Uma força-tarefa libertou, em 3 de abril, um contingente de 16 trabalhadores de condições análogas às de escravo em duas propriedades produtoras de carvão no município de Nova Crixás, em Goiás. Parte do grupo, com 12 pessoas, era explorado em uma carvoaria chamada Fazenda Santa Bárbara, onde 36 fornos irregulares estavam em funcionamento. Os outros quatro resgatados operavam 12 fornalhas na área conhecida por Fazenda Lago Perdido, na mesma região. Com resgates sucessivos no setor carvoeiro, o estado é um dos que mais têm apresentado casos de escravidão no país nos últimos cinco anos.
A libertação decorreu de uma força-tarefa responsável pela fiscalização de empreendimentos no município, que fica no noroeste do estado. Participaram auditores-fiscais da Superintendência Regional do Trabalho e Emprego de Goiás (SRTE/GO), integrantes do Ministério Público do Trabalho (MPT) e agentes da Polícia Rodoviária Federal (PRF).
Goiás foi o estado que teve o maior número de empregadores inseridos na atualização de dezembro de 2012 da “lista suja” do trabalho escravo, com um total de 13 nomes. O cadastro contém o nome de empregadores flagrados explorando mão de obra escrava, e é mantido em conjunto pelo Ministério do Trabalho e Emprego (MTE) e pela Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da República (SDH/PR). De um total de 394 incluídos na relação, a unidade federativa no Centro-Oeste brasileiro acumula 49 entradas.
Além disso, a produção de carvão vegetal foi a segunda atividade econômica com mais inserções na última atualização da “lista suja”, em dezembro de 2012. Ao todo, foram sete entradas. Na totalidade dos 394 incluídos atualmente, o setor carvoeiro acumula 74 nomes (veja o total corresponde em gráfico abaixo). A atividade econômica dentro das fronteiras goianas, por sua vez, soma pelo menos 16 casos no cadastro.
Desde 2008, quando foi a região do país campeã em flagrantes de trabalhadores reduzidos à escravidão, o estado acumula um mínimo de 200 trabalhadores resgatados por ano. Naquela ocasião, Goiás assistiu ao total de 867 pessoas libertadas da escravidão contemporânea dentro de seus limites geográficos. Para efeito de comparação, conforme dados da Secretária de Inspeção do Trabalho (SIT) do MTE, foram 201 vítimas no ano passado; 310 no decorrer de 2011; 343 durante 2010, quando foi a terceira unidade federativa com mais casos de trabalho escravo no país; e 328 no ano de 2009 (veja resumo dessas informações abaixo).
Fiscalização
A operação encontrou situações muito semelhantes nas duas fazendas em que o contingente de 16 pessoas submetidas à escravidão contemporânea foi resgatado. Todas as vítimas cumpriam jornadas exaustivas, que chegavam a até 18 horas diárias e se estendiam de tal forma que não era possível folga nos fins de semana. Os trabalhadores não tinham registro nem carteira assinada. O salário era pago “por fora” e, no caso de alguns trabalhadores, recebido através de um esquema de fraude do seguro-desemprego, segundo relata a SRTE/GO.
De acordo com os ficais, o alojamento das vítimas estava em péssimas condições, com colchões podres e número insuficiente de camas disponíveis. Nas frentes de trabalho, não havia instalações sanitárias, de modo que o grupo resgatado tinha de realizar as necessidades fisiológicas no matagal. Equipamentos de Proteção Individual (EPIs) e água potável não eram fornecidas pelo empregador. Alguns trabalhadores também realizavam atividades de riscos, como a operação de motosserras, sem receber o treinamento necessário para executar tais tarefas.
Os proprietários das duas fazendas inspecionadas haviam arrendado suas propriedades para um terceiro, que administrava a produção de carvão nos dois locais. As atividades econômicas foram interditadas pela fiscalização. Tanto os fazendeiros quanto o arrendatário das terras ficaram responsáveis pelo pagamento das verbas rescisórias aos trabalhadores resgatados, bem como de outras multas aplicadas pelo Ministério Público do Trabalho a título de “danos morais coletivos”. Os valores passam de R$ 80 mil.
Parte do grupo libertado havia sido trazido do interior de Minas Gerais por “gatos” — nome dado aos responsáveis pelo aliciamento de pessoas à escravidão contemporânea. Conforme aponta a fiscalização, esses aliciadores da mão de obra também serviam como “laranjas” para esquivar a responsabilidade dos donos das fazendas e do arrendatário responsável pela produção de carvão.
O fazendeiro, o arrendatário e os “gatos” poderão responder pelo crime de submissão de trabalhador à condição de escravo, conforme prevê o artigo 149 do código penal. Eles também poderão ser incluídos na “lista suja” do trabalho escravo, em futura atualização do cadastro.
*com informações da assessoria de comunicação da SRTE/GO
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