Considerados os últimos 11 anos de operações do Ministério do Trabalho e Emprego (MTE), Mato Grosso ocupa a 2ª colocação. Fiscais encontram gente doente, descalça, desnutrida, e até morta
Josi Costa
Da Redação
Em Mato Grosso, de janeiro até hoje, foram libertados 366 trabalhadores em situação de escravidão. O Estado está em 4º lugar no ranking de trabalhadores libertados, perdendo apenas para o Pará (756), Bahia (523), e Tocantins (453). No entanto, se forem considerados os últimos 11 anos de operações do Ministério do Trabalho e Emprego (MTE) nesse sentido, Mato Grosso sobe para a 2ª colocação. No país, só este ano, 121 fazendas agregaram valor às terras com o suor de trabalhadores escravos, desnutridos e até doentes pelas condições subumanas às quais eram submetidos.
De janeiro a outubro, mais de 2.450 trabalhadores foram flagrados em regime de escravidão e libertados por fiscais do MTE, em 13 estados. Os dados são da Secretaria de Inspeção do Trabalho (SIT) e Divisão de Fiscalização para Erradicação do trabalho escravo (Detrae).
Segundo o presidente da Associação Mato-grossense de Auditores Fiscais do Trabalho (Amaft), Valdinei Arruda, 36, esses homens deixam suas cidades, por falta de oportunidades de trabalho, e se submetem a fazer trabalhos braçais, como derrubadas e retirada de pasto, a salários aviltantes. Além de discriminados pelos empregados fixos das fazendas, os "escravos" perdem a liberdade pelo isolamento nas fazendas e a dificuldade de locomoção até cidades mais próximas. "São como ciganos ", analisa, ao se referir à vida itinerante dos libertados.
Desumano – Além do desrespeito às garantias trabalhistas, os fiscais se deparam também com situações de endividamento, já que os salários e as despesas empatam no final do mês. "Tudo que ajuda a agregar valor à terra deve ser considerado insumo, até mesmo a alimentação dos trabalhadores" enfatiza Arruda. Segundo o fiscal, os produtores resistem em reconhecer que mantêm pessoal em regime escravo e atribuem o crime aos "gatos".
O cenário que os fiscais encontram nessas operações afrontam a dignidade humana. "Encontramos gente doente, descalça, desnutrida, com baixa imunidade e as mãos todas calejadas. Já encontramos até gente com lesões de espancamento e morta", relata. A maior operação de libertação brasileira de escravos, depois da Lei Áurea, foi em junho do ano passado, na fazenda Gameleira, de Eduardo de Queiroz Monteiro, em Confresa (MT), quando os fiscais libertaram 1.003 trabalhadores.
O Código Penal prevê prisão de dois a oito anos, entre outras penalidades, pelo desrespeito às obrigações trabalhistas. Apesar das atrocidades, nenhum proprietário está preso. É mais comum a prisão dos "gatos" porque usam armas ilegalmente. As fazendas que mantêm trabalho escravo entram para a "lista suja" que impede a utilização de recursos para financiamento. Os acusados estão sob investigação do Ministério Público Federal (MPF).
"Ainda há quem encara tudo que está dentro da empresa como propriedade dele, inclusive as pessoas", lamenta Arruda.