Sobre o mapa dos agrotóxicos na água

Com dados do Ministério da Saúde, mapa revelou contaminação da água em todo o país. Apesar de ataques, a Repórter Brasil e a Agência Pública seguem investigando os agrotóxicos, tema de amplo interesse público devido à sua importância para a saúde, o meio ambiente e a economia
 06/05/2019

Em 15 de abril, publicamos um mapa sobre a presença de agrotóxicos na água produzido com os dados de controle do Sistema de Informação de Vigilância da Qualidade da Água para Consumo Humano (Sisagua), ligado ao Ministério da Saúde. O mapa é resultado de um esforço jornalístico em conjunto das agências de jornalismo brasileiras Repórter Brasil e Agência Pública em parceria com a organização suíça Public Eye.

Leia mais: “Coquetel” com 27 agrotóxicos foi achado na água de 1 em cada 4 municípios

A ferramenta permite que qualquer brasileiro possa consultar se agrotóxicos foram detectados de 2014 a 2017 na água que sai da torneira da sua cidade.

Os dados do Ministério da Saúde demonstraram uma realidade inquietante: milhares de cidades encontraram vestígios de agrotóxicos na água em medições realizadas neste período.  Embora a maioria dos testes revelasse concentração dentro dos limites permitidos pela lei brasileira, em diversos casos esses níveis estiveram acima do que é considerado seguro no Brasil. Comparando com os padrões europeus, os dados revelam que grande parte da água dos municípios analisados seria qualificada como imprópria na Europa.   

Desde que foi publicado, as informações do mapa foram utilizadas por 393 jornais, rádios e sites pelo Brasil. A repercussão revela que essas informações são de amplo interesse da população. Além de reforçar a importância da transparência de dados sobre a qualidade da água e sobre os impactos dos agrotóxicos na saúde humana e meio ambiente.

As informações geraram ainda impacto local, graças ao trabalho de veículos regionais. O portal G1 de Cabo Frio, por exemplo, entrou em contato com os responsáveis pela divulgação das informações em 50 cidades do interior Rio de Janeiro, das quais 36 estão sem dados no mapa. Questionadas, empresas de abastecimento e prefeituras se comprometeram a passar a enviar os resultados dos testes ao Sisagua. A mesma promessa foi dada à equipe do portal G1 do Sul de Minas, que fez uma série de matérias veiculadas pela EPTV, sucursal da TV Globo. Na Bahia, o jornal Correio aprofundou os dados em matéria de capa. Uma das cidades destacadas é Mucugê, destino turístico famoso por seus rios e cachoeiras dentro da Chapada Diamantina. A reportagem revela que a água do município estaria sob impacto das plantações de batata, morango e tomate.

Metodologia

Para acessar os dados, primeiro a reportagem entrou com um pedido pela Lei de Acesso à Informação. O Ministério da Saúde enviou a base do Sisagua em abril de 2018 e, meses depois, passou a divulgar os dados atualizados no site Dados Abertos, do governo Federal.

A base de dados completa, recebida pela reportagem em abril de 2018, pode ser baixada neste link: base de dados enviada pelo Ministério da Saúde. São esses os dados utilizados no mapa. É importante salientar que, como o banco do Sisagua é atualizado de modo constante, as informações que foram acrescentadas depois de abril de 2018 não estão no mapa.

Como os dados estão classificados com termos técnicos de difícil entendimento, a reportagem consultou os manuais sobre a metodologia e entrou em contato com o Ministério da Saúde. Em janeiro de 2019, a pasta enviou os seguintes esclarecimentos, com as orientações sobre como interpretar os resultados:

– “Valor Numérico, quando é possível quantificar a concentração da substância analisada”;

– “Menor que o Limite de Quantificação (< LQ), quando é possível identificar a presença, mas não a concentração existente”

– “Menor que o Limite de Detecção (< LD), quando a substância está ausente ou em concentração inferior àquela que o equipamento consegue detectar.”

Além desses indicadores, a base de dados também traz o código “VMP”, que significa Valor Máximo Permitido. O VMP indica qual é a concentração máxima na água que é considerada segura no Brasil.

São esses os parâmetros enviados pelo Ministério da Saúde e reproduzidos no mapa.

Vale ressaltar que o Sisagua reúne um complexo banco de dados, pois recebe resultados de testes feitos em todo o país. As medições são feitas pelas mesmas empresas que fornecem a água que são as responsáveis por testar a presença de 27 agrotóxicos na rede que abastece as cidades. As informações são enviadas ao Sisagua pelas próprias empresas, ou por secretarias estaduais e municipais.

A lei brasileira determina que os fornecedores de água no Brasil devem realizar os testes a cada seis meses. Muitas não fazem os testes, ou não enviam os dados, descumprindo a lei.

Questionamentos

Após a publicação do mapa, algumas empresas de abastecimento entraram em contato com questionamentos sobre a leitura dos dados enviados ao Sisagua.

Nossos jornalistas checaram todos os casos e se certificaram de que as informações divulgadas estão condizentes com os dados da tabela enviada pelo Ministério da Saúde, assim como com a metodologia de leitura enviada pelo órgão.

A reportagem encaminhou os questionamentos sobre o Sisagua ao Ministério da Saúde e aguarda um retorno sobre os casos específicos desde então. Caso o órgão decida por rever a metodologia de leitura, assim como corrigir alguma informação, a base será atualizada no mapa.

Sem entrar nos detalhes questionados, o órgão enviou uma nota sobre o sistema: “O Ministério da Saúde informa que o Sistema de Informação de Vigilância da Qualidade da Água para Consumo Humano funciona de forma regular, estando devidamente preparado para receber os resultados das análises de agrotóxicos realizados pelos próprios municípios. Cabe ressaltar que a inserção dos dados no Sisagua é de responsabilidade dos gestores locais, por meio do profissional técnico de vigilância da qualidade da água no município ou pelo profissional responsável pela prestação de serviço, caso tenha acesso ao Sistema” (leia a íntegra da nota aqui).

Na última semana, associações e sindicatos patronais ligados ao agronegócio passaram a atacar o trabalho de jornalismo de dados com a publicação de notas, matérias em sites e até memes acusando a publicação de Fake News. A Agência Pública e Repórter Brasil entendem que o termo está sendo usado com a intenção de atacar a credibilidade da informação publicada por duas organizações de jornalismo investigativo com uma trajetória reconhecida que, juntas, somam mais de 60 prêmios nacionais e internacionais.

A Repórter Brasil e a Agência Pública comprometem-se a seguir investigando com rigor e divulgando reportagens sobre agrotóxicos, um tema de amplo interesse público devido a sua importância para a saúde pública, meio ambiente e economia.

A parceria entre as agências para investigar este assunto teve início em dezembro de 2018 e, desde então, produziu dezenas de reportagens e notícias sobre o tema. O material pode ser encontrado no site Por Trás do Alimento, assim como mais informações sobre este projeto de cobertura.

Nota da redação: o texto foi atualizado em 8 de maio para inserção de nota enviada pelo Ministério da Saúde após a publicação

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