Balanço 2006 – Parte 1

Fiscalização aumenta e número de trabalhadores libertados cai

Estatísticas preliminares do Ministério do Trabalho e Emprego indicam número recorde de fiscalizações em 2006 e queda no número de trabalhadores libertados da escravidão em relação a 2005
Por Iberê Thenório
 26/12/2006

Levantamento preliminar realizado pelo Ministério do Trabalho e Emprego (MTE) indica que o número de trabalhadores encontrados em situação análoga à de escravos, em operações de fiscalização em 2006, foi 26,7% menor com relação a 2005. Neste ano, houve 3187 libertados, contra 4348 no ano passado. O número de fiscalizações, contudo, foi o maior desde a criação do grupo móvel (que checa denúncias e liberta trabalhadores escravizados):ao todo ocorreram 100 operações – 15 a mais que em 2005. Ao longo do ano, foram pagos R$ 5.946.557,88 em direitos trabalhistas aos libertados. Há dados ainda sendo computados, porém, de acordo com o MTE, o número final não sofrerá grande variação. Desde 1995, 21.538 pessoas foram resgatadas de condições análogas à escravidão, segundo o MTE. O número de libertados em 2006 é o terceiro maior do período, ficando atrás apenas de 2005 e 2003 quando se resgataram 4348 e 5223 pessoas, respectivamente. As operações de fiscalização que resultam nas libertações são realizadas por sete equipes que integram o grupo móvel do MTE, e por equipes das Delegacias Regionais do Trabalho.

Ano Operações Trabalhadores libertados Total de indenizações (em R$)
2006* 100* 3187* 5.946.557,88*
2005 85 4348 7.820.211,26
2004 72 2887 4.905.613,13
2003 67 5223 6.085.918,49
2002 30 2285 2.084.406,41
2001 26 1305 957.936,46
2000 25 516 472.849,69
1999 19 725
1998 18 159
1997 20 394
1996 26 425
1995 11 84
Total 499 21358 28.273.493,32

Fonte: Ministério do Trabalho e Emprego
* Números parciais.
O quadro mostra que, ao longo dos anos, houve um aumento considerável no número de operações de fiscalização, portanto, da ação repressiva do poder público contra o problema. Um fato que corrobora isso é que mais recursos foram alocados à fiscalização – de R$ 1,17 milhões, em 2003, a R$ 4,077 milhões, em 2006.Infelizmente, o sistema de combate ao trabalho escravo carece de uma estatística atualizada que mostre quantas pessoas estão em situação de escravidão no país. Hoje, o dado mais utilizado origina-se de cálculos de 2002 da Comissão Pastoral da Terra (25 mil), e diz respeito ao número de pessoas anualmente escravizadas na Amazônia. Mas a própria instituição considera que uma estimativa mais precisa é necessária para o planejamento de políticas.Sem uma referência com dados nacionais e, principalmente, regionais é difícil mensurar o impacto das ações de fiscalização no total de trabalhadores escravizados. Na última reunião da Comissão Nacional para a Erradicação do Trabalho Escravo (Conatrae), o ministro da Secretaria Especial dos Direitos Humanos, Paulo Vannuchi, convocou as entidades que atuam no combate a esse crime para que seja realizado um esforço coletivo para, no início de 2007, calcular uma nova estimativa sobre o tamanho desse problema no país. Contudo, dados disponíveis mostram que a ação freqüente dos grupos móveis causou mudanças no comportamento dos empregadores. Parte deles adaptou-se à lei, como pode ser verificado pelas operações de monitoramento da Secretaria de Inspeção do Trabalho do MTE no que diz respeito aos relacionados na “lista suja”. Mas há os que reincindem no crime e têm desenvolvido formas para burlar a fiscalização. Denúncias e punição
Para o coordenador do combate ao trabalho escravo na CPT, Xavier Plassat, apesar da queda no número de libertados, o problema do trabalho escravo continua grave, já que não há grande variação no número de denúncias entre 2005 e 2006. Neste ano, segundo a CPT, foram registradas 266 de trabalho escravo, contra 278 no ano passado. Segundo ele, o número de trabalhadores envolvidos nas denúncias também teve queda inexpressiva. Passou de 7628 em 2005 para 7553 em 2006.
Xavier não vê com otimismo o ano de 2006: “Não houve progresso sobre a força de punição contra o trabalho escravo. Os instrumentos que tínhamos no início do ano ainda continuam os mesmos.” Um dos grandes instrumentos de combate ao trabalho escravo esperado pela CPT é a aprovação da Proposta de Emenda Constitucional 438, a “PEC do trabalho escravo“, que aguarda votação na Câmara. A emenda prevê o confisco de terras, sem indenização, em fazendas em que for encontrado trabalho escravo. Segundo o deputado Tarcísio Zimmerman (PT-RS), relator da PEC na Câmara, a emenda não foi votada neste ano por causa da oposição da bancada ruralista e porque o governo não a colocou como prioridade. “Se o Executivo e a Casa Civil colocarem, vota-se, e eu acho que ela é aprovada.”Orçamento maior em 2007
Em 2006, o Congresso aprovou um orçamento de R$ 8,1 milhões para o combate ao trabalho escravo. Metade desse valor destinou-se à fiscalização, e o restante foi gasto principalmente em pagamento de seguro-desemprego para os libertados, além da implantação de Varas do Trabalho Itinerantes, para atingir locais de forte incidência do problema.Em 2007, a proposta de orçamento enviada pelo Executivo ao Congresso prevê um aumento de gastos de cerca de R$ 3 milhões. Se a proposta for aprovada, a fiscalização terá no ano que vem R$ 5 milhões para combater a escravidão.Pacto contra escravidão
Na área de prevenção ao trabalho escravo, o Instituto Ethos comemora os resultados de 2006. A instituição coordena, junto com a Organização Internacional do Trabalho (OIT), o Pacto Nacional pela Erradicação do Trabalho Escravo. Por esse documento, empresas se comprometem a manter suas cadeias produtivas longe do trabalho escravo.
Segundo o coordenador do Núcleo de Planejamento de Projetos do Ethos, Maurício Mirra, empresas importantes assinaram o pacto neste ano, como as gigantes da soja Cargill e Bunge. Até agora, cercar de 100 empresas e associações já ratificaram o documento.Apesar do sucesso, Mirra lamenta que questões como o trabalho escravo não tenham ganhado mais espaço nas discussões brasileiras. “Nas áreas do trabalho escravo, meio ambiente e práticas sustentáveis o debate foi extremamente pobre.” No início de dezembro, o Instituto Ethos lançou o “Manifesto pelo Desenvolvimento Sustentável“. No documento, a instituição afirma que o mundo está tomando consciência da necessidade de um desenvolvimento responsável em relação às pessoas e ao meio ambiente, mas o Brasil ainda não acordou para essa realidade.Reforço para o próximo ano
Para o subprocurador-geral do Ministério Público do Trabalho (MPT) e coordenador nacional para o combate ao trabalho escravo da instituição, Luís Antônio Camargo, 2006 foi um ano difícil. Processos importantes na área movidos pelo MPT, como as ações contra o senador João Ribeiro e o deputado Inocêncio de Oliveira, foram julgados em segunda instância e os juízes diminuíram o valor da pena para os réus.
No balanço geral, Camargo faz uma avaliação positiva do ano. “Em termos de orçamento, por exemplo, melhoramos muito”. Em 2006, o MPT contratou 60 novos procuradores e instalou ofícios em regiões com alto índice de trabalho escravo, como Marabá (PA), Imperatriz (MA), Barreiras (BA), Sinop (MT), Alta Floresta (MT) e São Félix do Araguaia (MT). “Houve um avanço significativo”, conclui. 

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