Requião defende em Brasília veto presidencial à emenda 3

 11/04/2007

O governador Roberto Requião está conversando com deputados e senadores do PMDB, em Brasília, para defender a manutenção do veto do presidente Luiz Inácio Lula da Silva à emenda três da lei que cria a Super Receita. O veto presidencial deverá ser votado nos próximos dias em sessão do Congresso Nacional. Se for mantida, a emenda três vai retirar dos auditores do Trabalho a autonomia para autuar empresas que mantêm trabalhadores em situação irregular – que varia de pessoas jurídicas que encobrem relações trabalhistas a regimes de escravidão.

A mobilização a favor do veto da emenda três cresceu nos últimos dias em todo o País. Na terça-feira (10), 30 mil metalúrgicos pararam durante uma hora em cada turno de trabalho na Região Metropolitana de Curitiba em defesa do veto do presidente Lula. Na Boca Maldita, centro da Curitiba, uma manifestação reuniu bancários, auditores, metalúrgicos e representantes de centrais sindicais.

"A ação dos auditores fiscais do Trabalho formalizou a situação de 300 mil trabalhadores em 2006 em todo o País – 30 mil deles no Paraná. Se a emenda três estivesse em vigor, essas 30 mil pessoas continuariam em situação informal, à espera de uma decisão da Justiça do Trabalho, que pode demorar dez, quinze anos. E o mais grave é que parte delas vivia em regime de escravidão," disse nesta quarta-feira (11) o presidente da Social Democracia Sindical, Paulo Rossi. Ele e o delegado regional do Trabalho, Geraldo Seratiuk, e o diretor da Central Única dos Trabalhadores (CUT) e do Sindicato dos Bancários, Márcio Kieller, debateram a emenda três em programa da Rádio Paraná Educativa 630 AM.

Trabalho escravo – Seratiuk explicou que, em 2006, a Delegacia Regional do Trabalho atendeu a dois casos de trabalho escravo no Paraná – numa área de cultivo de madeira em Rio Branco do Sul e numa plantação de cana-de-açúcar na região de Guarapuava. "De Rio Branco do Sul, os trabalhadores fugiram até Colombo para denunciar a situação. A ação dos auditores e do Ministério Público do Trabalho permitiu que essas pessoas recebessem salários, verbas rescisórias e direitos trabalhistas. A fazenda de cana também foi multada. Com a emenda três, poderíamos apenas oferecer uma denúncia, que poderia levar anos até render uma decisão judicial", argumentou o delegado do Trabalho.

O debate derrubou um dos principais argumentos dos defensores da emenda três – a liberdade contratual plena. A Constituição Federal de 1988 impõe a função social do trabalho, e o novo Código Civil Brasileiro não advoga a liberdade contratual plena, mas determina que ela será exercida em razão e nos limites da função social do contrato. "A emenda três é um retrocesso jurídico", disse Seratiuk.

FGTS em risco – Em lugar da emenda três, o Palácio do Planalto propõe a edição de uma medida provisória para regulamentar o trabalho autônomo e quais funções poderiam ser exercidas dessa forma. "Sem uma legislação sobre isso, e com a aprovação da emenda três, poderemos ter o fim de milhares empregos formais, que seriam repostos por trabalhadores autônomos, sem cobertura previdenciária, sem os direitos trabalhistas, sem contribuições ao Fundo de Garantia por Tempo de Serviço (FGTS). Seria um problema social sem dimensão", disse Kieller.

Isso significa dizer, segundo os debatedores, que a manutenção da emenda três colocaria em risco o FGTS, fundo que empresta dinheiro dos trabalhadores para obras de saneamento básico, moradia e programas de microcrédito. "Esse patrimônio é uma mola propulsora do desenvolvimento. E, sem a contribuição previdenciária, trabalhadores e suas famílias ficarão sem proteção social, e poderão ser os mendigos, os indigentes, os criminosos do futuro quando não tiverem mais trabalho", afirmou Seratiuk.

O delegado do Trabalho lembrou os casos de China e Índia, apontados como modelos de crescimento econômico a serem seguidos pelo Brasil. "Quem vê exemplos nesses países se esquece de perguntar como são as condições de vida dos trabalhadores chineses e indianos. Eles não têm água tratada, saneamento básico, previdência social. No Brasil, o que temos, deve-se em grande parte ao dinheiro do FGTS", explicou.

Entenda o que é a emenda três
Desde a aprovação da lei complementar 104, em 2001, os auditores do Trabalho podem dissolver contratos que considerem ser artifícios para driblar o pagamento de tributos. O alvo principal são os contratos de prestação de serviço entre pessoas jurídicas. A emenda três à lei que criou a Super Receita pretender acabar com essa atribuição, ao determinar que os auditores não podem determinar se há relação trabalhista em contratos entre pessoas jurídicas.

Os contratos de prestação de serviço entre pessoas jurídicas são usados por cada vez mais empresas. Em vez de contratar um empregado pelo modelo tradicional, com carteira de trabalho assinada, o empregador pede ao trabalhador para abrir uma empresa e tornar-se pessoa jurídica. Dessa forma, o empregador deixa de pagar encargos trabalhistas e FGTS, por exemplo. O trabalhador, por outro lado, perde direitos como férias remuneradas, 13.º salário e licença-maternidade.

O jornal "Folha de S. Paulo" revelou nesta quarta-feira que o presidente Luiz Inácio Lula da Silva está decidido a recorrer ao Supremo Tribunal Federal (STF) caso seu veto à emenda três seja derrubado. Segundo o diário paulista, o presidente tem certeza de que a emenda é inconstitucional e tenta preservar um mecanismo que serve para camuflar relações trabalhistas. A emenda três à Lei da Super Receita foi proposta pelo senador Ney Suassuna (PB), um dos principais envolvidos na Máfia dos Sanguessugas. Candidato em 2006, Suassuna não foi reeleito.

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