Demarcação é aliada do clima, dizem Kaiowá na COP após novo assassinato em MS

Lideranças denunciam superlotação das reservas e retomada de territórios tradicionais após décadas de expulsões; morte de jovem Kaiowá é lembrada durante Conferência do Clima da ONU
Por Isabel Harari | Edição Diego Junqueira

DUAS LIDERANÇAS GUARANI KAIOWÁ defenderam nesta segunda-feira (17) a demarcação de terras indígenas como uma das estratégias mais eficazes no combate às mudanças climáticas. A fala ocorre no momento em que o povo lamenta a morte de Vicente Fernandes, jovem Guarani Kaiowá assassinado com um tiro na cabeça durante ataque ocorrido na madrugada de domingo (16), em Iguatemi (MS).

“A gente está aqui para repudiar e trazer a voz na comunidade indígena, que a nossa luta não é só pelo território. Mas garantir o território é minimizar as mudanças climáticas”, afirmou Voninho Benites Pedro, durante protesto indígena hoje na capital paraense, onde ocorre a Cúpula do Clima da ONU, a COP30.

Braulio Kaiowá, outra liderança Guarani Kaiowá, reforçou que a violência em Mato Grosso do Sul atinge crianças, mulheres e anciãos, muitas vezes em ações policiais sem ordem judicial.

“O povo, as mulheres e as crianças estão sendo atacadas pela força policial do Estado. Isso é preocupante para nós.”

Durante ataque à retomada em Iguatemi, casas e utensílios domésticos foram queimados pelos jagunços, segundos a comunidade Kaiowá (Foto: Arquivo pessoal)
Durante ataque à retomada em Iguatemi, casas e utensílios domésticos foram queimados pelos jagunços, segundos a comunidade Kaiowá (Foto: Arquivo pessoal)

Para Braulio, a demarcação das terras tradicionais é fundamental para conter o avanço das mudanças climáticas e garantir a continuidade das florestas em pé.

“A gente luta para defender a biodiversidade, a natureza, para ter as florestas em pé. A demarcação das nossas terras ajuda a mitigar isso, porque nós somos os defensores da floresta”, disse.

Segundo os líderes indígenas presentes na COP, somente a garantia dos territórios permitirá proteger florestas e os modos de vida responsáveis pela preservação dos biomas brasileiros — uma tarefa que, afirmam, não estão conseguindo cumprir devido à violência e à paralisação das demarcações.

ASSINE NOSSA NEWSLETTER

Voninho lembra que o histórico de expulsões forçadas em Mato Grosso do Sul resultou em superlotação das atuais reservas indígenas no estado, criadas ainda no período do antigo SPI (atual Funai). Para ele, as retomadas são um retorno legítimo aos territórios tradicionais.

“Nosso povo foi retirado das comunidades e jogado na reserva. Hoje estamos voltando e retomando o que é nosso, o que a gente perdeu. A gente não está fazendo nada a mais do que garante a Constituição”, disse Voninho.

Ele também relata que a mesma comunidade onde ocorreu o assassinato vem sofrendo ataques recorrentes, que se intensificaram nos últimos meses.

'A resposta somos nós' era o mote da manifestação indígena na manhã desta segunda-feira em Belém (Foto: Isabel Harari/Repórter Brasil)
‘A resposta somos nós’ era o mote da manifestação indígena na manhã desta segunda-feira em Belém (Foto: Isabel Harari/Repórter Brasil)

Braulio também defende as ações de retomada como retorno a territórios tradicionais e de ocupação ancestral do povo Guarani Kaiowá.

“O território guarani caiu lá na década de 40, 50, meu povo foi expulso de lá. Então, a gente não está invadindo, a gente está retornando para um território tradicional, segundo os anciãos.”

As lideranças cobraram que a COP30, voltada a compromissos globais contra a crise climática, reconheça que a demarcação de terras indígenas é um dos caminhos para proteger florestas, reduzir emissões e manter a biodiversidade viva. Para isso, o Estado brasileiro precisa garantir segurança, respeito constitucional e proteção às comunidades, eles dizem — antes que novas mortes aconteçam.

Leia também

APOIE

A REPÓRTER BRASIL

Sua contribuição permite que a gente continue revelando o que muita gente faz de tudo para esconder

LEIA TAMBÉM

Braulio (à esq.) e Voninho, lideranças Guarani Kaiowá, lamentam morte de líder indígena em Iguatemi, assassinado com um tiro na cabeça em uma retomada dentro da Terra Indígena Iguatemipeguá I, cujo processo de demarcação não está concluído (Foto: Isabel Harari/Repórter Brasil)
Assine nossa newsletter!

Receba o conteúdo da Repórter Brasil direto na sua caixa de email.
Assine nossa newsletter.