Com estrutura sucateada, sem viatura, a polícia militar não consegue impedir exploração
Monica Prestes
Abandonadas pelos pais e negligenciadas pelo Poder Público, crianças das comunidades de Fátima, Livramento, São Sebastião, Ebenézer, Julião e Agrovila, no igarapé do Tarumã, caíram nas mãos dos traficantes. De acordo com o Conselho Tutelar da Zona Rural, meninos e meninas dessas comunidades estão sendo usados para vender bebidas alcoólicas e entorpecentes nos arredores de suas casas e em balneários próximos, como as praias da Lua e do Escondidinho.
Pior: para atender as dezenas de casos que não param de chegar todo dias, o Conselho Tutelar só conta com o apoio de dois policiais militares – e uma viatura quebrada há mais de seis meses. Os policiais deviam atuar em seis comunidades, atendendo mais de cinco mil pessoas, mas esbarram na falta de estrutura.
A denúncia foi feita por um dos coordenadores do Conselho Tutelar da Zona Rural, Márcio Menezes, preocupado com o aumento no número de casos de exploração infantil, muito em consequência da demora nas providências. Em 2010, elas passaram de 500. "Nosso conselho recebeu o primeiro barco este mês, por isso, a presença da Polícia Militar (PM) nessas comunidades é muito importante para averiguar denúncias e coibir esses crimes", alegou.
Mas, segundo ele, só uma das seis comunidades que enfrentam esses problemas conta com uma unidade da PM. Trata-se de um posto submetido à 19ª Cicom que funciona em uma modesta casa de madeira. "Só em Fátima existe posto, que é insuficiente até para atender a própria comunidade, onde vivem mais de três mil pessoas. São apenas dois policiais e uma viatura que está parada há mais de seis meses", disse.
O conselheiro contou que único carro à disposição dos Pms, uma Parati, apresentou problemas mecânicos há quase um ano e nunca passou por conserto. "O problema existe há tanto tempo que os pneus já estão secos e enferrujando. Os Pms não tem como se deslocar para atender denuncias", alertou.
O coordenador-geral dos Conselhos Tutelares, João Furtado, afirmou que a situação de vulnerabilidade em que se encontram as crianças e adolescentes dessas seis comunidades da Zona Rural preocupa, até mesmo, mais do que em áreas da cidade onde o número de denúncias é maior. "As denúncias dessas comunidades representam 5% do total. Parece pouco, mas se fizermos a proporção com a população local, o número é preocupante. Esses lugarejos preocupam mais porque estão longe dos olhos dos órgãos públicos".
Crianças usadas por traficantes
O conselheiro Márcio Menezes contou que o uso de adolescentes e crianças de até dez anos por traficantes de duas ´bocas-de-fumo´ das comunidades de Fátima e Livramento é um dos problemas mais constantes.
Desde o fim do ano passado, esses traficantes vem colocando crianças em canoas para vender droga nas comunidades e a banhistas em praias próximas, como a da Lua e do Escondidinho. "Já flagramos situações como essa várias vezes e, inclusive, com crianças reincidentes. E o pior é que elas acabam se viciando nas drogas também. Recentemente, um menino de 14 anos veio pedir ajuda do conselho para largar o vício", relatou.
Os casos de abuso sexual também preocupam, principalmente porque são acobertados pelas famílias desses jovens. "Em um dos casos, uma menina de 12 anos que era estuprada pelo pai engravidou dele. A denúncia só chegou a nós quando ela já estava no quarto mês de gestação". Segundo ele já foi aberto um inquérito policial na delegacia da área para apurar o caso.
PM quer reunião com líderes
O subcomandante da Polícia Militar, coronel Oliveira Filho, afirmou que pretende reunir com líderes comunitários e o Conselho Tutelar para tomar ciência da situação das seis comunidades e programar ações que garantam a segurança delas.
"Temos reunido com várias comunidades, mas não recordo de ter visitado ou sido acionado por essas em questão", disse o oficial que afirma que muitas viaturas do modelo Parati, de 2007, já apresentam problemas mecânicos por conta do tempo de uso e precisam de reforma. A viatura da unidade de Fátima deverá ser vistoriada. O coronel disse que o aumento do efetivo de policiais depende de uma análise, que também será feita, mas não garantiu que irá ocorrer.
Saiba Mais
Todos os dias, cada um dos cinco conselheiros do Conselho Tutelar da Zona Rural recebe, pelo menos, uma denúncia de abuso sexual contra crianças e adolescentes e quatro envolvendo essas crianças e o tráfico de drogas, informou João Furtado. O órgão prepara uma série de ações nessas comunidades, inclusive uma fiscalização no local. "Vamos pedir apoio do comando da PM e da prefeitura", disse.