Trabalho escravo: Família paraense pagará maior indenização da história

A 2ª Vara da Justiça do Trabalho de Marabá determinou que a empresa Jorge Mutran Exportação e Importação Ltda., autuada mais de uma vez por trabalho escravo em sua fazenda, terá que pagar R$ 1.350.440,00 por dano moral coletivo ao Fundo de Amparo ao Trabalhador
Por Leonardo Sakamoto
 30/07/2004

A empresa Jorge Mutran Exportação e Importação Ltda., autuada mais de uma vez por trabalho escravo em sua fazenda Cabaceiras, em Marabá, sul do Pará, terá que pagar R$ 1.350.440,00 por dano moral coletivo ao Fundo de Amparo ao Trabalhador. Essa é a maior indenização já paga no Brasil por um caso de redução de pessoas à condição análoga a de escravo.

A decisão ganha importância pelo fato da família Mutran, uma das mais ricas do Pará e detentoras de várias propriedades de terra, exercer influência sobre os demais fazendeiros desse estado que é campeão em libertações de escravos. A sentença, expedida por Jorge Vieira, da 2ª Vara da Justiça do Trabalho de Marabá, é o final de uma ação civil pública movida pelo Ministério Público do Trabalho. Os réus aceitaram as determinações do MPT e o juiz homologou a sentença. A ela não sabe recurso. A reportagem apurou que, caso não tivesse sido feito um acordo, em caso de condenação o valor da sentença poderia ser maior.

A família Mutran possui três fazendas nas duas “listas sujas” do trabalho escravo, divulgadas pelo governo federal em novembro de 2003 e julho de 2004. A Cabaceiras foi autuada duas vezes: em agosto de 2002, 22 pessoas ganharam a liberdade e, em fevereiro deste ano, outros 13. Em agosto de 2002, 25 pessoas foram libertadas da fazenda Mutamba, de Aziz Mutran, em Marabá. Por fim, em dezembro de 2001, mais 54 na Peruano

Os responsáveis pela empresa citados no processo da Cabaceiras são os irmãos Evandro (dono também da fazenda Peruano), Délio e Celso Mutran e Helena Mutran. Além de pagarem a quantia estipulada pela Justiça, comprometeram-se em adequar às normas trabalhistas (construir alojamentos com saneamento básico, garantir alimentação adequada, contratar legalmente todos os trabalhadores que estiverem a seu serviço, entre outros) e não utilizar mais intermediários que aliciam trabalhadores, como os já conhecidos “gatos”.

O descumprimento da sentença acarretará em uma multa de R$ 5mil por trabalhador encontrado em situação irregular e R$ 10 mil se forem ignoradas as outras obrigações. Os bens dos citados foram indisponibilizados pela Justiça. Se pagarem a indenização – o que está previsto para começar em 27 de agosto – eles serão desbloqueados. O não pagamento acarretará em aumento do valor, que passará a R$ 3.858.400,00.

De acordo com Jorge Vieira, que há três anos julga casos de escravidão nessa região de fronteira agrícola amazônica, a pressão econômica sobre os produtores está surtindo efeito no combate a esse crime. “É importante ressaltar a inviabilização econômica do empreendimento que usa trabalho escravo. A Jorge Mutran Ltda. não teria nenhum problema caso tivesse um comportamento correto.” Vieira afirma que o lucro fácil de quem usa trabalho escravo está se transformando em prejuízo – o que força uma mudança de comportamento entre os produtores.

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