Ao todo, 75 cortadores de cana-de-açúcar foram encontrados em condições análogas à escravidão no município de Campos dos Goytacazes (RJ). O grupo foi aliciado pessoalmente, em diversas localidades da Bahia e por meio de promessas ilusórias de bons salários e condições favoráveis de trabalho, pelos irmãos Jorge Fernandes Francisco e Amaro Barros Fernandes, que mantinham propriedade de cultivo de cana na região Norte Fluminense.
De acordo com integrantes do grupo móvel de fiscalização e combate ao trabalho escravo, que procedeu o flagrante no último dia 18 de julho, os trabalhadores vivam em condições desumanas desde março deste ano.
Os trabalhadores não tinham a Carteira de Trabalho e Previdência Social (CTPS) assinada pelo empregador. A legislação exige que as carteiras sejam assinadas antes que os contratados deixem suas regiões de origem. Além disso, é preciso requerer a certidão declaratória de transporte à representação local do Ministério do Trabalho e Emprego (MTE) de saída do empregado.
Os descontos irregulares nos salários foram outra irregularidade identificada pelos fiscais. Os irmãos Fernandes descontaram, por exemplo, o valor referente a passagem da Bahia até o Rio de Janeiro. Os cortadores também eram obrigados a pagar pelos equipamentos de proteção individual (EPIs).
Para completar, a dupla de empregadores exigia o pagamento de R$ 90 mensais de cada cortador como uma espécie de "seguro-desemprego" informal. Eles prometiam "devolver" o montante às pessoas quando elas fossem dispensadas, no término da safra de cana-de-açúcar.
As diversas casas que abrigavam os trabalhadores foram alugadas e estavam em péssimas condições. Os trabalhadores também pagavam um valor referente ao aluguel do local. Um grupo de oito trabalhadores dormia em um bar, atrás do balcão. "Essa é uma prática que temos constatado: o empregador não mantêm o trabalhador em alojamentos dentro da fazenda, mas em diferentes casas alugadas em municípios próximos", constata Leandro Carvalho, auditor fiscal do trabalho que coordenadou a ação.
Segundo a fiscalização, os trabalhadores eram ainda obrigados a comprar produtos de alimentação no Mercado Barros, que pertence a José Barros Francisco, outro irmão dos empregadores. Os preços eram superfaturados. O dono do comércio negou que houvesse fraude: disse que não havia pressão para que as compras fossem feitas no local e nem vendia fiado.
As carteiras de trabalho de 34 dos cortadores de cana estavam retidas no escritório do contador Alcidinei Vieira Tavares, que trabalhava para os irmãos Fernandes. O documento só pode ficar 48 horas com o empregador.
A produção da fazenda abastecia a Usina Paineiras S/A, em Itapemirim (ES), conforme o registro de documentos encontrados pelos fiscais. Após o flagrante, os empregadores pagaram as verbas da rescisão do contrato de trabalho e custearam a passagem de volta dos trabalhadores.
O grupo móvel contou com a representação do Ministério Público do Trabalho (MPT) de Campos dos Goytacazes (RJ) e com agentes da Polícia Federal.
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