Herdeiro de construtora que fechou contratos milionários sob Bolsonaro participou de ato golpista

Albert Mascarenhas filmou a própria atuação e instigou golpistas a avançarem rumo ao Congresso; engenheiro é filho de um dos sócios da construtora Meirelles Mascarenhas, que abocanhou contratos milionários nos últimos anos e é investigada por suspeita de crime ambiental e superfaturamento
Por Diego Junqueira e Gisele Lobato
 13/01/2023

“Bora subir, gente, bora subir. Sou covarde não, vamos lá!”. Com palavras de ordem, o engenheiro Albert Alisson Gomes Mascarenhas avançou pelo gramado em frente ao Congresso Nacional, na tarde do último domingo (8), convocando apoiadores do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) para a invasão à sede do Legislativo em Brasília (DF).

Imagem retirada de vídeo de Albert Mascarenhas, durante transmissão ao vivo dos atos golpistas em Brasília em 8 de janeiro (Foto: Reprodução)

A ação – promovida por grupos contrários à eleição do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) – foi filmada e transmitida ao vivo pelo empresário, que é herdeiro de um conglomerado de empresas que abocanhou contratos milionários na gestão Bolsonaro, sendo um dos grupos mais beneficiados durante o governo de extrema direita.

Albert é filho de Ainesten Espírito Santo Mascarenhas, um dos donos da Construtora Meirelles Mascarenhas, com sede em Redenção, no sul do Pará, cidade de 86 mil habitantes onde predomina a criação de gado.

A empresa ganhou notoriedade nacional em 2020, quando chegou a ocupar o posto de construtora campeã de contratos com o governo federal. Nos quatro anos da gestão Bolsonaro, foram ao menos R$ 793 milhões em contratos fechados com a União (55% a mais do que nos quatro anos anteriores), segundo levantamento da Repórter Brasil com base no Portal da Transparência

A construtora tem forte presença nos estados da Amazônia Legal. Em 2020, a Meirelles Mascarenhas arrebatou projetos para a recuperação de trechos da rodovia Transamazônica e da BR-319, que liga Manaus a Porto Velho – obras de grande impacto ambiental e localizadas no arco do desmatamento na Amazônia. No ano passado, a companhia assinou três contratos com a Superintendência Regional do Dnit (Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes) no Amapá para a manutenção e recuperação de estradas federais, totalizando R$ 314 milhões. 

Além de construção de rodovias, as empresas da família atuam também no ramo de aluguel e venda de imóveis, supermercados, postos de combustíveis, aluguel de carros, entre outros.

Apesar de herdeiro, Albert não é sócio do pai em nenhuma empresa, mas no Instagram informa atuar em uma delas: o Posto Cristal, localizado em uma rodovia estadual em Redenção. Fundado em 2017, o estabelecimento começou a abastecer veículos de órgãos da União em junho de 2019, segundo o Portal da Transparência.

Atos golpistas contra a eleição do presidente Lula no domingo deixou sedes dos poderes destruídas em Brasília (Foto: Marcelo Camargo / Agência Brasil)

As imagens de Mascarenhas obtidas pela Repórter Brasil revelam parte da ação que vandalizou as sedes dos poderes da República na capital federal em 8 de janeiro. “Bora subir, os homens sobem!”, vangloria-se o empresário, enquanto se aproxima do prédio do Congresso Nacional.

Mascarenhas se mostra surpreso com a reação das forças de segurança, que tentam impedir o avanço da multidão bolsonarista por meio de bombas de efeito moral lançadas de helicópteros. “É muita covardia, cara. Por que eles não fazem isso contra a esquerda?”.

A Repórter Brasil tentou falar com Albert e Ainesten Mascarenhas por meio de redes sociais e dos telefones divulgados pelas empresas citadas, mas não obteve retorno. Após receber mensagem da reportagem por sua conta no Instagram, Albert apagou o perfil. O nome dele não consta entre os detidos pelos atos de domingo, segundo a lista divulgada pelo governo do Distrito Federal

Fraudes ambientais

Algumas empresas da família de Albert estão na mira das autoridades. No ano passado, a construtora Meirelles Mascarenhas e seus sócios foram alvo da Operação Candidus, que investiga fraudes ambientais identificadas pelo Ibama “visando a suposta movimentação de créditos florestais para esquentamento de madeiras de origem ilegal” nas obras da BR-156 – que corta o Amapá de sul a norte, até a fronteira do Brasil com a Guiana Francesa.

Como desdobramento da investigação, foi deflagrada a Operação Candidus II, após suspeita da CGU (Controladoria-Geral da União) de superfaturamento de mais de R$ 6 milhões no processo de contratação da empresa, sem licitação, para a execução de serviços emergenciais de manutenção da rodovia federal. A pedido do MPF e da Polícia Federal, em novembro, a 4ª Vara Federal Criminal no Amapá autorizou uma operação de busca e apreensão em mais de 20 endereços, dentre eles os da construtora e de Ainesten Mascarenhas.

Mesmo com as suspeitas, a companhia ganhou novo contrato para a manutenção dos 822 km da mesma rodovia em novembro de 2022, ao custo de R$ 139 milhões e com validade até fevereiro de 2026.

O engenheiro Albert Mascarenhas ao lado do pai, Ainesten, sócio da Construtora Meirelles Mascarenhas (Foto: Reprodução/Redes Sociais)

O histórico de polêmicas das empresas da família, porém, não se limita ao governo Bolsonaro. Entre 2005 e 2018, a Meirelles Mascarenhas, juntamente com outra companhia da família, a Tescon Engenharia, receberam quase R$ 1 milhão em multas do Ibama por infrações ambientais. 

Em 2015, as duas empresas foram alvo de ação civil pública apresentada pelo Ministério Público Federal no Amazonas por causa de irregularidades nas obras no chamado “trecho do meio” da BR-319. As companhias foram contratadas em 2014 pelo Dnit para recuperar 400 quilômetros da estrada no Amazonas. O trecho aguardava licenciamento ambiental do Ibama para ser pavimentado, mas o departamento que cuida das estradas driblou essa exigência, obtendo autorização com o Instituto de Proteção Ambiental do Amazonas (Ipaam).

No mesmo ano, fiscalização do Ibama identificou uma série de problemas ambientais na execução do serviço, como desmatamento e soterramento de igarapés, além de violações trabalhistas, como a ausência de água, banheiros e alojamento adequados. O órgão ambiental aplicou multa e embargou a obra, e o MPF apresentou a ação para sua suspensão, pedido que foi acatado pela Justiça Federal no Amazonas à época.

Promessa de campanha de Bolsonaro ainda em 2018, o projeto de reconstrução da BR-319 ameaça 69 terras indígenas e, segundo pesquisadores, pode fazer explodir o desmatamento na região. Todos os governos, desde a gestão de Fernando Henrique Cardoso (1995-2002), apresentaram projetos para reformar a estrada, construída durante a ditadura militar. Em todos os casos, porém, o plano esbarrou no impacto ambiental da obra.

A construtora da família Mascarenhas atua em manutenção de rodovias situadas no arco do desmatamento, como a BR-319, que corta a floresta amazônica entre Porto Velho e Manaus (Foto: Dnit/Divulgação)





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