ACNUR
Respostas para “Repórter Brasil” (03/08/2021)
A Acnur teve conhecimento da criação e manutenção do “canto dos maus-tratos”? Se sim, o que foi feito?
Por meio das organizações parceiras que fazem a gestão dos abrigos da Operação Acolhida em Boa Vista, o ACNUR (Agência da ONU para Refugiados) foi informado sobre a criação de espaços nestes locais reservados para pessoas que chegam alcoolizadas aos abrigos. Após receber esta informação, o escritório do ACNUR em Boa Vista entrou em contato com o comando da Força Tarefa Logística e Humanitária da Operação Acolhida, em Boa Vista, para expressar sua preocupação com esta medida e solicitou a desativação de tais espaços.
O vídeo que obtivemos teria sido gravado por um militar. A Acnur tomou conhecimento do vídeo? Se sim, quais providências foram tomadas?
Não temos informação sobre vídeos gravados por militares. Conforme respondido anteriormente, uma vez informado sobre esta situação, o ACNUR expressou sua preocupação ao comando da Operação Acolhida e solicitou a desativação dos espaços.
Há denúncias de que os indígenas estão proibidos de usar celular para filmarem os abrigos. É de conhecimento da Acnur? Como vocês se posicionam em relação a isso?
Não existe tal proibição nos abrigos coordenados pelo ACNUR e suas organizações parcerias, e o ACNUR não tem conhecimento de qualquer restrição neste sentido.
Os indígenas foram ouvidos em relação às medidas implementadas nos abrigos? Lideranças indígenas afirmam que isso não ocorre — o que violaria a Convenção 169 da OIT. Qual o posicionamento da Acnur em relação a essa acusação?
Em todo o mundo, assim como no Brasil – e mais especificamente no âmbito da Operação Acolhida – o ACNUR tem como prática consultar as pessoas refugiadas e outras populações sobre o seu mandato a respeito das soluções que precisam ser adotadas para assegurar sua proteção e assistência. No caso dos abrigos voltados para a população indígena em Boa Vista, as consultas regulares feitas com essa população levaram a adaptações no desenho dos abrigos, nos serviços oferecidos, nas atividades implementadas e até mesmo reformas estruturais. É importante ressaltar que os regramentos para abrigos indígenas recentemente aprovados pelo Comitê Federal de Assistência Emergencial é resultado de consultas com a comunidade.
A Acnur está ciente de uma carta-denúncia sobre o “canto dos maus-tratos” assinada por “governo brasileiro através de seus agentes públicos” em que os profissionais qualificam as ações como “práticas de violência e tortura” e citam casos como o de “pessoas que tiveram o braço amarrado nas grades ou permaneceram presas por mais de 18 horas no local”? A Acnur é citada como conivente na carta-denúncia. Em caso positivo, como a Acnur reagiu e que medidas tomou?
O ACNUR não tem conhecimento de tal carta. Denúncias de maus-tratos contra a população abrigada (ou de atividades incorretas ou danosa às pessoas refugiadas, inclusive má utilização de recursos e exploração ou abuso sexual) são levadas ao conhecimento das autoridades responsáveis, que conduzem as devidas investigações e punições de acordo com a legislação nacional. Em muitas vezes, a comunidade abrigada também é envolvida na discussão para se chegar a uma melhor solução, que leve em conta as necessidades das pessoas refugiadas sob os cuidados do ACNUR e de suas organizações parcerias.
Houve mudança no atendimento à saúde indígena, agora sob coordenação do Exército, que teria impedido ou reduzido drasticamente os atendimentos a pacientes de saúde mental e crônicos por organizações que atuavam na Operação?
Visando o aprimoramento da resposta humanitária no marco da Operação Acolhida, o ACNUR mantém diálogo constantes com organizações parceiras, autoridades públicas e a população refugiada no sentido de agregar novos serviços que atendam às necessidades destas pessoas. Recentemente, está em fase de implementação um projeto de atendimento em saúde mental, além de outras atividades específicas já em andamento.
CASA CIVIL
A Casa Civil da Presidência da República, como coordenadora do Comitê Federal de Assistência Emergencial (CFAE), instância máxima de governança da Operação Acolhida, esclarece que não autoriza nem compactua com qualquer tipo de ação que possa representar maus tratos contra migrantes e refugiados, sejam eles indígenas ou não.
O CFAE estabelece regras e parâmetros a serem seguidos pelos gestores dos abrigos e pela população abrigada. Essas regras foram elaboradas com a participação da população indígena abrigada, em Pacaraima (RR) e em Boa Vista (RR), além de representantes de agências da ONU, respeitando sempre a dignidade humana e demais princípios garantidos na Constituição. Uma dessas regras é a proibição da entrada nos abrigos de pessoas que estejam sob a influência de álcool ou drogas.
Ao tomar conhecimento da sua demanda, a Casa Civil questionou imediatamente a coordenação operacional da Operação Acolhida, a Força-tarefa Logística Humanitária, em Boa Vista/RR, que informou o que segue:
“Sendo responsável pela segurança dos abrigados e no intuito de preservar a vida dos indígenas sob sua responsabilidade, a Força-tarefa Logística Humanitária (FT LOG HUM) passou a autorizar a entrada de indígenas alcoolizados nos abrigos e sua permanência em um espaço localizado na portaria. Nesse local, o indígena alcoolizado permanece sob a observação dos encarregados da segurança do abrigo e tem à sua disposição os serviços necessários à sua recuperação, inclusive assistência médica e evacuação para o Núcleo de Saúde Acolhida (NSA), se necessário.
Importa esclarecer que nenhum indígena é obrigado a permanecer nesse espaço. Não há arame ao redor dessas áreas, que são delimitadas por gradis, normalmente utilizados para o balizamento e o controle de fluxo de entrada e saída de pessoas nos abrigos. A todos os indígenas, inclusive aos que ingressarem alcoolizados nos abrigos, é garantido o direito de escolha e a liberdade de locomoção, ou seja: ninguém é obrigado a permanecer nesse espaço. Após o surgimento desse espaço, apenas um atropelamento de beneficiário alcoolizado foi registrado, justamente o único que se recusou a utilizá-lo.
Quanto ao uso de termos como “cantinho da vergonha” ou “canto dos maus tratos”, a FT LOG HUM repudia veementemente a sua adoção como referência aos espaços destinados à preservação da vida e da integridade física dos indígenas que são acolhidos nos abrigos, em estado de embriaguez. A FT LOG HUM não está ciente de nenhuma carta-denúncia sobre esse tema e reafirma que todos os abrigados são tratados dignamente e com respeito.
A Operação Acolhida disponibiliza cinco abrigos para a população indígena, quatro em Boa Vista/PR e um em Pacaraima/PR, com capacidade de atendimento para 2.130 indígenas. Atualmente, os abrigos estão com 1.996 residentes.”
A Casa Civil, por meio do CFAE, reafirma seu compromisso em garantir o correto acolhimento aos venezuelanos que buscam uma nova vida no Brasil, e informa que irá apurar a situação. Caso seja comprovado qualquer tipo de maus tratos contra migrantes e refugiados, tomará as medidas cabíveis.