Gestão mais verde

 22/09/2011

Ainda não há uma forma exata para mensurar os avanços da sustentabilidade no Brasil e no mundo. Mas se uma fotografia do universo dos negócios fosse tirada hoje e comparada com o cenário de 20 anos atrás, muita coisa estaria diferente. A Responsabilidade Social Empresarial (RSE) cresceu de forma exponencial. Índices de sustentabilidade empresarial foram desenvolvidos para o setor financeiro. Houve reconhecimento de que a floresta em pé tem seu valor e os recursos naturais produzem benefícios essenciais à sociedade.

Essa nova mentalidade será debatida hoje no seminário "Sustentabilidade – Os Desafios do Desenvolvimento", promovido pelo Valor, em São Paulo. Entre os resultados dessa nova visão estão os chamados Pagamentos por Serviços Ambientais (PSA), um mecanismo que remunera proprietários de terras pela conservação ambiental. As tendências e análises sobre PSA já podem ser acompanhados pelo site Ecosystem Marketplace, que traz informações sobre qualidade da água, sequestro de carbono e assuntos relevantes para a implementação do mercado. É "uma espécie de Bloomberg dos serviços ambientais", diz Mário Monzoni, professor e coordenador do centro de estudos em sustentabilidade da Fundação Getúlio Vargas (GVces).

Embora ainda não totalmente regulamentada, já existe repartição de benefícios para as comunidades tradicionais pelo acesso ao patrimônio genético e conhecimento tradicional. E enquanto no passado nem se falava em emissões de poluentes, hoje o mercado voluntário e as certificações de carbono se consolidaram. Em 2010, 77 empresas reportaram suas emissões no Programa Brasileiro do GHG Protocol. Juntas, elas somam mais de 100 milhões de toneladas de CO2 e representam 5% das emissões brasileiras. "Esse é um indicador público. As empresas estão dando a cara para bater", avalia Monzoni.

Nos últimos sete anos, Clarissa Lins, diretora-executiva da Fundação Brasileira para o Desenvolvimento Sustentável (FBDS) entrevistou cerca de 300 executivos de 50 empresas que atuam em diversos setores da economia. As conversas integraram trabalhos de pesquisa e consultoria em práticas sustentáveis. "É muito claro que hoje ninguém mais faz confusão entre os conceitos", afirma Clarissa. "Alguns estão na frente e outros ainda não chegaram lá. Mas noto que o papel do líder entusiasta é muito importante para movimento."

As empresas hoje têm uma atitude mais proativa em relação ao passado. "Fazem propaganda de seus avanços e exploram o assunto como uma vantagem competitiva", explica Paulo Itacarambi, vice-presidente executivo do Instituto Ethos. "Isso nos possibilitou colocar uma agenda real de mudança. Quando estavam na defensiva não era possível assumir responsabilidades ou sequer ter propostas coletivas", continua.

Segundo Itacarambi, essa mudança de postura pode ser atribuída a dois fatos. Em 1972, com Conferência Mundial sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento, em Estocolmo, que resultou no Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (Pnuma), a noção de que os recursos ambientais são finitos ganhou mais espaço na sociedade. As empresas perceberem que impactos ambientais e sociais precisavam ser incluídos em seus orçamentos.

Mais tarde, o quarto relatório do Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC), divulgado em 2007, comprovou que a ação do homem causa impactos no funcionamento do planeta e culminou a mudança de comportamento empresarial. "É muito claro que as empresas hoje são mais sensíveis a problemas com reputação. Falar em trabalho escravo na cadeia de valor não tinha o mesmo impacto no passado que tem hoje", diz Itacarambi.

Nem tudo, porém, caminha na mesma direção. Poucos dos compromissos assumidos na Rio 92 avançaram, avalia Itacarambi. O fim da década de 1990 foi marcado por globalização financeira, acumulo de riquezas e modelos de produção que degradaram ainda mais os recursos naturais, diz. "A base produtiva que deveria ter sido desenvolvida de forma sustentável foi desmontada. Houve diminuição nos padrões trabalhistas, a competição nivelou os negócios por baixo", explica. "Os processos do ponto de vista da sociedade não foram melhorados. Isso culminou na crise financeira e natural que vivemos hoje."

Para Graziella Maria Comini, coordenadora do Centro de Empreendedorismo Social e Administração do Terceiro Setor, da Universidade de São Paulo, (Ceats) "se as empresas não mudarem de posicionamento, vai chegar o momento em que vão extrair recursos naturais mas não terão consumidores".

"Hoje as empresas se tornam mais criativas e definem metas que não são econômicas. Pensar num produto implica em contabilizar coisas como questões ambientais e a inclusão de pequenos produtores" diz Graziella. "Existe uma grande tendência de as empresas buscarem posicionamento com produtos verdes. As empresas se preocupam agora com o design de produto, com o consumo de água, de energia, inventário de emissões e querem entender o que fazer com os resíduos. Isso gera um efeito em cascata." Ela acredita que a sociedade civil está incentivando mudanças. Mas defende que é hora de o governo colocar políticas públicas regulatórias mais claras.

Opinião semelhante é defendida por Marina Grossi, presidente-executiva do Conselho Empresarial Brasileiro para o Desenvolvimento Sustentável (CEBDS) "O momento é de formular políticas públicas, redirecionar investimentos, tirar subsídios de algumas áreas e criar marco regulatório para essa nova economia", diz. "Caso contrário, fica uma empresa ou outra fazendo coisas isoladas sem atingir escala."

O CEBDS trabalha para adaptar o documento Visão 2050 – que aponta metas globais que deverão ser atingidas pelos países em quesitos como desenvolvimento humano, biodiversidade, eficiência hídrica, etc. nas próximas quatro décadas – à realidade do Brasil. Estima-se que em 2050 a população do planeta excederá os 9 bilhões de habitantes. O documento sugere, por exemplo, que os países cheguem a 2050 com matriz energética composta por 50% de fontes renováveis. Hoje, a matriz do Brasil já possui 40% de fontes renováveis. "O Brasil tem matriz muito mais limpa em relação ao resto do mundo. Tem 2% da água doce, é um país democrático e biodiverso. Estamos numa posição favorável", afirma.

APOIE

A REPÓRTER BRASIL

Sua contribuição permite que a gente continue revelando o que muita gente faz de tudo para esconder

LEIA TAMBÉM