Íntegra das respostas da AGU e da MRV

Respostas enviadas para a reportagem 'Após sete flagrantes, MRV faz acordo com a União e fica fora da ‘lista suja’ do trabalho escravo'
 07/11/2022

Leia a reportagem na íntegra

AGU

1 – O Ministério Público do Trabalho foi contra a assinatura do acordo. O MPT classificou o acordo como “melhor dos mundos” para a MRV, que saiu da Lista Suja, sem que houvesse previsão legal para que isso ocorresse. Qual a opinião da AGU sobre essa avaliação do MPT?  

RESPOSTA: Primeiramente, cabe salientar que o acordo foi homologado pelo Tribunal Regional do Trabalho da 3ª Região, no dia 3 de outubro de 2022, diante da inexistência de qualquer vício ou nulidade, tendo formado coisa julgada.

A previsão legal para a celebração de acordos pela União, por intermédio da Advocacia-Geral da União, em ações envolvendo a anulação de autos de infração lavrados pela fiscalização do trabalho, diante da constatação da prática de trabalho análogo à de escravo, encontra-se inserida no art. 131, Constituição Federal, no art. 4º, VI Lei Complementar nº 73/93, no art. 1º da Lei nº 9.469/97 e no art. 5°, §6° da Lei 7.347/85.

Também deve ser lembrado que o novo Código de Processo Civil, nos arts. 3°, 139 e 174, consagrou um modelo de atuação consensual, com viés essencialmente resolutivo e pragmático, devendo ser adotado também pela Administração Pública. Além disso, não pode ser desconsiderada a importância da Resolução nº 125/2010 do Conselho Nacional de Justiça, que criou as bases de uma política nacional de conciliação, na qual prestigia-se a pacificação social, a prevenção de litígios e a redução da excessiva judicialização.

Assim, diante do que se encontra previsto pelo ordenamento jurídico e alinhado à lógica de solução pacífica de conflitos, conclui-se que a Advocacia-Geral da União tem competência ampla para celebrar acordos em qualquer ação de interesse da União, independente da matéria discutida na lide.

Quanto à suposta exclusão da MRV do Cadastro de Empregadores que tenham submetido trabalhadores a condições análogas à de escravo, informamos que o nome da empresa não constava no referido Cadastro. Cabe destacar que nas ações alvo do acordo judicial existiam decisões judiciais nas quais já havia o reconhecimento de nulidade dos autos de infração ou determinação liminar de não inclusão do nome da empresa no Cadastro.

Também deve-se registar que é prática corriqueira do Ministério Público do Trabalho a celebração de acordos com empresas que são flagradas praticando trabalho análogo à de escravo. Conforme dados da ANAMATRA, de 2015 a 2020, o próprio Ministério Público do Trabalho firmou 1.402 termos de ajuste de conduta com empresas que praticaram trabalho análogo à de escravo.

2 – O MPT também critica a cláusula que estabelece um prazo de 30 dias para MRV adotar “providências para as devidas correções” caso sejam encontrados trabalhadores em condições análogas à de escravo nos empreendimentos da empresa. De acordo com o MPT: “Essa disposição é ilegal, pois contraria as disposições legais da fiscalização do trabalho e seu poder de polícia, retirando inclusive poderes dos autos de infração, que são lavrados a partir do flagrante de determinada situação irregular de trabalho. Além de ferir a lei (artigos 626 e seguintes da CLT), ofende-se também a proteção dada à Inspeção do Trabalho pela Convenção nº 81 da OIT.” Qual a posição da AGU sobre essa crítica?

RESPOSTA: É importante ressaltar que o Tribunal Regional do Trabalho da 3ª Região apreciou essa questão ao homologar o acordo. A cláusula contestada pelo Ministério Público do Trabalho não está relacionada a qualquer impedimento da prática de atos pela fiscalização do trabalho. No acordo também existem previsões no sentido de não haver interferência e limitação das competências e atribuições da fiscalização do trabalho ou que tenham caráter substitutivo do cumprimento das obrigações, das multas e dos prazos previstos na CLT.

Há que se destacar que o Ministério do Trabalho e Previdência, bem como o Ministério da Mulher, Família e Direitos Humanos participaram ativamente da elaboração da minuta de acordo. Sendo assim, evitou-se firmar qualquer ato que limitasse as respectivas competências legais da Auditoria Fiscal do Trabalho e da Advocacia-Geral da União.

3- O valor da multa de R$ 7 milhões, considerado pequeno diante do lucro líquido da empresa em 2021, de R$ 914 milhões e do histórico de violações trabalhistas, com 230 trabalhadores resgatados de condições análogas à escravidão. Qual a avaliação da AGU a respeito disso?

RESPOSTA: Cabe inicialmente esclarecer que o acordo não tem por intuito a arrecadação de valores para a União ou mesmo caráter meramente punitivo. O propósito do acordo é atacar o ciclo vicioso do trabalho análogo à de escravo.

Visto isso, o acordo celebrado pela União e pela MRV representa inequívoco avanço no combate ao trabalho análogo à de escravo, posto que concentra fortes atenções na adoção de medidas preventivas de condutas empresariais responsáveis e de medidas destinadas a oportunizar educação e trabalho para as pessoas em situação de vulnerabilidade.

O acordo prevê, ainda, medidas promocionais voltadas para o acesso à educação e ao trabalho por grupos suscetíveis de exclusões sociais e econômicas, assim como a necessidade de prover informações e conscientização quanto aos riscos do aliciamento e da prática de trabalho análogo ao de escravo e do trabalho infantil.

No presente caso foi estipulado que a MRV deverá realizar um número mínimo de 8 (oito) projetos sociais, de forma a atender no mínimo 3.000 (três mil) trabalhadores em situação de vulnerabilidade, além de fornecer capacitação profissional e requalificação para 690 (seiscentos e noventa) trabalhadores resgatados de trabalho em condições análogas às de escravo ou em situação de vulnerabilidade.

Também está prevista a adoção de programa de monitoramento continuado por parte da MRV, cujo objetivo é a implantação ou o aperfeiçoamento de medidas com o propósito de evitar possíveis novos episódios que eventualmente caracterizem a submissão de trabalhadores a condições análogas às de escravo.

Assim, o montante a ser dispendido pela empresa com o acordo em questão não se limita a R$ 7.000.000,00, que aliás se referem ao valor estipulado a título de dano moral coletivo e não a pagamento de multa. Além desse montante, a MRV deverá ressarcir a União em R$ 1.000.000,00 (um milhão de reais) relativo aos custos envolvidos nas ações fiscais realizadas, os valores pagos pela União concernentes ao seguro-desemprego, o pagamento integral do valor das multas administrativas decorrentes dos autos de infrações, o pagamento de eventuais débitos trabalhistas, incluindo FGTS, bem como dano moral individual devido aos trabalhadores envolvidos.

MRV

1 – O Ministério Público do Trabalho foi contra a assinatura do acordo. O MPT classificou o acordo como “melhor dos mundos” para a MRV, que saiu da Lista Suja, sem que houvesse previsão legal para que isso ocorresse. Qual a opinião da empresa sobre essa avaliação do MPT?  

Acordo Judicial é uma possibilidade absolutamente regular e legítima. No caso específico, as condições, obrigações e responsabilidades são adequadas e proporcionais.

2 – O MPT também critica a cláusula que estabelece um prazo de 30 dias para MRV adotar “providências para as devidas correções” caso sejam encontrados trabalhadores em condições análogas à de escravo nos empreendimentos da empresa.  De acordo com o MPT: “Essa disposição é ilegal, pois contraria as disposições legais da fiscalização do trabalho e seu poder de polícia, retirando inclusive poderes dos autos de infração, que são lavrados a partir do flagrante de determinada situação irregular de trabalho. Além de ferir a lei (artigos 626 e seguintes da CLT), ofende-se também a proteção dada à Inspeção do Trabalho pela Convenção nº 81 da OIT.” Qual a posição da MRV sobre essa crítica?

O Acordo, em absoluto, retira ou diminui qualquer poder ou atribuição da fiscalização do trabalho ou do Ministério Público do Trabalho, razão pela qual foi homologado sem ressalva.

3- O valor da multa de R$ 7 milhões, considerado pequeno diante do lucro líquido da empresa em 2021, de R$ 914 milhões e do histórico de violações trabalhistas, com 230 trabalhadores resgatados de condições análogas à escravidão. Qual a avaliação da MRV a respeito disso?

A MRV nunca reconheceu –porque nunca praticou—as condições lançadas pela fiscalização. O Acordo possibilita encerrar os processos sem discutir o mérito da controvérsia. A empresa não está na lista. Todos os seus casos ainda estão em discussão.


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