Relator quer aprovar confisco de terras até junho

Meta é aprovar a proposta de emenda constitucional (PEC) 438/2001, que estabelece o confisco de terra onde for constatada a exploração de trabalho escravo, ainda no primeiro semestre deste ano no Plenário da Câmara dos Deputados
Por Maurício Hashizume
 11/03/2004

Brasília – Aprovar a proposta de emenda constitucional (PEC) 438/2001, que estabelece o confisco de terra onde for constatada a exploração de trabalho escravo, ainda no primeiro semestre deste ano no Plenário da Câmara dos Deputados. Esta é a meta que o relator Tarcísio Zimmermann (PT-RS) anunciou, nesta quarta-feira (10), durante a primeira reunião de trabalhos da comissão especial, formada na semana passada, destinada a analisar a proposição, da autoria do ex-senador Ademir Andrade. Se for aprovada sem alterações na Casa, a PEC vai à sanção presidencial.

A julgar pela reunião ordinária inaugural em que os deputados se restringiram apenas a apreciar requerimentos de sugestões para audiências e visitas aos locais de incidência, a tarefa de Zimmermann não será fácil. Ficou claro, nas intervenções dos integrantes da comissão, que existe uma divergência inicial sobre o direcionamento dos trabalhos.

“O papel desta comissão não é fiscalizar nem averiguar a ocorrência do trabalho escravo. Precisamos delimitar claramente o conceito do que é trabalho escravo para confiscar a terra dos que se utilizam dessa ilegalidade, como prevê a PEC. O central é dar uma redação para isso”, observou o deputado Paulo Rocha (PT-PA), autor de outra proposta de emenda constitucional similar apensada à 438/2001. “Não é uma CPI (comissão parlamentar de inquérito)”, concordou o deputado José Carlos Araújo (PFL-BA), outro membro titular da comissão.

E nestes passos iniciais da comissão, as polêmicas devem se concentrar justamente na definição do trabalho escravo. “Nem sempre o que se diz trabalho escravo é, de fato, trabalho escravo. Conheço situações de trabalhadores sem carteira assinada que foram classificadas como trabalho escravo. E existem também as questões culturais, como a dos maranhenses que vêm trabalhar no Pará e dormem em redes”, afirmou o deputado Zequinha Marinho (PSC-PA). “Carne exposta aos insetos é falta de higiene, não é trabalho escravo”, complementou o titular da comissão.

O relator, por seu turno, admitiu que a legislação atual que tipifica o trabalho escravo pode ser considerada “excessivamente abrangente”. “Devemos estar atentos a essas preocupações legítimas, mas nós também devemos fazer com que a comissão cumpra o seu papel que é estabelecer uma punição rigorosa para aqueles que praticam trabalho escravo. Hoje, o que existe é uma penalização excessivamente leve. Quem se utiliza de trabalho escravo é condenado basicamente a cumprir a lei trabalhista.”

“À medida que nós escutarmos aqui as autoridades do país, estudiosos do tema, trabalhadores e empregadores, nós vamos esclarecer que ninguém está falando de trabalho escravo no Brasil por dormir em rede. Trabalho escravo no Brasil infelizmente existe. É uma exceção e se caracteriza por coação, por uso de violência, por privação de liberdade, em suma, por imposição de condições inaceitáveis. Não vamos aqui aceitar o folclore. O folclore faz parte de um processo que procura descaracterizar a gravidade de uma ocorrência”, sacramentou Zimmermann.

Entre os nove requerimentos que foram aprovados, estão convites para a presença na comissão de representantes da Comissão Pastoral da Terra (CPT), da Organização Internacional do Trabalho (OIT) e de integrantes do governo, como os ministros Ricardo Berzoini (Trabalho) e Nilmário Miranda (Direitos Humanos). O presidente do Tribunal Superior do Trabalho (TST), Francisco Fausto (leia também É preciso expropriar fazendas, diz presidente do TST ), deve ser convidado para ser ouvido pelos parlamentares.

O calendário detalhado das audiências da comissão especial da PEC que expropria terras por trabalho escravo deve ser definido na semana que vem pelo relator. O prazo do término dos trabalhos da comissão divulgado pelo relator termina em 15 de abril. Serão 40 sessões, passíveis de prorrogação.

CNA apresenta programa de regularização de trabalhadores

A Confederação Nacional da Agricultura e Pecuária (CNA) apresentou oficialmente ao ministro Berzoini, também nesta quarta-feira (10), o programa Fazenda Legal, que tem como objetivo incentivar a regularização de trabalhadores rurais, a ser realizado do Acre até o Piauí, exatamente na região de maior incidência do trabalho escravo no Brasil.

“Essa questão do trabalho escravo é apenas um detalhe dentro do programa. O que nós buscamos com essa iniciativa é fortalecer os direitos e deveres de ambas as partes [produtores e trabalhadores]”, explicou Rodolfo Tavares, presidente da Federação da Agricultura do Estado do Rio de Janeiro (Faerj) e da comissão nacional de relações de trabalho da CNA.

Segundo ele, o que impulsionou a confederação a lançar o Fazenda Legal foi a perspectiva do potencial de expansão da área de produção em toda a região em foco. “ É fundamental que o sindicato patronal incentive as relações de profissionalização nas áreas de fronteira agrícola”, disse Tavares. Para ele – que busca parceria não só do governo federal, mas da Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura (Contag) -, existem “interesses internacionais que querem transformar 0,01% dos casos em regra”. Esses mesmos “interesses” estariam de olho em possíveis barreiras comerciais impostas aos produtos agrícolas brasileiros. “É uma tentativa de expor um setor como escravagista.”

De todo modo, a CNA deve realizar 20 eventos de divulgação do Fazenda Legal. O primeiro deles já está marcado para Redenção, no Pará, e deve ocorrer na primeira quinzena de abril. “Estimamos envolver em torno de 200 mil produtores.”

Da Agência Carta Maior

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