A REPÓRTER BRASIL encerra os trabalhos de 2025 já projetando o próximo ano — aquele em que eleitores de todo o país vão às urnas para escolher governadores, parlamentares e o Presidente da República.
Nos últimos doze meses, investigamos temas complexos e sensíveis, com um olhar apurado para questões que afetam as populações mais vulneráveis do país.
Nossas reportagens trouxeram à tona denúncias sobre trabalho escravo e infantil, desmatamento ilegal, impactos da mineração, abusos ambientais, além de agressões aos direitos básicos de comunidades tradicionais.
Tudo isso estará em jogo nas eleições majoritárias do ano que vem. Temas caros à Repórter Brasil — como os impactos da exploração dos minerais críticos e os efeitos dos novos marcos regulatórios sobre agrotóxicos e licenciamento ambiental, para citar alguns exemplos urgentes — precisam estar contemplados nos programas de governo dos candidatos, com a seriedade que merecem.
Seguiremos atentos para pautar esses e outros debates. Confira alguns dos destaques da nossa produção jornalística em 2025.
E aproveitamos para desejar boas festas neste fim de ano!
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O trabalho infantil de influenciadores mirins no Youtube e no TikTok
Dando continuidade à série especial sobre trabalho infantil na indústria de tecnologia, iniciada em 2024, a repórter Isabel Harari mergulhou no universo de crianças e adolescentes que se dedicam a atividades artísticas em redes sociais.
A legislação brasileira determina expressamente a necessidade de autorização da Justiça para a atuação desse público no teatro e na televisão.
No caso de grandes plataformas como Youtube e TikTok, no entanto, um vácuo de regulamentação e de fiscalização abre a porteira para que influenciadores mirins façam publicidade de “produtinhos” e até anúncios de jogos de azar.
Em outubro, a série de reportagens foi contemplada com o Prêmio Vladimir Herzog de Anistia e Direitos Humanos de 2025 na categoria “produção jornalística em texto”, um dos mais prestigiados do jornalismo brasileiro.
PL do Veneno, PL da Devastação
Numa demonstração de força contra o governo federal, mostramos como o Congresso — influenciado sobretudo pela bancada ruralista — impôs derrotas em série ao terceiro mandato de Lula para afrouxar a proteção ambiental, mesmo em meio à catástrofe climática no Rio Grande do Sul.
Uma das mais significativas quedas de braço aconteceu em maio, quando parlamentares derrubaram os vetos do presidente Luiz Inácio Lula da Silva à nova lei dos agrotóxicos, apelidada por ambientalistas de “Lei do Veneno”.
O texto alterou o sistema de aprovação de agrotóxicos, tirando o poder do Ibama (Instituto Brasileiro do Meio Ambiente) e da Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária). Com a derrubada dos vetos, a palavra final na liberação de pesticidas ficou inteiramente nas mãos do Ministério da Agricultura.

No segundo semestre, foi a vez de o Congresso atender a interesses de mineradoras e do agronegócio para reformar o processo de licenciamento ambiental do país.
Basicamente, o texto permite que empreendimentos obtenham licenças de forma automática, apenas com base na autodeclaração do empreendedor, sem necessidade de análises técnicas prévias. A única exceção é para casos classificados como de “alto risco ambiental”.
Especialistas apontam que o PL compromete a prevenção de danos ambientais e enfraquece a capacidade de fiscalização dos órgãos competentes.
A foto do trabalhador espancado em uma carvoaria ligada à Toyota
Em setembro, o repórter especial Daniel Camargos trouxe à tona um caso brutal de trabalho escravo que revela a conexão improvável entre uma carvoaria do interior do Maranhão, uma siderúrgica do coração da Amazônia e a maior montadora de automóveis do mundo: a Toyota.
O ponto de partida da investigação foram as fotos de um trabalhador espancado e amarrado em um alojamento de uma carvoaria. Os violentos retratos teriam sido feitos pelo próprio encarregado do estabelecimento, como forma de mostrar autoridade perante outros funcionários, em julho de 2021.
Quatro anos depois, Camargos viajou até o Maranhão para conectar os pontos da foto esquecida em um relatório de fiscalização do Ministério do Trabalho e Emprego, e mostrar como o carvão abastecia a Viena Siderúrgica.
Com duas unidades em operação no país, uma no Maranhão e outra em Minas Gerais, a indústria abastece de ferro-gusa, uma liga metálica com várias aplicações, plantas industriais da Toyota nos Estados Unidos.
Indígenas isolados na Amazônia, mas cercados por minerais críticos
Atividade econômica estratégica, discutida pessoalmente entre os presidentes Lula (Brasil) e Donald Trump (Estados Unidos), a exploração dos chamados “minerais críticos”, como são conhecidas as substâncias usadas em produtos como chips, torres eólicas e carros elétricos, pode afetar ao menos 45 povos indígenas isolados na Amazônia Legal.
Um levantamento exclusivo da Repórter Brasil apontou 1.827 pedidos de mineração de cobre, lítio, terras raras e outros 13 elementos — usados sobretudo na indústria de tecnologia — a menos de 40 km de grupos indígenas isolados.
A essa distância, as atividades minerárias representam um risco para a integridade desses povos, afirma o OPI (Observatório dos Povos Indígenas Isolados), organização de defesa dos direitos dessas comunidades.
A reportagem faz parte de um projeto de investigação da jornalista Isabel Harari, da Repórter Brasil, com o apoio da Rainforest Investigations Network, do Pulitzer Center.

O trabalho precário na colheita de café na Colômbia
Numa investigação internacional, a repórter e editora Poliana Dallabrida revela como o café colombiano — incensado como um dos melhores do mundo — também é marcado por denúncias de violações trabalhistas e de direitos humanos em sua cadeia de produção.
Segundo um estudo de 2022 da OIT (Organização Internacional do Trabalho), a informalidade na colheita de café da Colômbia pode superar os 80%. Sem registro, tampouco há garantia de direitos como aposentadoria, licença maternidade e proteção em caso de doenças e acidentes.
A reportagem alcançou grande repercussão em veículos de mídia internacional e gerou anúncios de certificadoras cobrando melhorias nas condições trabalhistas de fazendas de café do país, incluindo reformas em alojamentos.

O Agro Quer Tudo
No projeto que investiga como o agronegócio ocupa espaços em espaços de poder e de produção de conhecimento, mostramos como uma importante entidade do agronegócio do Mato Grosso atuou na realização de estudos científicos na Unicamp (Universidade Estadual de Campinas) sobre os impactos causados pelo próprio setor.
Documentos obtidos com exclusividade pela jornalista Hélen Freitas detalham como a Aprosoja-MT (Associação dos Produtores de Soja e Milho) financiou e participou diretamente de etapas cruciais de pesquisas sobre a exposição de trabalhadores rurais a dois agrotóxicos bastante populares: o glifosato e o paraquate.
A reportagem revela como a associação selecionou trabalhadores rurais para o estudo, indicou laboratórios responsáveis pela coleta de amostras de urina em campo e cuidou até da logística para envio do material à Unicamp.
O especial “O Agro Quer Tudo” também aponta como o setor, um dos mais importantes da economia brasileira, age para conquistar corações e mentes por meio do “agronejo”.

O estilo musical une tradição sertaneja a elementos de pop, funk e eletrônico e tem como marcas o reforço da identidade rural e as referências explícitas ao poder do agronegócio, retratado como potência política, econômica e cultural. A matéria também mostra como o gênero foi apropriado por setores do campo ideológico da direita — e do bolsonarismo.
O ‘diesel verde’ ligado a desmatamento
Documentos obtidos pelo repórter Murilo Pajolla demonstram como a DGD (Diamond Green Diesel), empresa dos Estados Unidos líder na produção de diesel feito a partir de fontes renováveis, importou sebo bovino de um fornecedor abastecido por indústrias de abate brasileiras, que compraram de fazendas autuadas por desmatamento ilegal.
A Repórter Brasil identificou conexões da DGD com frigoríficos que compraram animais de pecuaristas multados por práticas associadas ao desmate ilegal de grandes áreas.
Em seu site, a DGD afirma que o combustível produzido em seu parque industrial reduz emissões de gases do efeito estufa em até 80% na comparação com o diesel de origem fóssil, mas não menciona medidas para evitar a compra de sebo oriundo de pastagens associadas ao desmatamento. A empresa não respondeu aos questionamentos enviados pela reportagem.
A intervenção de um ministro de Lula na fiscalização do trabalho escravo
No segundo semestre, a cúpula do Ministério do Trabalho e Emprego interveio três vezes para retirar empresas da chamada Lista Suja do Trabalho Escravo.
O cadastro oficial do governo federal torna públicos os dados de empregadores responsabilizados pela prática e é usado como referência por bancos e empresas em suas análises de risco.
Em setembro, o titular da pasta, Luiz Marinho, “avocou” (chamou para si) a competência sobre o assunto e cancelou a inserção da JBS Aves no cadastro, ato nunca antes realizado.

A medida despertou críticas sobre “politização” do sistema de combate ao trabalho escravo e motivou a renúncia coletiva de auditores fiscais do ministério responsáveis por cargos de coordenação regional.
Outras duas empresas foram beneficiadas por decisões semelhantes. Em dezembro, a Justiça atendeu a pedido do Ministério Público do Trabalho e determinou a reinserção dos nomes na Lista Suja.
A cobertura especial da COP30, em Belém
A Repórter Brasil também marcou presença na COP30, a 30ª Conferência do Clima da ONU, realizada em novembro, na capital paraense.
Ao longo de duas semanas, nosso time de jornalistas mostrou como indígenas Munduruku bloquearam a entrada do principal pavilhão do evento para forçar o governo brasileiro a debater projetos de grande impacto para comunidades tradicionais da Amazônia, como a construção da hidrovia no rio Tapajós, no Pará.
A mobilização gerou algumas das imagens mais icônicas de toda a cobertura da COP30, capturadas pelo fotógrafo da Repórter Brasil, Fernando Martinho: o presidente da conferência, André Corrêa do Lago, segurando no colo um bebê Munduruku.

Nossa equipe também mostrou em primeira mão que faxineiros terceirizados das instalações em Belém eram obrigados a fazer suas refeições sentados no chão, ao lado da porta de sanitários.
A reportagem de Hélen Freitas fez o Ministério Público do Trabalho cobrar explicações dos organizadores da COP30. No dia seguinte à publicação, os funcionários da limpeza foram alocados em um refeitório.
Durante a cúpula do clima da ONU, a Repórter Brasil acompanhou painéis mostrando os planos das indústrias da mineração, dos alimentos e do agronegócio para emplacar discursos de sustentabilidade.

Também cobriu as manifestações de movimentos sociais e o Tribunal dos Povos, organizado para julgar simbolicamente violações socioambientais cometidas por grandes companhias na Amazônia.
Por fim, a Repórter Brasil organizou mais de uma dezena de sessões na COP30 do novo documentário da organização, “Pau D’Arco”, sobre a chacina de dez sem-terra cometida pela polícia em maio de 2017, no sul do Pará. As exibições contaram com a participação da diretora do filme, a jornalista Ana Aranha.
O documentário já conquistou sete prêmios e foi selecionado para alguns dos mais relevantes festivais de cinema do país, como É Tudo Verdade, Festival de Cinema de Brasília, Festival do Rio e AmazôniaFiDoc.
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