SERRAS CORTANDO OSSOS, esteiras carregando pedaços de carne, carcaças enfileiradas em ganchos percorrendo linhas de produção. Os frigoríficos estão entre os setores campeões em acidentes de trabalho — e a exposição diária ao ruído dos maquinários pode contribuir muito com isso.
O episódio de estreia do RB Investiga — novo programa da Rádio Batente, a central de podcasts da Repórter Brasil — mostra como o barulho excessivo gera diversos efeitos graves sobre o organismo, como distúrbios endócrinos e disfunção erétil, além de consequências aparentemente improváveis, como a perda de um dedo em uma máquina.
O RB Investiga é um podcast mensal, disponível no canal do Youtube da Repórter Brasil e nas principais plataformas de áudio.
Potencial equivalente ao de uma turbina de avião
Segundo o Ministério da Saúde, o ruído é um “agente de risco potencialmente estressor”. A exposição a níveis altos, ao longo de muitas horas ao dia, pode gerar irritabilidade e perda de concentração: um ambiente propício para acidentes.
“O ruído mata, causa traumas, amputação, eletrocussão. Há perda da concentração, diminuição dos reflexos e impaciência. As mulheres engordam porque a cortisona dispara, os homens ficam ficam com disfunção erétil porque tem alteração circulatória. É uma caixa de Pandora”, explica Paulo Rogério Albuquerque de Oliveira, coordenador da pós-graduação de Engenharia de Segurança do Trabalho da Universidade Paulista (Unip) do Distrito Federal.
Um empregado de um grande frigorífico no centro-oeste foi exposto a um barulho de 95,9 decibeis, segundo uma inspeção do Ministério Público do Trabalho. Ele trabalhava no abate e na sala de “quebra de cabeça” dos bois, sem protetor auditivo. Esse volume é equivalente ao barulho de uma furadeira ou de um cortador de grama, por pouco não chega ao nível de uma turbina de avião. O número fica bem acima do limite determinado pelo Ministério do Trabalho: 85 decibeis para uma jornada de 8 horas.
“Não tem como sair sadio no final do dia”, afirma Oliveira.
Ruído também é causa de perda auditiva
A exposição contínua a ruídos intensos também provoca alterações estruturais no ouvido. Perda auditiva e sensação de zumbido, limitação em reconhecer sons, e dificuldade de compreensão de fala são alguns dos sintomas mais comuns.
“Quando a gente fala especificamente de trabalhador, o ruído vai ser a principal causa da perda auditiva”, afirma Tatiane Meira, professora do departamento de fonoaudiologia da Universidade Federal da Bahia. Segundo ela, a situação dos empregados de frigoríficos pode ser ainda pior por conta da exposição ao frio e umidade. “Esse tipo de perda auditiva é irreversível”, complementa.
No entanto, o Ministério da Saúde alerta para outros efeitos nocivos, como transtornos neurológicos, digestivos, cardiovasculares e hormonais.
“Não tem discussão: além da perda auditiva, alterações vasculares já são comprovadas, que podem levar a alteração da pressão arterial, tontura, dor de cabeça e mal estar”, finaliza Roberto Ruiz, médico do trabalho da Universidade Federal de Santa Catarina e consultor de saúde da União Internacional de Trabalhadores da Alimentação (Uita).
Ficha técnica RB Investiga
Roteiro e apresentação: Isabel Harari
Edição de vídeo: Alex Duvidovich
Mixagem de áudio e desenho de som: Pedro Pena
Assistente de edição e imagens adicionais: Clarissa Palácio
Produção executiva e tratamento de roteiro: Carlos Juliano Barros