito pelo contrário, ele esta dando condições, todas para que tais situações venham a ser descobertas, agora, porqeu antes nos governos do passado, não havia condições dos briosos Auditores Fiscais do Trabalho realizarem o seu trabalho com a dignidade e condições que possui hoje no Governo do presifdente Luís Inácio LULA da Silva. O mundo esta olhando para o Brasil como uma potência no cenário internacional. Vamos, SIM, acabar com o trabalho escravo neste país.
    Everaldo Lopes – recife/PE

  9. Adilson Spíndola

    Sr. GILBERTO TOLEDO GARCIA DE ALMEIDA por favor nos diga, o Sr. é político ou fazendeiro?

  10. Elizete aparecida lembo

    Lendo este boletim fui sentindo nas colocaçoes das açoes desenvolvidas pelos responsaveis da atuação, a fragmentação das açoes e o cumprimento das responsabilidades deixam a desejar. O sistema é todo compartimentalizado, mas as atitudes não deveriam ser. È lamentavel essa situação na qual estamos inseridos.

  11. Justina Santana-Ba

    Para tal situação vale o provérbio: quem do pouco se adimira corra mundo que ver mais, infelizmente neste Brasil ainda existe empregador com postura irracional-desumana l com seus subordinados. Ainda trmod muito que avança no que tange aos direitos do cidadão. Srá se os responsáveis pelos Direitos humanos também estam verificando estas coisas? ou só estam nos présidios ?????????

  12. Justina Santana-Ba

    Para tal situação vale o provérbio: quem do pouco se adimira corra mundo que ver mais, infelizmente neste Brasil ainda existe empregador com postura irracional desumana com seus subordinados. Ainda temosa muito que avançar no que tange aos direitos do cidadão. Será se os responsáveis pelos Direitos humanos também estam verificando estas coisas? ou só estam nos présidios ?????????

  13. Gilberto Toledo Garcia de Almeida

    Estimado Sr.Adilson, o Repórter Brasil abre esse espaço para comentário da reportagem e, não do ponto de vista do leitor comentarista. Respondo-lhes: não sou político e não tão pouco fazendeiro, apenos sou um Técnico Industrial com quase 4 décadas de esperiencias, trabalhando pelo Brasil a dentro. A minha intenção foi provocar o partido do Presidente, que quer sufocar todas os cargos públicos de relevâncias pelos imcompetentes companheiros. Passa pela minha cabeça de ser político, porém não tenho recursos, conhecendo o meu caráter, não aceitaria vender meu passe político a empresários.Quanto a ser fazendeiro, tenho sonhado em sê-lo, se realmente o fosse, daria preferencias aos ex-escracos.

  14. Giberto Toledo Garcia de Almeida

    Estimado Sr. Adilson, o Repórter Brasil abre esse espaço para comentário da reportagem, e não os pontos de vista do leitor comentarista. Respondo-lhes: não sou político e não tão pouco fazendeiro, apenas sou um Técnico Industrial com quase 4 décadas de experiência, trabalhando pelo Brasil a dentro. A minha intenção foi provocar o partido do Presidente, que quer sufocar todas os cargos públicos de relevâncias pelos incompetentes companheiros. Passa pela minha cabeça de ser político, porém não tenho recursos, conhecendo o meu caráter, não aceitaria vender meu passe político a empresários. Quanto a ser fazendeiro, tenho sonhado em sê-lo, se realmente o fosse, daria preferências aos ex-escravos.

  15. rodrigo de carvalho

    Aqui, no estado do ES, uma grande multinacional do setor sucroalcooleiro vem tratando seus empregados como escravos, como destacou uma reportagem da Folha de São Paulo. Esta situação se repete há anos e até hoje não obtivemos destaque deste “site”. Admiramos demais a postura deste “site” mas não podemos ficar silentes quanto ao fato. Congratulações pelo trabalho

  16. marcos

    me ajudem o q os trablhadores rurais dançao e colhem?

  17. marcos

    oi