Com um empurrão decisivo do BNDES, da Petrobras e da Previ, responsáveis pela maior parte dos investimentos no Brasil, a agenda da sustentabilidade começa a ganhar corpo no setor privado
Já faz tempo que as boas empresas investem em políticas socioambientais que incluem não apenas as suas práticas, mas também as de seus fornecedores. Só que, até pouco tempo atrás, quem se preocupava em cuidar do meio ambiente e do bem-estar de seus fornecedores tinha que arcar com custos mais elevados do que os concorrentes – pelo menos esta sempre foi a desculpa de quem preferia destruir em vez de preservar o meio ambiente.
Esta situação já começou a mudar. Órgãos oficiais de financiamento estão pautando seus financiamentos ou investimentos pelas políticas de sustentabilidade das empresas. O que era um custo, agora é uma condição para a empresa conseguir os recursos. "As empresas começaram a perceber que sustentabilidade ambiental está ligada à sustentabilidade da empresa no longo prazo", disse à DINHEIRO o presidente da Previ, Sérgio Rosa. "Como investidor de longo prazo, a Previ se preocupa com o futuro dos negócios dos quais participa", diz ele.
Com uma carteira de R$ 122 bilhões para investir, o fundo de pensão dos funcionários do Banco do Brasil lançou há menos de um mês uma Política de Responsabilidade Socioambiental para nortear os investimentos da Previ a partir de agora. "Não é uma política de exclusão, preferimos uma política de incentivo", diz Rosa. Além da viabilidade dos investimentos a longo prazo, o governo está preocupado com a imagem do Brasil no Exterior. Na imprensa estrangeira são recorrentes as matérias sobre a destruição da Amazônia pelo avanço da agropecuária. A gota d’água foi o relatório "A farra do Boi", divulgado pelo Greenpeace em maio, responsabilizando o governo pela devastação da floresta, que provocou uma mudança de postura no Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), acionista de três dos frigoríficos citados como compradores de carne proveniente de áreas recentemente desmatadas.
Há duas semanas, o BNDES anunciou que os financiamentos para a cadeia produtiva da pecuária serão condicionados ao atendimento de certos requisitos. Os frigoríficos terão de rastrear o gado do nascimento ao abate, elaborar um plano de desenvolvimento socioambiental, verificar a regularidade ambiental de toda a cadeia de fornecedores e ainda apresentar auditorias comprovando o cumprimento das metas. Não há limite de recursos. "Duas das prioridades do banco são a inovação e o desenvolvimento socioambiental", disse o presidente do Banco, Luciano Coutinho, quando anunciou que o banco iria financiar os chips que serão colocados no gado para permitir a rastreabilidade. No primeiro semestre, a agroindústria já recebeu R$ 6 bilhões.
No ano passado, o setor recebeu 17% do total. A nova postura também já chegou à Petrobras. A Petrobras Biocombustíveis tem R$ 5 bilhões para investir em novas usinas ou compra de participações acionárias para incrementar a produção de etanol e biodiesel nos próximos quatro anos. As parceiras têm que aceitar cláusulas que proíbam o trabalho escravo, além de se enquadrar em critérios de segurança, proteção ao meio ambiente, saúde e responsabilidade social. A meta da empresa é chegar a 2013 produzindo 25% do biodiesel e 10% do etanol brasileiro.
"Qualquer investimento que façamos em etanol partirá de dois pressupostos básicos: excelência nas relações trabalhistas e também em questões ambientais", diz o presidente da Petrobras Biocombustíveis, Miguel Rossetto, numa política também adotada pela empresa-mãe, comandada por Gabrielli.
Apesar do impulso governamental, alguns empresários ainda estão desconfiados. "É muito bom saber que o governo agora está fazendo exigências para coibir o desmatamento, mas é muito difícil imaginar que o BNDES não sabia que era sócio de empresas que tinham gado em áreas desmatadas", disse à DINHEIRO o presidente-executivo do Conselho Empresarial Brasileiro para o Desenvolvimento Sustentável, Fernando Almeida.
Ainda assim, ele acha que a mudança é importante. "Não há saída sem a participação do governo", afirma. As empresas, diz Almeida, sabem dos benefícios de uma postura socioambiental para garantir a fidelidade do cliente. Ele considera corajosa a atitude das três maiores redes de supermercado do País – Carrefour, Pão de Açúcar e Wal-Mart, responsáveis por 40% do mercado brasileiro – que deixaram de comprar carne do Pará após o relatório do Greenpeace.
Na semana passada, a Associação Brasileira dos Supermercados (Abras) lançou um programa de certificação da cadeia bovina que deve ficar pronto entre 60 e 90 dias e vai garantir ao consumidor a origem da carne que ele encontra no supermercado. "O consumidor brasileiro é muito bem informado. Quando vê esse tipo de denúncia, ele nos pergunta", disse à DINHEIRO o presidente da Abras, Sussumu Honda.
Pioneira na adoção de uma política sustentável no mercado brasileiro, a Natura testemunhou uma grande mudança no mercado em seus 40 anos de existência. "A Natura já nasceu com essa preocupação. Mas agora o consumidor cobra essa postura das empresas", disse à DINHEIRO o diretor de sustentabilidade da empresa, Marcos Vaz. "A situação se inverteu. As agências de crédito passaram a incorporar exigências e começa a ficar caro não fazer", afirma.
Denize Bacoccina
03/08/2009