TRABALHO – Luta contra a escravidão

 04/06/2007

Márcio Teles, da Redação

O subprocurador geral do Ministério Público do Trabalho (MPT), Luís Antônio Camargo, conversa com O POVO sobre sua ampla experiência no combate às formas ilegais de trabalho. Transporte noturno e oferta de cachaça para deixar o trabalhador bêbado são algumas das estratégias utilizadas pelos empregadores

Existe uma estimativa de quanto ainda há de trabalho escravo no Brasil? A Comissão Nacional de Erradicação do Trabalho Escravo (Conaete), órgão criado dentro da Secretaria Especial dos Direitos Humanos da Presidência da República, presidida, inclusive, pelo Ministro Chefe da Secretaria, está hoje (dia 30 de maio) reunida em Brasília e um dos pontos é discutir uma metodologia para identificar a quantidade de trabalhadores mantidos em condições análogas às de escravos no Brasil. Significa dizer que não temos números confiáveis. Porque se tivéssemos não precisaríamos discutir uma metodologia para chegar a esses números. O que temos são números aproximados. A comissão pastoral da terra trabalha, já há algum tempo, com um número de 25 mil trabalhadores. Quer dizer, a pastoral da terra estima que existam 25 mil trabalhadores mantidos em condições análogas às de escravos no Brasil. Esse número não é científico. A comissão pastoral da terra não adotou métodos científicos para adotar esse número. Mas simplesmente conjecturas. São informações daqui e dali que chegavam à ela. Eles estimam esse número. Os números confiáveis e com os quais trabalhamos são os de resgate. São mais de 20 mil trabalhadores resgatados nos últimos dez anos.

O POVO – Essas condições análogas às de escravidão são, necessariamente, aquelas em que as pessoas ficam em cárcere privado?
Luís Antônio Camargo – Esse termo "manter alguém em condições análogas às de escravo" é por conta do dispositivo da tipificação do artigo 149 do Código Penal, que considera crime manter alguém em condições análogas às de escravo. Essa é a forma técnica de se referir a esse fenômeno. As pessoas falam "trabalho escravo", mas não é a expressão correta porque o trabalho escravo está proibido desde a época do Brasil Império. Não poderíamos ter na Legislação o crime de trabalho escravo, então o crime é de condição análoga. Então, o que é esse chamado trabalho escravo contemporâneo? Parto de um dispositivo da Lei. Lá no caput do artigo 149 do Código Penal você vai encontrar: manter alguém em condição análoga às de escravo, seja manter em trabalho forçado, seja em condição degradante, seja em jornada exaustiva, seja dificultando a locomoção do trabalhador por meio de dívida. Você teria aí, a princípio, quatro tipos: trabalho forçado, a condição degradante, a jornada exaustiva e a servidão por dívida. Mas esses quatro tipos acabam se fundindo em apenas dois: o trabalho forçado e a condição degradante. Trabalho forçado é aquela situação em que a pessoa não pode sair do local em que está prestando serviço. Por que não pode sair? Por vários motivos, coação, violência, ameaça e dívida, que é a forma mais comum de ser encontrada. A outra situação é a degradante abandonado à própria sorte, no meio do mato. Fincam quatro pedaços de paus, põem uma lona preta em cima e colocam o trabalhador lá. Quando ele dá sorte de ter um córrego perto, é daquele córrego que ele pega a água para beber, para lavar roupa, para cozinhar, para tomar banho, é ali que ele faz cocô, faz xixi. É naquele mesmo córrego que o gado bebe água, faz cocô, faz xixi. É a mesma água. O mesmo mato. Podendo ser atacado por uma cobra ou outro animal. E sem equipamento de proteção individual, sem controle de jornada. São condições completamente degradantes. Esses dois tipos, no meu ponto de vista, é que identificam o trabalho escravo contemporâneo. Se você encontrar o trabalho forçado ou a situação degradante ou as duas situações juntas, incide na norma do artigo 149 do código penal. É crime e deve ser punido na forma da Lei.

O POVO – Onde o trabalhador é aliciado e para onde ele é levado para a exploração de mão-de-obra escrava?
Camargo – Em linhas gerais, são os trabalhadores nordestinos. Não só do Ceará, mas Piauí, Maranhão, que são os três estados, talvez aí, com a maior concentração de trabalhadores que são aliciados e levados à exploração pelos gatos (aliciadores) e pelos empregadores. Normalmente são levados para Pará, Mato Grosso e Tocantins. São os estados onde mais encontramos a maior incidência de trabalhadores nordestinos. Às vezes, o aliciamento se dá dentro do próprio Nordeste com o trabalho sendo prestado na Bahia, como já encontramos em algumas situações.

O POVO – Qual o perfil do trabalhador que é mais aliciado no Brasil?
Camargo – É o trabalhador sem esperança. O trabalhador analfabeto, sem qualificação profissional porque o Brasil não se preocupa com isso. Se você desse ao trabalhador qualificação, você não precisaria combater o trabalho escravo. Porque o trabalhador que tem formação, informação, que é culto, organizado não se deixa levar pelo canto da sereia. Na hora que o "gato" chega com aquelas propostas mirabolantes, com aquelas mentiras que tipifica o crime de aliciamento, o trabalhador não vai. Ele percebe que aquilo é um engano. Ele já recebeu a informação. E mais, ele tem qualificação profissional. Então, é preciso que haja nessas regiões em que há incidência de aliciamento políticas de emprego e renda e de qualificação profissional.

O POVO – Há uma situação, que eu não sei se há em todo o Brasil, mas aqui no Nordeste há, que é aquela família que adota uma criança carente e diz "é quase da família", mas ela acaba fazendo o trabalho de casa e nunca é remunerada. Essa prática também é considerada crime?
Camargo –
A OIT (Organização Internacional do Trabalho) classifica algumas dessas situações como trabalho forçado infantil em residência de terceiros. Isso acontece muito. "Ah, eu trouxe uma menina do Interior, levei para casa e ela é quase da família". Esse "quase da família" é desumana, hipócrita e mascara a exploração, às vezes,
de uma criança. Não é só de adolescente, não. Às vezes de crianças. Você encontra situações de crianças de 12 anos que têm jornadas de mais de 12 horas de trabalho por dia cuidando de outras crianças, fazendo tarefas domésticas e sem remuneração. "Ah não, mas eu sou muito bonzinho. Eu dou casa, eu dou comida, eu dou roupa velha", entendeu? Isso é uma situação de absoluto absurdo. Agora, extremamente difícil de ser combatida porque ocorre nas residências. E você não pode ingressar na residência de um cidadão para fiscalizar. Ainda que você receba uma denúncia. Você tem de ter uma situação muito bem provada para pedir para um juiz uma autorização judicial para ir à residência. Então, essas dificuldades de enfrentamento contribuem para o aumento dessas situações criminosas de absoluta exploração de crianças e adolescente.

O POVO – Qual seria a pena para esse tipo de crime?
Camargo – Você precisa observar cada situação. Varia muito a pena. Você pode ter aí cárcere privado e outras coisas. E aí são penas distintas. Tem de observar caso a caso para identificar em qual crime a pessoa está incidindo.

O POVO – E, normalmente, como se dá o aliciamento desse trabalhador? Como ele chega a essa situação?
Camargo –
O trabalhador, quando é aliciado, que isso é outro crime, está no artigo 207 do código penal, ele é pego em um determinado município e levado para outro. Só isso não é crime. Mas quando você vai, por exemplo, ao município de Picos, no Piauí, e propõe que ele vá trabalhar no município de Marabá, no Pará, você não pode fazer falsas promessas. Você não pode enganar o trabalhador. Se você fizer isso, é fraude. Então é crime, pelo artigo 207 do código penal. Você é jornalista em Fortaleza. Digamos que eu fosse proprietário de um jornal em São Paulo e dissesse: vamos comigo trabalhar em São Paulo. Qual é o problema? Nenhum. Isso não é aliciamento. Mas se essa proposta vem fraudada, manipulada e quando você chega ao local não encontra nada do que foi prometido e cria-se uma dívida que não é verdade e que é impagável porque ela só aumenta, isso faz com que o trabalhador seja mantido naquele local de prestação de serviço independente ou alheio à vontade dele. Se ele quiser sair, ele não pode. Não pode, em determinados momentos porque há violência, há ameaça. Não pode porque há coação, não pode porque ele não sabe onde está prestando serviço. Ele é levado à noite por estradas vicinais, então ele não sabe voltar. Dão cachaça pra ele e ele fica bêbado e não sabe onde está. Ele não consegue sair. E tem a questão da dívida. O trabalhador chega e são cobrados do trabalhador todos os custos da viagem. Vai para o caderninho. Alimentação que é fornecida. O par de botas furadas que é vendida ao trabalhador quando deveria ser dado de graça para que ele prestasse serviço, assim como a lima para ele amolar o facão, todos os instrumentos de trabalho que são de obrigação do empregador fornecer são cobrados do trabalhador. Isso vai para o caderninho. Aquilo ali vai sendo anotado como dívida do trabalhador e ele não consegue pagar porque ele não ganha o suficiente para isso. E a cada mês são fornecidos alimentos com preços superfaturados, o que faz que a dívida dele só aumente. Isso identifica o trabalho forçado. Ele não tem liberdade de contratação. Você, que é jornalista, amanhã pode pedir demissão e procurar outro lugar para trabalhar. Quem vai lhe impedir? Ninguém vai lhe segurar. Vai que você recebe uma proposta melhor. Esse trabalhador não. Ele tem uma dívida. Ele é honesto. Ele acredita que aquela dívida é verdade. Ele quer pagar aquela dívida. Não vai pagar nunca. Ele não quer voltar para casa derrotado, cabisbaixo porque saiu do seu município, deixou a família para ganhar o sustento daquela família que ele deixou. E ele vai voltar derrotado, sem um centavo no bolso? Não volta. Então ele fica lá na expectativa vã de pagar a dívida e retornar de forma até mesmo orgulhosa de ter saído para ganhar o sustento da família e ter conseguido. Isso é o trabalho forçado.

O POVO – Quais os setores em que mais se encontra o trabalho escravo?
Camargo –
O maior número de denúncias vem do meio rural. Principalmente da pecuária por causa da expansão da fronteira. Você tem de queimar mata, fazer pasto, tem de desmatar. O crime ambiental está diretamente ligado à exploração de mão-de-obra escrava. Sempre tem o crime ambiental e o crime previdenciário. Na agricultura é soja e algodão, principalmente. Agora, nós temos tido denúncia no meio urbano. A de maior repercussão foi de trabalhadores bolivianos nas confecções da cidade de São Paulo. Mas são casos isolados.

O POVO – Como está a situação do Ceará no que diz respeito à exploração da mão-de-obra escrava? Não só o aliciamento.
Camargo –
Nós temos recebido algumas denúncias. No último ano já tivemos três ou quatro denúncias e eu vejo aqui uma articulação bem organizada de fiscais do trabalho e da Delegacia Regional do Trabalho. Houve flagrante em Sobral e Ubajara de condições análogas de escravo limpando terreno. E houve flagrante de condições degradantes em Beberibe, em uma fazenda de plantação de cana-de-açúcar.

O POVO – Qual a pena para esse trabalho escravo? Existe uma proposta de desapropriar o terreno onde é identificado o trabalho escravo. Como está essa proposta?
Camargo –
A pena é de dois anos a oito anos de detenção. Se você falar sobre desapropriação, é possível. O que significa desapropriar a terra ao que não cumpre sua função social e que mantém trabalhador em regime de escravidão? Significa tomar a terra do proprietário e pagar uma indenização. Nós não queremos isso. Nós queremos tomar a terra sem que o proprietário tenha direito à indenização porque aí sim você estabelece uma punição. Se ele usa a terra para explorar trabalhador, ela não está cumprindo sua função social prevista na Constituição Federal. Ele deve perder a terra sem direito a um centavo de indenização. É isso que nós queremos e essa proposta está tramitando no Congresso Nacional. Atualmente, na Câmara dos Deputados aguardando votação em segundo turno. Nós queremos que essa PEC (Proposta de Emenda Constitucional) 438 de 2001 seja votada em segundo turno na Câmara para de
pois vá para Senado ser apreciada para que nós tenhamos mais um instrumento de combate à exploração do trabalho escravo no Brasil.

O POVO – O senhor acha que com essa segunda gestão do presidente Lula, que é ligado aos trabalhadores, seja mais fácil essa aprovação?
Camargo –
Sinceramente não. Porque essa proposta foi aprovada no Senado, é uma proposta originária do senador Ademir Andrade, do PSB do Pará, tramitou na Câmara, poderia ter sido aprovada sem modificações, mas a bancada ruralista em 2004 foi muito mais interessada, competente, eficiente, articulada do que a bancada de apoio ao governo e propôs as modificações e conseguiu fazer essas modificações, de sorte que quando essa PEC foi aprovada em primeiro turno ela foi profundamente alterada. Se for votada em segundo, ela retorna para o Senado. Ou seja, uma derrota porque ela já foi aprovada no Senado, bastava ser aprovada na Câmara para ser promulgada. A bancada ruralista foi competente e a bancada do governo foi desarticulada, desinteressada e não trabalhou como deveria para aprovar a PEC. Eu não acredito que a proposta seja levada para aprovação em segundo turno nos próximos anos. Eu posso estar colocando uma visão pessimista, mas do meu ponto de vista… É claro que nós vamos continuar lutando para a PEC ser aprovada. Vamos continuar a fazer o lobby do bem, mas do meu ponto do vista nós sofremos uma enorme derrota. Seria diferente se o Governo Federal tivesse interesse em aprovar.

O POVO – O senhor falou de meta institucional que é combater as condições de fraudes na relação de trabalho, incluindo o setor público. Quais são essas fraudes?
Camargo
– No setor público é quando há contratação sem concurso. Isso é uma fraude. Há terceirização, contratação por cooperativa, são situações que a gente não pode admitir no setor público. No setor público deve haver a contratação estritamente na forma prevista na Constituição, ou seja, através de concurso público. Ou em situações excepcionais, na forma do artigo 37 da Constituição Federal. Em caso de absoluta necessidade, em caso de emergência, você pode contratar sem concurso. Mas o poder público está obrigado a fazer concurso público. O Ministério Público do Trabalho é dirigente, não transige com essas situações. Nós temos várias demandas, ações judiciais, que estamos acionando o poder público, seja estadual, federal ou municipal, para que seja feito concurso público.

O POVO – Como a procuradoria pode atuar no combate ao aliciamento internacional?
Camargo –
Nós temos atuado bastante na questão do tráfico de pessoas, que está tipificado no Código Penal Brasileiro, que é quando você identifica tanto a saída quanto a entrada de pessoa para a prestação de serviço. Às vezes, para prostituição. Há situação de entrada de bolivianos no Brasil e que são explorados nas confecções lá em São Paulo. A entrada no Brasil de paraguaios. A fronteira Brasil-Paraguai é uma região propícia para isso porque é uma região de extrema miséria. Muitos paraguaios migram para o Brasil em busca de trabalho. Qual é a grande dificuldade dessa questão? São trabalhadores que estão em situação irregular. São migrantes ilegais, indocumentados (sic). Então essas pessoas, quando você propõe, quando você organiza uma fiscalização e encontra essas pessoas, você não pode, por força da lei, dar a essas pessoas um tratamento de proteção. Essas pessoas terão de ser deportadas. Aí, aquele que está explorando essas pessoas está se beneficiando porque ele não será punida. Então nós estamos buscando novas formas de enfrentamento dessas questões para punir quem traz essas pessoas de fora ou quem se beneficia da chegada dessas pessoas. Também estamos propondo judicialmente a responsabilização dessas pessoas que exploram os imigrantes. Isso ocorre. Vem ocorrendo no Brasil. E isso não ocorre só na prostituição, mas também na prestação de serviço onde você observa. Tráfico de órgãos, tráfico de crianças. E há também estrangeiros que vêm para o Brasil e são explorados. Todas essas situações são enfrentadas dentro do projeto de enfrentamento de tráfico de pessoas.

O POVO – O Ministério Público sabe dizer quantas pessoas são aliciadas no Brasil para o tráfico internacional?
Camargo –
Não. Nós não trabalhamos com esses números, mas há entidades que trabalham com isso.

O POVO – Há represália e como vocês lidam com isso quando os fiscais vão até os locais onde há exploração de mão-de-obra escrava?
Camargo –
Em 2004, em Unaí (MG) houve assassinato de fiscais. Nós temos enfrentado ao longo dos anos algumas situações de conflito. Tem havido enfrentamento. Repito: tem havido algumas situações de conflito. Agora, os conflitos mais graves, especificamente no combate ao trabalho escravo foram quando os auditores fiscais estavam desacompanhados da Polícia Federal, estavam desacompanhados do Ministério Público do Trabalho, enfim, apenas os auditores em operação de rotina. Eles se dirigiram a algumas fazendas de Unaí, fazendas que já haviam sido fiscalizadas antes e aquelas pessoas que estavam sendo fiscalizadas há meses mataram os auditores fiscais. Isso não pode ficar impune porque representa não só uma agressão a agentes do Estado como também ao próprio Estado.

O POVO – O senhor tem identificado diminuição do trabalho escravo no Brasil?
Camargo –
A partir de 1992, quando eu participei da minha primeira operação, hoje estamos em 2007, são 15 anos que eu participo desse enfrentamento, então posso dizer com segurança. No começo nós éramos quase voluntaristas. Era um procurador que convocava um fiscal ou que combinava com o fiscal para fazer uma investigação. Muitas vezes em horário de folga. Hoje não. Hoje temos uma intervenção perfeitamente articulada. Auditor fiscal do trabalho, procurador do trabalho e policial federal, essas três instituições trabalham muito bem articuladas. Essa é a composição do grupo móvel que vai até a fazenda e faz a libertação e obriga o pagamento dos direitos dos trabalhadores. E ainda entram com ação na Justiça do Trabalho. Então, nos últimos anos, especialmente, de 2002 para cá, nós avançamos muito. Nós atingimos valores históricos em relação à libertação de trabalhadores. Somente nas operações até março de 2007 foram quase R$ 29 milhões pagos em indenizações e quase 22 mil trabalhadores libertados de 1995
para cá. Em 12 anos de operações. Isso somente nas operações. Nesses valores não estão incluídas indenizações por danos morais coletivos e individuais. Você verifica que são números crescentes (mostra a planilha). Hoje, há um número menor de denúncias. Em 2004, foram 275 estabelecimentos fiscalizados, em 2005 foram 189 e em 2006, 206. Então significa que os trabalhadores estão conseguindo atingir o poder público, que atua e faz com que outros empresários mudem sua conduta. Disso você não pode ter dúvida. Nos últimos anos nós conseguimos algumas formas de punir. Uma são as indenizações coletivas na Justiça e individuais na operação. Isso é fruto de um trabalho do Ministério Público e da Justiça do Trabalho. Outra coisa é o cadastro dos empregadores, que faz com que os bancos saibam quem está sendo processado, punido por manter trabalhador em condições análogas às de escravo. Então o banco nega o financiamento solicitado. Isso faz com que o fazendeiro não tenha acesso a credito. Aí, meu amigo, quando dói no bolso a situação se complica.

O POVO – Como foi conseguida essa mudança dentro do Ministério Público?
Camargo –
O Ministério Público avançou muito com a Constituição de 1988. O legislador constituinte deu ao MP, de uma forma geral, atribuições de maior relevância. O constituinte transformou o Ministério Público e, em especial, o Ministério Público do Trabalho em um grande escritório de advocacia de defesa da sociedade. Digo "especialmente MP do Trabalho" por conta dessas questões de enorme apelo social. Você permitir que crianças trabalhem é uma situação que não pode deixar ninguém dormir sossegado. Você permitir que trabalhadores prestem serviço em condições absolutamente desumanas, indignas, também são situações com quais você não pode conviver. Então, essas atribuições dadas pelo legislador constituinte de 88 ao Ministério Público deram para nós a oportunidade de agir. O Ministério Público deixou de funcionar em uma situação de mero participante dos julgamentos nos tribunais, se é que se pode dizer assim, em suma, porque não era a única forma de oficiar, mas era a mais visível, e passou a atuar como agente promovendo mudanças. Vou te dar exemplos das metas institucionais da atual administração da doutora Sandra Simon. Nós temos algumas metas, a primeira delas é erradicar o trabalho escravo, a segunda é erradicar o trabalho infantil, a terceira é combater todas as formas de discriminação no emprego e na profissão, a quarta é combater todas as fraudes da relação de trabalho, seja o empregador público ou o privado, outra meta é garantir um meio ambiente de trabalho salubre, seguro, decente para todos os trabalhadores. São metas institucionais que dão um norte para os procuradores. São metas definidas pelos próprios procuradores. Veja que não é a procuradora geral que define as metas, a procuradora faz a proposta e o colégio, democraticamente, elege essas metas. Daí você vê que funcionar dessa forma é uma verdadeira adrenalina. Porque você vê que seu trabalho tem uma resposta imediata.

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