Imigrantes

Pacto visa promover trabalho digno na cadeia das confecções

Para o auditor fiscal Renato Bignami, sanção da anistia a imigrantes ilegais pelo presidente Lula neste mês criou contexto propício para a melhoria das condições de trabalho de estrangeiros nas confecções de São Paulo
Por Bianca Pyl *
 29/07/2009

Com o objetivo de acabar com o trabalho indigno na cadeia das confecções, ramo que emprega muitos estrangeiros em situação de vulnerabilidade, a Superintendência Regional do Trabalho e Emprego de São Paulo (SRTE/SP) lançou, na última sexta-feira (24), o Pacto Municipal Tripartite Contra a Fraude e a Precarização, e pelo Emprego e Trabalho Decentes em São Paulo.

O acordo começou a ser elaborado em junho de 2007 e contou com a participação de outras entidades e organizações de auxílio aos imigrantes. Ao todo, dez organizações assinaram o compromisso, entre elas a Federação do Comércio em São Paulo (Fecomercio), o Centro Pastoral do Migrante (CPM), o Centro de Apoio ao Migrante (Cami), a Associação Brasileira dos Coreanos, a Secretaria Nacional de Justiça, a Procuradoria Regional do Trabalho da 15ª Região (PRT-15) e a organização não-governamental Repórter Brasil.

Desde junho de 2007, o grupo denominado "Dignidade para o trabalhador migrante" vem se reunindo para a elaboração do pacto municipal. "Durante esses dois anos de negociações, reforçamos a certeza de que a solução para o problema não está nas mãos de uma só entidade", declarou Ana Palmira Arruda Camargo, chefe da Fiscalização do Trabalho da SRTE/SP.

Renato Bignami, auditor fiscal da SRTE/SP, lembrou durante o lançamento que o contexto é propício para a melhoria de condições de trabalho dos imigrantes, por conta da anistia a ilegais sancionada pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva no começo deste mês, já que os trabalhadores encontrados em situação análoga à escravidão sem documentos eram obrigados a deixar o Brasil.

Frentes de ação: critérios, responsabilização e
observatório do migrante (Foto: SRTE/SP)

As entidades que aderiram ao acordo atuarão em três frentes: a promoção da qualidade de vida e de trabalho, do ponto de vista econômico e social, estabelecendo critérios mínimos de legislação, segurança e saúde nos ambientes de trabalho; a responsabilização em casos de inobservância das normas trabalhistas ou outras irregularidades; e a criação do Observatório do Migrante, entidade independente criada para monitorar a condição do migrante em São Paulo e prover as comunidades estrangeiras com informações.

Em contrapartida, as empresas, oficinas e confecções, bem como associações e representantes dos migrantes, comprometem-se a buscar a regularização das situações de forma assistida e orientada. O Ministério do Trabalho e Emprego (MTE) e outros órgãos priorizarão as fiscalizações naquelas empresas que optaram por ficar à margem do pacto e da legalidade.

Apesar da participação em reuniões de elaboração do pacto, grandes magazines não assinaram o compromisso. A Repórter Brasil entrou em contato com as assessorias de imprensa da Riachuelo e Marisa, mas não obteve respostas das empresas até o fechamento desta matéria. Segundo assessoria da Renner*, "a assinatura do pacto depende do esclarecimento quanto aos mecanismos de fiscalização, visto que se trata de uma questão de interesse público". Já a rede de lojas de departamento C&A* informa "que está analisando o conteúdo do pacto bem como a sua participação".

O documento de criação do Pacto destaca a existência de um grande número de estrangeiros indocumentados na cadeia produtiva das confecções paulistas. "Pelo fato de não possuírem documentos nacionais, esses trabalhadores estão em estado de extrema vulnerabilidade que ocasiona o surgimento de focos de trabalho degradante e forçado", destaca um trecho do acordo.

Responsabilidades
A SRTE/SP deve intensificar as fiscalizações, com o apoio das Procuradorias Regionais do Trabalho da 2ª e 15ª Regiões, para identificar fraudes nas contratações, situações de trabalho degradante e/ou forçado e casos de precarização por intermediação ilícita de mão-de-obra estrangeira.

A Secretaria Nacional de Justiça (SNJ) do Ministério da Justiça (MJ) se comprometeu a organizar palestras e cursos relacionados à situação jurídica e a regularização do imigrante e a promover capacitações sobre os temas do tráfico de pessoas e dos direitos humanos, bem como disponibilizar a sua central de atendimento para orientação do público em geral.

A Defensoria Pública da União deverá promover ações no monitoramento da aplicação da Lei da Anistia (Lei nº 11.961/2009) na Delegacia de Polícia Federal. "A defensoria irá defender o estrangeiro. Se necessário, irá ingressar com ações previdenciárias para garantir direitos dos trabalhadores documentados", comprometeu-se o defensor Jânio Urbano Marinho Junior.

O Observatório do Imigrante e do Terceiro Legal terá por finalidade observar pela melhoria constante do meio ambiente de trabalho nas confecções.

A Repórter Brasil fará parte da Câmara Setorial da Cadeia Produtiva do Ramo das Confecções em São Paulo, cujo objetivo será estudar a cadeia produtiva e negociar acordos entre as entidades participantes para melhorar o meio ambiente de trabalho desse setor econômico.

Outras organizações, como o Centro Pastoral do Migrante (CPM) e o Centro de Apoio ao Migrante (Cami), ajudarão na divulgação do pacto setorial e continuarão prestando assessoria jurídica aos estrangeiros.

Condições mínimas
O acordo lista ainda condições previstas na legiação brasileira que deverão ser cumpridas pelos empregadores. Entre elas estão: o registro da Carteira de Trabalho e da Previdência Social (CTPS), repeito à jornada diária de 8 horas, ou 44 horas semanais, fornecimento de Equipamento de Proteção Individual (EPI) em perfeito estado de conservação e funcionamento.

Em muitas oficinas, os trabalhadores imigrantes são submetidos a condições insalubres, em locais pequenos, sem ventilação ou instalações sanitárias. Para melhorar esse quadro, o pacto setorial lista algumas normas que devem ser respeitadas pelos empregadores, como manter o local de trabalho com a altura do piso ao teto (pé direito) de acordo com
as normas de conforto e segurança, disponibilizar um espaço suficiente para trabalho seguro, manter instalações sanitárias separadas por sexo e garantir conforto nas refeições.

*matéria atualizada na tarde desta quarta-feira (29)

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