Multinacional americana é condenada em R$ 1 bilhão pela contaminação de trabalhadores

Valor calculado pela Justiça do Trabalho inclui R$ 300 milhões referente a danos morais e R$ 700 milhões de custos estimados com tratamento de saúde às vítimas; Eli Lilly e ABL Antibióticos devem suspender atividades em fábrica contaminada de Cosmópolis
 09/05/2014

Campinas – A juíza Antonia Rita Bonardo, da 2ª Vara do Trabalho de Paulínia, condenou as empresas Eli Lilly do Brasil Ltda. e Antibióticos do Brasil Ltda. (ABL) ao pagamento de indenizações que totalizam R$ 1 bilhão, em decorrência da contaminação de trabalhadores por substâncias tóxicas e metais pesados em uma fábrica de medicamentos em Cosmópolis, a 140 km de São Paulo. Dentre as obrigações impostas pela sentença está o custeio, pelas empresas, do tratamento irrestrito de saúde a todos os empregados, ex-empregados, autônomos e terceirizados – que prestaram serviços no período mínimo de seis meses no complexo industrial -, assim como aos filhos desses trabalhadores, nascidos no curso ou após a prestação de serviços.  A justiça também proibiu as empresas de enterrarem resíduos tóxicos no solo e de explorarem atividade econômica no parque fabril pelo período de um ano, “em razão da degradação ambiental ocasionada pela contaminação do solo, da água ou do ar por produtos químicos”. O Ministério Público do Trabalho, autor da ação civil pública, acompanhará a delimitação da área a ser isolada.

A multinacional americana e sua subsidiária brasileira foram alvo da uma ação civil pública no ano de 2008, movida pelo procurador Guilherme Duarte da Conceição, após a instrução de um inquérito que apontou as consequências da exposição de funcionários a contaminantes no processo produtivo da fábrica, mas também pela exposição a gases e metais pesados advindos da queima de lixo tóxico de terceiros pelo seu incinerador.

“A Lilly afirma que não tinha metais pesados na produção, mas isso vinha de terceiros. O incinerador, que funciona até hoje, estava ocioso, e daí surgiu a ideia de incinerar para outras fábricas”, explica Elias Soares Vieira, ex-trabalhador da Lilly.

Segundo evidências juntadas no processo, de 80 ex-funcionários que se submeteram a exames de sangue, cujos laudos médicos estão na petição inicial, apenas três não apresentaram contaminação, embora existam suspeitas, segundo o médico toxicologista Igor Vassilieff. Mesmo assim, o MPT solicitou na ação a inversão do ônus da prova, ou seja, que a empresa seja obrigada a apresentar provas de que o meio ambiente da empresa não contaminou os trabalhadores.

“Tenho na minha corrente sanguínea a presença de metais pesados como chumbo, arsênico, alumínio, titânio e mercúrio. Por conta disso, desenvolvi um câncer renal e tive que remover o rim direito, com perda de funcionalidade do esquerdo e repercussão no fígado. Também tenho problemas nas glândulas suprarrenais e nas artérias”, aponta Elias.

Segundo o trabalhador, cerca de 500 pessoas passaram pela fábrica desde o ano de 1977, quando iniciou suas operações em Cosmópolis (SP). De lá pra cá, todos estão recebendo tratamento pelo SUS (Sistema Único de Saúde), já que a empresa não admite a contaminação de seres humanos na planta e, por isso, não se responsabiliza pelo custeio do tratamento de saúde. Já existem ao menos 70 processos individuais contra a Lilly na Justiça do Trabalho.

Os laudos técnicos apontam a presença de substâncias perigosas nas águas subterrâneas no terreno da fábrica, tais como benzeno, xileno (solvente), estireno (usado para a fabricação de veneno contra ratos), naftaleno (também conhecido como naftalina), tolueno (caracteriza a cola de sapateiro), omeno e isopropil benzeno.

Por conta disso, as próprias empresas – Eli Lilly e ABL – realizaram uma autodenúncia à Cetesb, admitindo a contaminação da água e do solo da região. Há processos ativos contra as companhias em outros ramos do Judiciário.

Indenizações – A justiça arbitrou a indenização por danos morais coletivos no valor de R$ 300 milhões, conforme solicitado pelo MPT. Desse montante, o total de R$ 150 milhões será destinado a uma fundação para prestação de assistência aos trabalhadores expostos a riscos de contaminação, que deve ser criada no prazo de um ano. O objetivo da fundação é o de propiciar “acompanhamento, diagnóstico, medidas preventivas e tratamento” dessas pessoas. Outros R$ 100 milhões serão destinados para a aquisição de bens para o Hospital das Clínicas da Unicamp, Hospital Celso Pierro e Centro Infantil Boldrini, necessários para “diagnosticar e tratar os danos decorrentes da exposição a agentes tóxicos”, e os demais R$ 50 milhões serão revertidos ao FAT (Fundo de Amparo ao Trabalhador).

No cálculo da indenização, a magistrada incluiu o custo estimado das empresas com o tratamento de saúde dos trabalhadores, elevando o valor para R$ 1 bilhão, como pode ser atestado na última página da sentença: “Levando-se em consideração os valores objetivamente fixados e aqueles estimados com os gastos para tratamento de saúde, arbitro à condenação o valor de R$1.000.000.000,00 (um bilhão de reais)”.

Em caso do descumprimento de qualquer item da sentença, incluindo indenizações e obrigações impostas pelo juízo, as rés pagarão multa de R$ 100 mil por dia, reversível ao FAT.

Cabe recurso no Tribunal Regional do Trabalho de Campinas.
Processo nº 0028400-17.2008.5.15.0126


Texto originalmente publicado no site do Ministério Público do Trabalho da 15ª Região.

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