Após as eleições, ministra da Secretaria de Direitos Humanos pedirá ao presidente da CCJ uma rápida aprovação da matéria, empacada desde maio no trâmite burocrático da Casa
Por Maurício Thuswohl, da Rede Brasil Atual
Rio de Janeiro (RJ) — Vergonha brasileira, o trabalho escravo persiste no país, apesar dos esforços engendrados pelo governo federal nas duas últimas décadas para combater esse tipo de crime. Erradicar de vez prática tão degradante e punir quem a promove é uma das prioridades declaradas da presidenta Dilma Roussseff, mas para que a empreitada tenha sucesso, o governo conta com a aprovação da Proposta de Emenda Constitucional 438, parada no Senado.
A PEC 438 tem o objetivo de dar nova redação ao artigo 243 da Constituição Federal – que trata das situações onde deverá ocorrer o confisco de terras pela União – para nele incluir a questão do trabalho escravo. Criada no Senado em 2001, foi aprovada e encaminhada à Câmara em 2004, onde permaneceu até maio deste ano. A suada e exaustivamente negociada aprovação na Câmara, no entanto, não garante vida fácil à PEC 438 no Senado, onde a influência de setores ligados ao latifúndio e ao agronegócio é também muito grande.
Atualmente, a PEC 438/01 está presa na teia burocrática do Senado, mais exatamente no Protocolo Legislativo, para onde foi enviada pela Mesa Diretora da casa em 25 de maio com o objetivo de ser apensada à PEC 57A/99, que trata da mesma matéria. Essa, por sua vez, está desde 11 de setembro na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado, onde aguarda que o presidente, senador Eunício Oliveira (PMDB-CE), designe seu relator.
Por intermédio de sua assessoria, Eunício afirmou que o relator ainda não foi designado porque as atenções dos senadores estão agora voltadas aos seus estados de origem, onde ocorre o segundo turno das eleições municipais. O presidente da CCJ, no entanto, não precisou uma data para que a definição do relator ocorra.
Para o senador Paulo Paim (PT-RS), que acompanha de perto essa matéria desde que ainda era deputado federal, “é fundamental que o Senado de uma vez por todas se posicione”, uma vez que a PEC 438 nasceu ali há mais de dez anos: “Foi para a Câmara e votou com uma alteração para que a desapropriação para quem cometeu o crime hediondo de trabalho escravo possa acontecer tanto na área urbana como na área rural. Foi um avanço. O Senado agora não pode vacilar e eu espero que vote com rapidez, de uma vez por todas, a PEC do Trabalho Escravo”, diz.
Após segundo turno
O senador petista ressalta que a chaga do trabalho escravo segue na contramão da imagem de modernidade e liderança que o Brasil vem construindo nos últimos anos no cenário internacional: “É um absurdo que nos dias de hoje a gente ainda tenha que constar entre os países do mundo onde existe trabalho escravo. Essa PEC é fundamental quando diz que se alguém for pego em uma propriedade onde existe trabalho escravo, vai perder todos os bens. Acho que sua aprovação vai ser um xeque-mate no trabalho escravo. Por isso, todos os homens e mulheres de bem aqui no Senado devem aprovar essa PEC”, diz Paim.
Logo após o segundo turno das eleições, marcado para o dia 28 de outubro em todo o Brasil, a Secretaria de Direitos Humanos (SDH) da Presidência da República iniciará nova ofensiva junto aos senadores para garantir a aprovação da PEC: “Assim que passar esse processo eleitoral, que a gente não pode negar que dá uma atrasada no ritmo do Legislativo, a ministra Maria do Rosário irá procurar o senador Eunício para pedir que ele paute ainda este ano a PEC do Trabalho Escravo na CCJ. Quem sabe, a levaremos ao plenário do Senado ainda em 2012”, afirma José Guerra, que é coordenador geral da Comissão Nacional Para a Erradicação do Trabalho Escravo (Conatrae).
Forças contrárias
Guerra reconhece que existe forte oposição à aprovação da PEC 57A/99 no Senado e garante que a SDH está atenta para não perder a queda-de-braço política: “Vamos fazer a mesma coisa que fizemos na Câmara, partir para o debate claro e franco e provar pelo debate que essa PEC é vantajosa para o setor produtivo nacional porque vai separar o joio do trigo. O trabalho escravo é uma mancha que não pode ser colocada para todo o setor agrícola brasileiro”.
O coordenador da Conatrae destaca o poder dissuasivo que terá a nova lei: “A PEC vai separar o bom agricultor, aquele que é competitivo, sem explorar o trabalhador, do mau agricultor, que será punido. Ao punir o empregador que utiliza o trabalho escravo, você faz com que todos os outros que não o utilizam fiquem limpos dessa mancha que pode se espraiar caso a gente continue nessa situação”, diz.
Paulo Paim também aguarda o duelo com os setores do Senado ligados ao latifúndio e ao agronegócio: “Com certeza eles farão pressão, assim como fizeram na Câmara. Por isso, a PEC do Trabalho Escravo ficou tanto tempo trancada lá. Continuarão fazendo essa pressão [pela não aprovação] aqui. É por isso que a pressão popular daqueles que defendem os direitos humanos e os direitos dos trabalhadores, daqueles que defendem o trabalho decente, também precisa ser exercida para que a matéria seja aprovada”.