Amazônia

Economista defende pecuária intensiva e crédito a pequenos

Guilherme Leite Dias, professor da Universidade de São Paulo (USP), recomenda mudanças urgentes no sistema de criação de gado na Amazônia. Segundo ele, crédito está concentrado em grandes produtores e cooperativas
Kivia Costa
 18/06/2009

"Se deixarmos como está, aqueles bois vão comer a Amazônia em 20 anos". A previsão é do especialista em economia agrária brasileira, Guilherme Leite Dias, e serve como referência da proporção dos impactos negativos que o avanço da pecuária na Amazônia tem trazido para a floresta.

Para o professor da Faculdade de Economia e Administração da Universidade de São Paulo (FEA/USP), o avassalador avanço da pecuária pela Amazônia decorre de uma conjugação de fatores. Em apenas 10 anos, a demanda por carne bovina no mundo aumentou 35%.

Como o Brasil é um dos maiores fornecedores dessa commodity (produto primário padronizado com cotações e comercialização no mercado internacional), recebeu um forte incentivo para aumentar seus rebanhos. E predomina no país a pecuária extensiva, sistema em que o boi fica solto e ocupa grandes porções de terra convertidas em pasto.

Guilherme vê a pecuária intensiva como uma das saídas. O método conhecido como manejo diferenciado inclui medidas simples como a retirada do boi do pasto por um tempo, a fim de deixar o capim crescer, e voltar a trazer o gado para aquele pasto, ao invés de levá-lo para novas terras. Além de conter o avanço dos animais, a prática favorece a engorda do gado.

O aumento da lotação (mais bois numa mesma área), a aplicação de fertilizantes nas pastagens e o suprimento de uma alimentação mineral concentrada ao gado compõem a lista de recomendações do professor da FEA/USP. "Com a pecuária intensiva, há ganho de até 10 vezes em produtividade", afirma Guilherme Leite Dias.

Crédito
Os desencontros de órgãos estatais também não ajudam, complementa o economista. "O Ministério da Agricultura age de cá e o [Ministério] do Meio Ambiente age de lá. Não há interação", pontua o estudioso. 

Ele cita o caso emblemático de uma reunião do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), do qual foi diretor de área de crédito, em que membros do banco perguntavam sem entender "como financiamos tanto frigorífico na Floresta Amazônica?". "Há que ter um lócus para onde os problemas convergem e tratá-los todos juntos", avalia.

O Estado, continua Guilherme, falha em sua política de concessão de créditos. "Há um problema muito grande de concentração de crédito. Aqueles que pegaram muito dinheiro emprestado agora não estão conseguindo pagar. Nossa estrutura de crédito tem uma má herança da época da inflação", coloca, justificando em parte o "receio" do governo na oferta de crédito.

Segundo o especialista, o pequeno produtor depende cada vez mais de terceiros para financiar suas atividades. "Metade do crédito vem da iniciativa privada, do fornecedor de insumos e do comprador de produtos agrícolas". 

Por causa dessas dificuldades, quem tem tido sucesso na agricultura intensiva são os grandes produtores e as cooperativas. "O problema do pequeno produtor com a tecnologia moderna é que ele não pode estar sozinho. O cooperativismo é uma solução e o Brasil tem bons exemplos disso".

Energia
A demanda por alimentos não é a única a aumentar. Com o esgotamento de fontes fósseis de energia (como o petróleo) e com o natural crescimento da população mundial, a procura por combustíveis alternativos é alta. A produção de um deles, o biodiesel, tem crescido na Amazônia e vem se firmando como alternativa de renda para suas populações ribeirinhas.

Mas Guilherme Dias alerta para a atual insustentabilidade da produção desse combustível. "O biodiesel está custando ao governo federal quase R$ 1,3 bilhões em subsídios para comprar óleo vegetal, que é comestível".

Para o especialista, a produção do biodiesel compete com a de alimentos. "O Brasil está tirando a oferta dos oléos vegetais no mercado mundial. A exportação deles caiu 35% para fazer biodiesel subsidiado. Estamos reduzindo a oferta de alimentos para o resto do mundo".

*Estudante de Jornalismo da Escola de Comunicações e Artes da Universidade de São Paulo (ECA/USP). Esta matéria foi elaborada como parte do Projeto Repórter do Futuro, organizado há 15 anos pela Oboré.

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