DE BELO HORIZONTE (MG) – Um dos 21 presos preventivamente pela PF (Polícia Federal) na manhã desta quarta (17), durante a Operação Rejeito, é um aliado próximo do PL (Partido Liberal) e de expoentes da legenda, como o ex-presidente Jair Bolsonaro e o deputado federal Nikolas Ferreira.
O geógrafo Gilberto Henrique Horta de Carvalho, de 38 anos, foi candidato na última eleição do Crea-MG (Conselho Regional de Engenharia e Agronomia de Minas Gerais), em 2023. Naquela oportunidade, recebeu apoio de Bolsonaro, Nikolas e de outros políticos conservadores, entre eles os deputados federais Eduardo Bolsonaro (SP) e Marcos Feliciano (SP); os senadores Magno Malta (ES) e Cleitinho Azevedo (MG); e o general Braga Neto. Todos gravaram vídeos de apoio publicados no Instagram de Gilberto.
Carvalho acabou derrotado na eleição do conselho. Segundo a investigação da PF desde antes da disputa ele já estaria envolvido com uma organização criminosa para fraudar licenças ambientais, corromper servidores e lavar dinheiro com a exploração de minério de ferro em Minas Gerais, com lucros de R$ 1,5 bilhão e projetos avaliados em R$ 18 bilhões.
Em um dos vídeos, Bolsonaro pediu votos para Carvalho afirmando que era necessário “votar certo, com conservadores, pessoas de direita”. Nikolas também gravou dois vídeos de apoio, dizendo que era preciso “tirar a esquerda de um órgão dominado há 30 anos”. A Justiça Federal determinou a prisão preventiva de Carvalho, o bloqueio de seus bens e a suspensão das atividades de empresas em que atuava como sócio.
Procurada, a assessoria de imprensa do PL não se manifestou até a publicação desta matéria. A reportagem não conseguiu contato com a defesa de Carvalho. O texto será atualizado se os posicionamentos forem recebidos.
A Operação Rejeito segue em andamento, com policiais federais em escritórios e órgãos públicos de Belo Horizonte. Os presos poderão responder por crimes ambientais, corrupção ativa e passiva, lavagem de dinheiro, usurpação de bens da União, organização criminosa, violação de sigilo funcional e embaraço às investigações.
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Grupo teria criado empresa para comprar licenças ambientais
A investigação da PF à qual a Repórter Brasil teve acesso reconstrói cinco anos de atuação do grupo. Em 2020, a primeira fase, chamada Poeira Vermelha, já identificava exploração mineral irregular em áreas tombadas e em unidades de conservação na Serra do Curral, um dos principais símbolos de Belo Horizonte.
Houve então a deflagração de operações, mas a corporação registrou vazamento de informações sigilosas que frustrou o cumprimento de mandados. Conversas recuperadas mostraram que investigados foram avisados da data das diligências e destruíram provas.
Entre 2021 e 2022, a rede teria expandido suas empresas, criando mineradoras sobrepostas e subsidiárias em nome de diversas pessoas. O faturamento ilícito nesse período foi estimado em R$ 300 milhões, segundo denúncia do MPF (Ministério Público Federal).
Em 2023, quando Carvalho disputava a eleição do Crea-MG, as tratativas empresariais continuavam. Mensagens de março daquele ano mostram o então candidato recebendo estudos sobre uma mineradora em Ouro Preto.
O projeto incluía uma barragem classificada pelo MPF entre as mais perigosas do país. Nas conversas, havia preocupação com cláusulas que transferiam a responsabilidade pelos danos da estrutura, e menções a um delegado da PF que deveria tratar do assunto com advogados. Carvalho aparecia como elo de ligação entre empresários e servidores.
No início de 2024, o grupo teria criado uma nova empresa para comprar licenças ambientais e explorar áreas de minério em Ouro Preto. A composição societária incluía nomes próximos de Carvalho. Segundo a PF, a empresa tinha como função expandir frentes de atuação e blindar os sócios já investigados.
Em abril de 2025, a Justiça reconheceu a gravidade do risco da barragem citada nas mensagens. Dois meses depois, em junho, a PF anexou novos documentos que mostravam tentativas de interferir em investigações, monitoramento de autoridades do Judiciário e do Ministério Público e destruição de provas.
PF acusa servidores de facilitar aprovação de projetos de mineração
As investigações resultaram na deflagração da Operação Rejeito, que levou à prisão de Carvalho e de outros dez investigados. A PF afirma que ele aparecia como sócio e articulador, responsável por intermediar contratos e encontros com autoridades. O grupo controlava diversas mineradoras.
Na Serra do Curral, área tombada em Belo Horizonte, a rede teria avançado com cessões de lavra e empresas controladas pelos sócios. O objetivo seria o de viabilizar projetos em desacordo com o tombamento e sem análise do Iphan e do IEPHA. Servidores da ANM (Agência Nacional de Mineração) e de órgãos ambientais estaduais teriam atuado para liberar os processos.
As mensagens reveladas pela PF mostram também a manipulação de normas da ANM. Em reunião de novembro de 2024, empresários discutiram com dirigentes da agência sobre como “reinterpretar” uma resolução de 2021 sobre pilhas de rejeito estéril. Cláusulas contratuais previam pagamento condicionado a essa mudança regulatória. A PF afirma que Carvalho participou dessas negociações.
O fluxo financeiro era operado por uma rede de empresas interpostas. Só uma delas registrou mais de R$ 4 bilhões em valores brutos entre 2019 e 2024, com créditos efetivos de R$ 1 bilhão. Parte desse montante teria sido repassada a Carvalho, segundo a PF.
Além de empresários, foram presos servidores públicos de órgãos federais e estaduais ligados à mineração e ao meio ambiente. Eles são acusados pela PF de facilitar aprovações em desacordo com a legislação. Também foram citados operadores financeiros responsáveis por pagamentos em espécie e gestores de empresas de fachada, além da existência de monitoramento de autoridades do Judiciário e do Ministério Público.
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