Decisão favorece comunidade quilombola de Barra do Turvo, no Vale do Ribeira

Decisão liminar obtida pela Defensoria Pública de SP favorece comunidade quilombola de Barra do Turvo, no Vale do Ribeira
 14/02/2013

A Defensoria Pública de SP obteve uma decisão judicial liminar favorável a uma comunidade quilombola no bairro Ilhas, no município de Barra do Turvo (a 322 km de São Paulo), que determina a reintegração de posse e a remoção de cercas instaladas pela dona de uma chácara vizinha, que bloqueiam a passagem da comunidade até um reservatório de água.

A decisão foi proferida pela Juíza Marcela Filus Coelho, da Comarca de Jacupiranga, no último dia 6/2. Ela acolheu o pedido feito pelos Defensores Andrew Toshio Hayama e Thiago de Luna Cury, que atuam em Registro, também no Vale do Ribeira.

A magistrada determinou que, se necessário, haja auxílio policial, e fixou multa de R$ 5.000 caso a passagem seja novamente obstruída.

A ação dos Defensores busca a proteção do território quilombola por meio de usucapião por servidão de passagem – já que a comunidade, para chegar à fonte de água, precisa passar pela chácara vizinha.

Segundo a ação, há mais de 20 anos a Sabesp (Companhia de Saneamento Básico do Estado de São Paulo) deixou de usar um rio próximo à comunidade quilombola para abastecer a cidade de Barra do Turvo, substituindo-o por outra fonte. A estrutura abandonada, porém, passou a ser usada pelos quilombolas para levar água à comunidade, por meio de reformas e canalização feitas por eles próprios.

A comunidade se responsabilizou por preservar a qualidade da água e manter transitável o caminho ao reservatório, de cerca de 1 km. Mas, de acordo com a ação, no último dia 21/1 os moradores encontraram o trajeto bloqueado por uma cerca colocada pela dona da chácara Grão-Pará, também conhecida como “Pedra Branca”, localizada em área originalmente quilombola. No dia 28/1, os quilombolas procuraram auxílio da Defensoria, levando um abaixo assinado.

Ação

Os Defensores fundamentam a ação no artigo 68 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias, que garante a propriedade definitiva aos remanescentes de comunidades quilombolas, mesmo que ainda não tenha sido feita a regularização fundiária.

Outro fundamento jurídico mencionado é o Decreto nº 4.887/2003, que em seu artigo 2º define como remanescentes das comunidades dos quilombos “os grupos étnico-raciais, segundo critérios de auto-atribuição, com trajetória histórica própria, dotados de relações territoriais específicas, com presunção de ancestralidade negra relacionada com a resistência à opressão histórica sofrida”.

A Convenção nº 169 da Organização Internacional do Trabalho sobre povos indígenas e tribais, promulgada pelo Brasil em 2004, também embasa a ação, que aponta o compromisso assumido pelo governo a adotar “as medidas que sejam necessárias para determinar as terras que os povos interessados ocupam tradicionalmente e garantir a proteção efetiva dos seus direitos de propriedade e posse”.

Quilombo

Com história ainda incerta, o quilombo do bairro Ilhas tem suas raízes provavelmente no início do século XX, formado a partir da compra de uma área por Raymunda Correa de Freitas, filha da escrava Izidora Correa de Freitas. Descendentes de escravos teriam deixado a cidade de Iguape por dificuldades de subsistência e migrado para Barra do Turvo.

Em um século de existência, segundo o Defensor Andrew Toshio, a comunidade originalmente instalada foi reduzida drasticamente, a 12 famílias e um território de 25 hectares, devido a grilagens, invasões, expulsões e até violência por parte de não quilombolas.

Recentemente os moradores constituíram uma associação e passam, agora, por um processo de reconstrução de sua história e reconhecimento como comunidade quilombola, segundo Toshio. Também será feito pedido à Fundação Cultural Palmares, pela Equipe de Articulação e Assessoria às Comunidades Negras do Vale do Ribeira (EAACONE), para que seja atestada a existência da comunidade.

Texto originalmente publicado na página da Defensoria Pública de São Paulo

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