Busca da verdade é importante, sob pena de absolvição sem processo, afirma subprocuradora-geral da República em parecer encaminhado ao STJ
No entendimento do Ministério Público Federal, deve ser provido no Superior Tribunal de Justiça (STJ) o recurso especial (RE 1.371.154/PB) contra acórdão do Tribunal Regional Federal da 5ª Região que rejeitou denúncia contra o prefeito de Manaíra (PB), José Simão de Sousa. O político foi acusado de submeter trabalhadores de sua fazenda a condições análogas à de escravo, crime previsto pelo Código Penal.
Segundo o Tribunal Regional Federal da 5ª Região, as condições dos trabalhadores encontrados são precárias, mas não houve comprovação de redução à condição análoga à de escravo. Para o Ministério Público Federal, no entanto, não há uma justa causa para a rejeição da denúncia. Essa justa causa somente existe quando os fatos “forem desenganadamente atípicos ou não houver lastro probatório mínimo para a abertura da ação penal”, o que não é o caso.
Para a subprocuradora-geral da República Maria das Mercês Aras, autora do parecer encaminhado ao STJ pelo provimento do recurso especial, “a conclusão pela atipicidade da conduta atribuída a José Simão de Sousa foi prematura, porquanto se deu antes mesmo da regular instrução criminal, sede própria para esclarecer e pormenorizar todas as circunstâncias do delito, bem como para demonstrar eventual falta de dolo do agente.” A subprocuradora ainda alerta para o fato de que nessa fase processual, a dúvida favorece a sociedade, detentora de legítimo interesse na apuração de crime acaso praticado e na punição do culpado e por isso é necessário buscar a verdade, sob pena de absolvição sem processo.
Entenda o caso – O prefeito de Manaíra (PB), José Simão de Sousa, é proprietário da fazenda Palac, próxima à cidade de Colmeia, em Tocantins. De acordo com o Grupo Especial de Fiscalização Móvel do Ministério do Trabalho e Emprego verificou que o prefeito deixava de fazer o pagamento diário dos serviços de 22 trabalhadores que se dedicavam à atividade de roço de pasto e aplicação de agrotóxicos.
Além disso, alojava-os em ambiente de péssimas condições de higiene, não lhes fornecia água potável e nem local apropriado para que pudessem preparar suas refeições. Os empregados da fazenda eram ainda impelidos a comprar produtos vendidos pelo preposto do prefeito a preços superiores aos praticados no comércio em geral, cujo pagamento era descontado, posteriormente, do salário dos trabalhadores.
Trabalho escravo – De acordo com o Código Penal (artigo 149), é crime “reduzir alguém a condição análoga à de escravo, quer submetendo-o a trabalhos forçados ou a jornada exaustiva, quer sujeitando-o a condições degradantes de trabalho, quer restringindo, por qualquer meio, sua locomoção em razão de dívida contraída com o empregador ou preposto.” A pena para o delito é a reclusão, de dois a oito anos, e multa, além da pena correspondente à violência.
Segundo a doutrina, o trabalho escravo não é somente a privação da liberdade de ir e vir, mas também a supressão do poder de decisão espontânea sobre a aceitação ou permanência no trabalho e sobre as próprias condições em que o trabalho é prestado.
Texto originalmente publicado na página do MPF