Alvo da CPI ligado a Barros recebeu R$ 152 mil para fazer propaganda do governo federal

Emissora de TV de Marcos Tolentino, que depõe sobre escândalo da Covaxin, passou a fechar contratos com governo após vender parte de sua grade de programação para igreja de pastor Valdemiro Santiago, aliado de Bolsonaro
Por Diego Junqueira
 14/09/2021

A rede de TV do advogado e empresário Marcos Tolentino, que depõe nesta terça-feira (14) na CPI da Covid sobre o escândalo da compra da vacina indiana Covaxin, recebeu R$ 152 mil da Secom (Secretaria Especial de Comunicação Social) para exibir propagandas do governo federal. Os contratos foram fechados logo após o canal alugar metade de sua grade de programação para a Igreja Mundial do Poder de Deus – comandada pelo pastor Valdemiro Santiago, um dos principais líderes religiosos aliados do presidente Jair Bolsonaro.

A Rede Brasil de Televisão (RBTV)  foi contratada para divulgar cinco campanhas publicitárias do governo entre dezembro de 2020 e julho de 2021, segundo a Secom. Não há registros na secretaria ou no Portal da Transparência da CGU (Controladoria-Geral da União) de que emissoras ligadas a Tolentino – que é amigo do deputado Ricardo Barros (PP-PR), líder do governo de Bolsonaro na Câmara – tenham sido contratadas anteriormente para outras campanhas publicitárias, segundo verificou a Repórter Brasil.

Em dezembro de 2020, a RBTV recebeu R$ 26,4 mil para veicular anúncios da “Semana Brasil 2020”, sobre a retomada da economia na pandemia. Outros R$ 23 mil foram pagos para divulgar o lançamento da nota de 200 reais. Já em 2021 foram mais três propagandas, todas relacionadas à saúde. A emissora recebeu R$ 64 mil pela campanha “Covid-19 – Cuidado Precoce”; outros R$ 18 mil para divulgar a vacinação da Covid, e mais R$ 19 mil pela propaganda “Combate ao mosquito Aedes Aegypti”.

Durante evento no Palácio do Planalto, em 13 de julho, Bolsonaro recebe o empresário Marcos Tolentino (no centro) e deputado e líder do governo, Ricardo Barros (Foto: Reprodução/Twitter)

Para receber esses valores da Secom, a RBTV usou o CNPJ de uma empresa em que não consta o nome do advogado e dos outros sócios: a Sistema Pantanal de Produção e Comunicação Eireli, cuja sede é em Campo Grande (MS). O endereço informado pela empresa é o mesmo da sede da emissora na capital de MS, onde o canal foi fundado.

A emissora de Tolentino aluga desde dezembro cerca de 12 horas de sua programação para a igreja do pastor Valdemiro. Já um segundo canal operado pela empresa arrenda 22 horas da grade desde março para a TV Templo, da Igreja Universal do Reino de Deus.

Além dos negócios com as lideranças religiosas próximas do bolsonarismo, Tolentino é amigo de Barros, também dono de empresas de comunicação. Em julho, Barros publicou uma foto em que aparece ao lado do advogado e do presidente Jair Bolsonaro, em evento no Palácio do Planalto. Em janeiro, Barros e Tolentino foram recebidos juntos em agenda no Ministério das Comunicações.

“Os assuntos foram debatidos na secretaria de Radiodifusão do Ministério das Comunicações, área estritamente técnica da pasta”, afirmou o deputado em nota enviada à reportagem. “A Rede Brasil de Televisão, de Marcos Tolentino, solicitava alterações em seus canais. Não houve nenhuma conversa sobre verbas de publicidade da Secom”.

A Rede Brasil de Televisão confirmou à Repórter Brasil datas e valores das inserções publicitárias e disse que o uso uso do CNPJ da Sistema Pantanal deve-se a um “acordo operacional entre as empresas”. A empresa negou que a vinda da programação da igreja para o canal tenha relação as peças publicitárias, afirmando que “tem cadastro ativo na Secom desde 2007”.

FIB Bank

Tolentino foi convocado pela CPI para explicar sobre seu suposto envolvimento com a FIB Bank Garantias, uma empresa que foi a avalista na compra do imunizante indiano Covaxin.  A FIB Bank também atuou como garantidora da igreja do pastor Valdemiro Santiago para  arrastar uma dívida de R$ 12 milhões, conforme revelou a Folha de S.Paulo.

Santiago fundou em 1998 a Igreja Mundial do Poder de Deus, após ganhar projeção na Igreja Universal do Reino de Deus, de Edir Macedo. Próximo ao presidente Bolsonaro, Santiago afirmou em 2019 que “a igreja tem de apoiar o governo em qualquer país”. Um mês depois, ele e a esposa ganharam do Itamaraty passaportes diplomáticos – o que ocorreu também no governo de Dilma Rousseff.

Com a chegada de Bolsonaro à Presidência, a emissora da Igreja Mundial também passou a receber verbas da Secom com frequência para fazer propaganda do governo. Foram R$ 340 mil pagos até agosto deste ano: R$ 65 mil em 2019, R$ 164 mil em 2020 e R$ 110 mil em 2021, segundo dados da secretaria. Não há registros de pagamentos anteriores a 2019. É essa emissora que aluga as 12 horas da grade da empresa de Tolentino.

Valdemiro Santiago, da Igreja Mundial do Poder de Deus, encontra Bolsonaro durante audiência em julho de 2019; o pastor é um dos principais líderes religiosos aliados do presidente (Foto: Marcos Corrêa/PR)

Do total recebido pela TV Mundial, emissora do pastor Santiago, R$ 110 mil foram para três campanhas relacionadas à pandemia: um sobre “prevenção”, outro sobre “cuidado precoce” e mais um sobre “vacinação”. Apesar de a sua emissora exibir peças publicitárias do Ministério da Saúde sobre o coronavírus, o pastor é investigado pelo MPF de São Paulo por espalhar desinformação durante a pandemia, após ofertar sementes de feijão para a cura da Covid.

A Igreja Mundial e a Secom foram procuradas, mas não responderam até o fechamento desta reportagem.


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