É possível que a quantidade produzida de milho supere a de soja ainda nesta safra, segundo projeção do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Recordes no segmento de grãos devem ser batidos e o milho – muito menos badalado do que a soja – começa a ganhar cada vez mais espaço entre as commodities agrícolas brasileiras no mercado internacional.
Há poucos anos, o Brasil atuava como coadjuvante no cultivo de milho e hoje desponta como o maior candidato a suprir a demanda pelo grão.
Diversas variáveis contribuem para essa recente expansão. O fator de maior peso entre os que estimulam a alta nas cotações de milho (e vem animando os produtores nacionais a ocupar áreas de soja com o grão) é o programa norte-americano de etanol. Lá, a matéria-prima utilizada para gerar o agrocombustível é justamente o milho. Com isso, o grão produzido em terras norte-americanas, que antes se destinava em grande parte à exportação – os EUA ainda figuram como maiores exportadores mundiais do produto – tem sua participação reduzida no contexto internacional.
Isso abre perspectiva para que os maiores produtores depois dos EUA, Argentina e Brasil, passem a preencher o vazio deixado pelos EUA. E apesar de ter excedente de produção apenas nas duas últimas safras, o Brasil está em vantagem, pois ainda tem áreas para expandir a produção, enquanto que as terras do vizinho sul-americano estão saturadas.
Outro elemento que esquenta esse quadro é a mudança de papel da China. Antes exportador, o país vem reduzindo drasticamente seus estoques e deve, em breve, passar a importar o grão.
"O milho, o petróleo e a China são os grandes vilões da crise dos alimentos", atesta Marco Antonio de Carvalho, pesquisador da Companhia Nacional de Abastecimento (Conab). Para ele, essa associação se articula em torno do projeto norte-americano de produção de etanol a partir do milho. Com a alta do petróleo, a busca por alternativas energéticas se torna cada vez mais urgente. Além disso, a elevação nos preços do barril de combustível fóssil influi diretamente no campo, na medida em que inflaciona os fretes e os fertilizantes, derivados de petróleo. Esses fatores, somados à saída da China – e seus elevados índices de consumo – do posto de fornecedora, pressionaram para o aumento do preço do grão no cenário global.
Na visão de João Carlos Garcia, da divisão da Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa) especializada em milho e sorgo, "não faltou milho no mercado, mas os estoques estão muito baixos". "Isso gera uma situação de incerteza, o que é maravilha para especulação", analisa. "Não existe escassez, nem crise de abastecimento: é puro desequilíbrio entre oferta e demanda", emenda Carvalho, da Conab.
Diante da alta do milho, a euforia dos produtores mais capitalizados pode ser a outra face da angústia dos pequenos produtores. Estes últimos não cultivam milho em suas propriedades, mas dele dependem para alimentar seus animais. Isso já se expressa na alta dos preços de aves e suínos.
Para tentar evitar esse impacto sobre os agricultores menores, a Conab tem tentado interferir no mercado por meio de leilões. No mês passado, anunciou ainda o envio de mais de 77 milhões de toneladas de milho para unidades em todo o país, volume que se destinará justamente a esses pequenos produtores por preços abaixo do mercado. A Região Nordeste, que apresenta a maior carência pelo grão, será a mais beneficiada pela iniciativa da companhia.
Ainda assim, o próprio técnico da Conab é cético quanto ao efeito dessas medidas para mitigar os impactos aos pequenos. "Eles vão sentir muito. E têm que tomar cuidado para não serem expurgados do mercado", avalia Carvalho.
Leia o relatório "O Brasil dos Agrocombustíveis – impactos das lavouras sobre a terra, o meio e a sociedade: soja e mamona", primeiro de uma série de documentos sobre o tema
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