Procurador afirma que não vai à reunião agendada no MTE

 07/10/2010

Lilian Grasiela
O procurador do Ministério Público do Trabalho (MPT) em Bauru, Luís Henrique Rafael, declarou ontem que não foi comunicado sobre a reunião agendada pelo Ministério do Trabalho e Emprego (MTE) para amanhã, às 10h, na sede da gerência regional do órgão em Bauru, com objetivo de "afinar" procedimentos e definir estratégias para promover o futuro resgate de trabalhadores encontrados vivendo em condições análogas à de escravos.

O encontro, anunciado pelo gerente regional do MTE, José Eduardo Rubo, foi motivado pela localização, no dia 30 de setembro, pelo MPT, de 15 trabalhadores nesta situação em um sítio em Arealva.

"Os procuradores do trabalho de Bauru não vão comparecer à reunião alguma. A não ser que essa reunião seja realizada no Ministério Público do Trabalho, mas para tratar de assuntos gerais, estratégias de atuação, formas de interligar nossa atividade para que a coletividade trabalhadora seja beneficiada", diz.

"O Ministério Público não tem que dar satisfação nenhuma para o Ministério do Trabalho. Nós temos sim, legalmente, que dar satisfação à sociedade. E, se essa satisfação for dada de uma forma completa, com uma atuação conjunta entre Ministério Público e Ministério do Trabalho, é melhor para o trabalhador".

Segundo ele, o MTE não foi acionado para comparecer ao sítio no dia em que os trabalhadores foram localizados em razão da urgência que a situação demandava.

O procurador revela que foi comunicado do fato por um padre de Arealva na quinta-feira, dia 30 de setembro, quando participava de audiência judicial em Lençóis Paulista. "De imediato, eu me desloquei de Lençóis, com mais dois servidores e um estagiário, e fomos para lá", conta.

"Poderia ser melhor se o Ministério do Trabalho também tivesse atuado em conjunto. Mas, em razão da urgência e da correria que o caso exigiu, nós tomamos as medidas que estavam ao nosso alcance".

Rafael explica que, na sexta-feira, quando retornou a Arealva para colher depoimentos dos trabalhadores e acompanhar vistoria da Vigilância Sanitária no sítio, telefonou para o gerente do MTE para solicitar o resgate dos mesmos, ou seja, sua inclusão no sistema de seguro-desemprego, para recebimento de três parcelas do benefício, com anotação e baixa ex-ofício (fora do prazo legal) em carteira de trabalho.

"Na sexta de manhã, eu liguei na subdelegacia do trabalho várias vezes para falar com o Eduardo Rubo e não consegui falar", diz.

Por volta das 11h, segundo ele, Rubo teria retornado suas ligações. "Ele disse que, como o fiscal não compareceu no dia da constatação do flagrante, ele não poderia fazer (o resgate). Eu argumentei com ele, na época, que havia filmagem de duas emissoras de TV, uma filmagem amadora feita pelo Ministério Público e também os depoimentos que estavam sendo prestados perante o compromisso de dizer a verdade, mas ele disse que não poderia fazer, mas que iria fazer uma reunião a respeito", alega.

O procurador declara que, para que os trabalhadores não sejam prejudicados, vai solicitar por meios judiciais que seus direitos sejam garantidos. "A lei prevê, e o juiz pode determinar, diante das provas do processo, que seja anotada a carteira e eles usufruam do seguro-desemprego", pontua. "Eu entendo que, nesse caso, os trabalhadores não podem ser prejudicados por causa de um entendimento. Mas, de qualquer forma, eu respeito o entendimento e vou levar o caso para o Judiciário".

 

Competências

De acordo com Rafael, o que precisa ficar claro para a população é a esfera de atuação de cada órgão. "O Ministério do Trabalho é um órgão do Poder Executivo que tem a incumbência de fiscalizar, através dos seus agentes fiscais, o cumprimento da legislação trabalhista. É uma atividade administrativa", afirma.

"O Ministério Público é a Promotoria Federal do Trabalho, que tem atividade administrativa e judicial. Ele entra com ações na Justiça para que a legislação do trabalho seja cumprida. Eventualmente, esse trabalho da fiscalização e do Ministério Público é interligado porque a fiscalização documenta muitas irregularidades que, depois, vão ser usadas como prova num processo judicial trabalhista".

Além de solicitar à Justiça a inclusão dos trabalhadores no sistema de seguro-desemprego, o procurador informa que vai ajuizar ação civil pública contra o empreiteiro que os contratou, A.P.L., 24 anos, preso na ocasião por ilegal de arma de fogo, e seu pai E.L., que também faria a intermediação da mão de obra, pedindo o bloqueio de seus bens para que eles sejam vendidos e utilizados no pagamento dos trabalhadores.

De acordo com ele, a fazenda onde os homens trabalhavam na colheita de laranja não foi identificada porque eles informaram que, a cada semana, estavam em um local diferente.

"E o Ministério Público também vai pedir uma indenização pelos danos causados à esfera íntima desses trabalhadores, que foram submetidos à condição análoga à de escravos.

Além disso, o Ministério Público do Trabalho vai fazer uma representação para o Ministério Público Estadual, que é o órgão competente para investigar e prover uma ação penal de combate ao crime de trabalho escravo".

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Trabalho escravo

O procurador do MPT de Bauru, Luís Henrique Rafael, encontrou, no dia 30 de setembro, em um sítio no quilômetro 374 da rodovia Cezário José de Castilho (SP-321), a Bauru-Iacanga, 15 trabalhadores sendo mantidos no local em condições análogas à de trabalho escravo.

O alojamento não possuía armários, despensa e tinha apenas um banheiro para as 15 pessoas, que tomavam banho com água gelada. A alimentação era armazenada de forma inadequada e alguns alimentos foram encontrados em estado de decomposição.

O empreiteiro que, de acordo com as denúncias, ameaçava os trabalhadores com espingarda para que eles não deixassem o sítio, foi autuado em flagrante por porte ilegal de arma de fogo. Com ele, foram apreendidos uma espingarda, cartuchos e munições. O alojamento foi interditado pela Vigilância Sanitária e os trabalhadores abrigados no albergue de Arealva.

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