Governo Lula vai assentar famílias do maior acampamento sem-terra do Brasil

Medida atenderá ao menos parte das cinco mil famílias do acampamento Terra e Liberdade, em Parauapebas (PA), disse à Repórter Brasil o ministro do Desenvolvimento Agrário, Paulo Teixeira, durante a COP-30
Por Daniel Camargos

DE BELÉM (PA) — O governo Lula vai assentar em dezembro ao menos parte das 5 mil famílias do maior acampamento sem-terra do país: o Terra e Liberdade, localizado em Parauapebas, no sudeste do Pará.

Em entrevista à Repórter Brasil durante a COP30, o ministro do Desenvolvimento Agrário, Paulo Teixeira, afirmou que o presidente Lula viajará no mês que vem para a região para anunciar um acordo entre o governo federal, a mineradora Vale e movimentos sociais.

O acampamento Terra e Liberdade abriga cerca de 5 mil famílias em uma área pública da União, próxima à Estrada de Ferro Carajás, operada pela Vale. “Daqui um mês, o presidente Lula vai entregar um grande acordo nosso com a Vale e os movimentos sociais para resolver parte daquele caldeirão de conflito agrário que tem na região de Parauapebas e Carajás”, disse o ministro.

Teixeira afirmou que a medida prevê “a criação de vários assentamentos na região”. Perguntado sobre mais detalhes, ele disse que não poderia adiantar informações, pois esvaziaria a agenda do presidente. 

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O anúncio previsto para dezembro ocorrerá na região que há décadas é a mais conflituosa do país. Foi lá que, em 1996, a Polícia Militar matou 19 trabalhadores rurais sem-terra em Eldorado do Carajás, episódio que marcou a luta pela reforma agrária. 

Hoje, a presença da Vale, que opera a maior mina de ferro do mundo em Carajás, mantém o território sob pressão: grandes áreas públicas foram cercadas por fazendas e projetos minerários, enquanto milhares de famílias continuam acampadas à espera de regularização. 

O Terra e Liberdade nasceu nesse contexto, com ocupações organizadas em terras federais não destinadas pelo MST (Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra e pela Fetagri-PA (Federação dos Trabalhadores na Agricultura do Estado do Pará).

O acampamento ficou conhecido nacionalmente em 2023, quando um incêndio provocado por uma descarga elétrica durante a instalação de uma antena matou nove pessoas. Entre elas, uma criança de seis anos.

O episódio escancarou o abandono do poder público. Em agosto deste ano, após dez dias de protesto na praça central de Parauapebas, o MST conquistou um avanço: firmou um acordo com a prefeitura para integrar a Escola 9 de Dezembro, construída pelos próprios acampados, à rede municipal. O prédio improvisado atende cerca de 500 crianças.

‘Retomada’ da política agrária

Existem hoje mais de 100 mil famílias acampadas no país, distribuídas em mais de 1.300 terras ocupadas. Teixeira afirma que desde sua posse, em 2023, o Ministério do Desenvolvimento Agrário  tenta destravar o processo de reforma agrária no Incra (Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária), afetado pelo desmonte herdado do governo Bolsonaro.

A promessa de criação de assentamentos no Pará ocorre em paralelo à tentativa do governo de recuperar áreas de reforma agrária tomadas pelo agronegócio. Perguntado, Teixeira falou sobre o caso do assentamento Tapurah/Itanhangá, no norte do Mato Grosso, outro foco da “retomada”da política agrária.

“O Incra está na Justiça recuperando essas terras. Já ganhamos, mas a pressão do agro é muito forte. Pressiona a Justiça, pressiona as autoridades, mas nós não voltamos um centímetro atrás”, afirmou Teixeira.

Criado em 1995 para mais de mil famílias, em uma área de 115 mil hectares, o projeto tornou-se símbolo da captura da reforma agrária pela soja. Investigações da Polícia Federal e do Ministério Público Federal mostraram que fazendeiros e empresários transformaram o assentamento em lavouras privadas, comprando e arrendando lotes de forma ilegal. Reportagens da Repórter Brasil revelaram que mais de mil lotes foram parar nas mãos de cerca de 80 grupos econômicos.

Teixeira disse ainda que o Incra prepara um novo modelo de crédito rural com assistência técnica embutida e assentamentos organizados em agrovilas e cooperativas.

Segundo o ministro, um “novo ciclo da reforma agrária” deve combinar produção de alimentos, redução da violência e transição agroecológica. “A agricultura familiar tem DNA agroecológico, assim como os povos da floresta. São eles que produzem o alimento que vai para a mesa do povo brasileiro”, afirmou.

Ele acrescentou que a reforma agrária é parte da resposta à crise climática: “Historicamente, o Brasil doou terra à grande propriedade, e isso gerou desigualdade. O mecanismo de enfrentamento disso é a reforma agrária”.

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