No Labirinto: vítima de escravidão doméstica por 33 anos aguarda indenização

Quarto episódio do podcast narra a história de empregada doméstica que viveu e trabalhou por mais de três décadas em casa de família paulistana; Empregadores foram condenados em primeira instância na Justiça do Trabalho ao pagamento de R$ 800 mil; A defesa recorreu
Por Repórter Brasil
 03/06/2024

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IARA PASSOU quase metade de seus 71 anos trabalhando como empregada de uma família na capital paulista, sem nunca ter recebido salário ou qualquer outro direito trabalhista. “É o que as patroas falam sempre pra gente: aqui em casa de família vocês não têm que pagar a roupa, não têm que pagar aluguel, não têm que pagar comida”, relata.

O trabalho em âmbito doméstico responde por 43 dos 248 novos casos de escravidão relacionados na mais recente atualização da “lista suja” do trabalho escravo, como é conhecido o cadastro de empregadores responsabilizados por esse crime, divulgado pelo Ministério do Trabalho e Emprego (MTE).

Esse é o tema do quarto episódio do podcast No Labirinto, programa da Rádio Batente, a central de podcasts da Repórter Brasil. Nesta segunda-feira (03), a apresentadora e roteirista Cláudia Jardim narra a história de Iara, nome fictício criado para proteger a identidade da trabalhadora. 

Depois de deixar um orfanato no interior de São Paulo, aos 10 anos, ela passou pela residência de diversas famílias, até chegar à casa de onde seria resgatada por autoridades, em 2022. A inspeção foi motivada por uma denúncia anônima: “Ela trabalha das 6 da manhã à meia-noite. A idosa não recebe salário, vestimentas, auxílio médico ou qualquer direito trabalhista”, dizia o texto do alerta.

Em entrevista ao podcast, a procuradora do Ministério Público do Trabalho (MPT), Aline Oishi, revela o que falou a Iara, ao retirá-la da casa onde havia vivido por mais de três décadas: “Esse é o momento da senhora sair daqui para a gente buscar uma outra vida”.

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Em março de 2023, o casal Maria Sidrônia Chaves de Oliveira e José Enildo Alves de Oliveira, empregadores de Iara, foram condenados em primeira instância pela 30ª Vara do Trabalho de São Paulo. A sentença determinou o pagamento de R$ 800 mil, incluindo salários, verba rescisória e indenização por danos morais. 

A defesa do casal entrou com recurso — a apelação poderá ser julgada ainda neste ano. A Repórter Brasil procurou o casal para uma entrevista. Porém, por meio de seu advogado, o pedido foi rejeitado. 

Nos autos do processo, Maria Sidrônia e José Enildo alegam inocência. A defesa sustenta que “todos nutrem muito carinho por ela” e que “nunca existiu relação laboral porque ela é considerada como um membro da família”. 

Na decisão, a juíza Maria Fernanda Zipinotti Duarte afirmou que as “condições análogas à de escravo”, como definido pela legislação, são especialmente cruéis quando se trata de trabalho doméstico. 

“Por óbvio, a trabalhadora desprovida de salário por mais de 30 anos não possui plena liberdade de ir e vir. Não possui condições de romper a relação abusiva de exploração de seu trabalho, pois desprovida de condições mínimas de subsistência longe da residência dos empregadores, sem meios para determinar os rumos de sua própria vida”, sustentou a magistrada na sentença. 

Ficha técnica No Labirinto

Roteiro e apresentação: Claudia Jardim

Produção: Raquel Baster 

Desenho sonoro e mixagem: Niquini Júnior

Música: tepeyac usto 

Arquivo: Agência Nacional – Propaganda da ditadura militar 

Ilustração: Kael Abello – Utopix 

Edição de vídeo: Bruna Damin

Redes Sociais: Tamyres Matos e Beatriz Vitória

Coordenação: Carlos Juliano Barros

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