O Ministério Público do Trabalho (MPT) em Mossoró ingressou com ação civil pública para que a Petrobras passe a adotar medidas destinadas à formação de um fundo garantidor, nos contratos terceirizados, a fim de evitar o calote aos trabalhadores das empresas que prestam serviços à estatal, naquela localidade. “O objetivo é proporcionar uma maior segurança a esses trabalhadores e assegurar a efetiva prioridade dos créditos trabalhistas”, explicam os procuradores do Trabalho Gleydson Gadelha e Afonso Rocha, que assinam a ação.
A ação teve como base o crescente volume de demandas judiciais e extrajudiciais na região, motivadas por irregularidades trabalhistas como atrasos e falta de pagamentos de salários, bem como outros direitos, tais como valores de verbas rescisórias, em empresas contratadas pela Petrobras. De acordo com os procuradores, “o excesso de judicialização tem provocado uma corrida ao bloqueio de créditos para pagamento de dívidas das empresas terceirizadas, em que concorrem credores civis e trabalhistas”.
Levantamento realizado pelo MPT dá conta de que 50 prestadoras de serviços terceirizados no setor de petróleo possuem ao menos cinco demandas cada, na Justiça do Trabalho com atuação em Mossoró, sendo que algumas delas respondem a centenas de processos. A pesquisa não contabilizou os números do sistema de Processo Judicial Eletrônico.
Para o MPT em Mossoró, a origem do problema está na forma de contratação praticada pela companhia petrolífera, que precariza as garantias trabalhistas. Os procuradores do Trabalho explicam que tais contratos não são bons nem para a própria Petrobras, que acaba por pagar duas vezes: na contratação e quando responde às demandas judiciais. Destacam, ainda, que “há alguma falha fundamental na cadeia de contratações, que implica na sistemática violação dos direitos de milhares de trabalhadores, gerando um grave passivo social”.
Dentre as falhas apontadas, foi constatado o desvio da destinação social e econômica das multas contratuais aplicadas em decorrência do descumprimento de direitos trabalhistas. Mas os procuradores alertam que “a multa não deve enriquecer, mas fazer acontecer conforme o direito”. Segundo sustenta a ação, atualmente a Petrobras utiliza o instituto da multa apenas como forma de constituição de culpa da empresa prestadora, a fim de documentar uma suposta fiscalização do contrato, e não com o objetivo de forçar o ofensor a cumprir a obrigação trabalhista violada.
Pedidos da ação – Diante dos problemas demonstrados, o MPT requer que a Justiça do Trabalho determine à Petrobras o bloqueio, ou depósito em conta própria, das multas contratuais provenientes do descumprimento de obrigações trabalhistas, para que tais valores somente sejam liberados: 1. proporcionalmente e em favor ao crédito de cada trabalhador, caso a empresa prestadora de serviços não tenha quitado as verbas trabalhistas e rescisórias tempestivamente; 2. para a Petrobras, após comprovação da quitação das verbas rescisórias dos trabalhadores pelas prestadoras de serviços ao final dos contratos.
Além disso, a Petrobras deve ser obrigada a incluir nos contratos uma cláusula de seguro-garantia das verbas trabalhistas e rescisórias, com a efetiva cobrança da garantia e periódica revisão ao longo de todos os novos contratos, inclusive para os aditivos aos já existentes, conforme medida com finalidade semelhente prevista no acordo coletivo vigente (cláusula 179). Quando da celebração do acordo, tal medida foi inclusive acatada pela própria Petrobras, porém jamais colocada em prática, tendo sofrido alterações que limitavam a aplicabilidade apenas aos contratos celebrados com a estatal no valor de mais de R$ 5 milhões.
As medidas são destinadas à formação de um fundo garantidor e constam no pedido liminar feito na ação, para que sejam determinadas imediatamente, antes mesmo do julgamento final do processo, sob pena de multa de R$ 100 mil por dia de descumprimento. Conforme defende a ação, há perigo da demora, devido à situação sistêmica de calotes e descumprimentos sobre verbas de natureza alimentar de milhares de trabalhadores, inclusive de empresas cujos trabalhadores estão em greve, exatamente pela falta de pagamentos de verbas salariais básicas.
O Procurador do Trabalho Gleydson Gadelha informou que deve requerer idênticas medidas para formação do fundo garantidor, diretamente em cada uma das ações ajuizadas pelo MPT em Mossoró que envolverem irregularidades trabalhistas nos contratos de empresas terceirizadas da Petrobras.
No pedido definitivo da ação, o MPT requer ainda que a Justiça do Trabalho obrigue a Petrobras a pagar indenização em valor não inferior a R$ 1 milhão, por dano moral coletivo já causado pela atual forma de contratação da estatal. A ação contra a Petrobras foi ajuizada na última terça-feira, 15 de abril, via Processo Judicial Eletrônico, cujo número para acompanhamento é o seguinte:
* ACP-0000356-58.2014.5.21.0013
Contratos atuais ferem direito de greve
A presente ação foi ajuizada em meio a uma greve de trabalhadores da Empercom na cidade de Mossoró, empresa que presta serviços à Petrobras, acusada de praticar irregularidades trabalhistas que vão desde o não pagamento dos salários até a suspensão de plano de saúde, de auxílio-alimentação, dentre outros direitos e garantias.
O presidente do Sindipetro, José Araújo, explicou que a forma de contratação começa errado quando a Petrobras estabelece o pagamento da empresa por item de serviço. Conforme esclarece, nesses casos há metas de produtividade que, se não cumpridas, podem implicar tanto em redução dos repasses à empresa quanto em pagamento de pesadas multas contratuais. “Estes argumentos acabam sendo utilizados pela prestadora de serviços para impedir que os trabalhadores façam greve ou para forçá-los a voltar ao trabalho, ferindo assim o direito à greve e à atividade sindical”, ressalta o sindicalista.
Os trabalhadores da Empercom realizaram manifestação no dia 15 de abril, em frente à Justiça do Trabalho de Mossoró. Manifestantes revelaram que há trabalhadores em sérias dificuldades financeiras devido aos recorrentes atrasos de pagamento, seja porque precisam pagar empréstimos consignados ou possuem obrigação de pagar pensão alimentícia de filhos. “Estes correm o risco até de serem presos”, destaca um dos manifestantes, que prefere não ser identificado. Também foram relatados casos de trabalhadores demitidos por estarem envolvidos nas manifestações ou por simplesmente reclamarem da falta de pagamento.
O mesmo manifestante revelou, ainda, que, com o plano de saúde suspenso, o trabalhador fica psicologicamente abalado, impossibilitado de exercer a atividade de risco. “Isso sem falar naqueles que precisam de tratamento médico ou estão à espera de cirurgia, como é o caso de um colega que sofre de câncer de próstata e precisa ser operado, mas não consegue a autorização”. O presidente do Sindicato dos Petroleiros e Petroleiras do RN (Sindipetro), José Araújo, confirmou que a Empercom não tem cumprido com a obrigação de fornecer a cobertura devida de plano de saúde aos trabalhadores.
A manifestação aconteceu após decisões proferidas pela Justiça do Trabalho terem sido consideradas desfavoráveis aos grevistas, em ações movidas pelo Sindipetro. Em uma delas, teria sido determinada a volta de 80% dos empregados da Empercom ao trabalho, sob pena de multa de R$ 50 mil ao Sindipetro, pois a Justiça do Trabalho considerou tratar-se de serviço essencial, que não poderia parar. A outra decisão determinou o bloqueio de 30% dos créditos da empresa, enquanto a ação do sindicato pediu 60%, o que, para o Sindipetro, era necessário para cobrir a folha de pessoal.
Em janeiro, o MPT chegou a intermediar um acordo firmado entre o Sindipetro e a Empercom, para cessar as irregularidades, porém houve descumprimento das medidas. Caso não haja solução extrajudicial, o MPT deve ingressar com ação na Justiça do Trabalho, para que seja estipulado o pagamento da folha salarial diretamente pela Petrobras, como foi feito com a prestadora de serviços ETX, em processo semelhante.
Texto originalmente publicado no site do Ministério Público do Trabalho – 21ª Região.