A senadora Marinor Brito (PSOL-PA) afirmou nesta quarta-feira (22) que tem muito orgulho de ser paraense, mas que essa condição não a impede de dizer em "alto e bom som" que seu estado é campeão em trabalho escravo e em mortes violentas no campo. A declaração foi feita em audiência que debateu a violência no campo, promovida pela Comissão de Direitos Humanos e Legislação Participativa (CDH).
– Prefiro assumir essa realidade e abrir a boca para dizer que isso precisa mudar, que o estado não pode continuar sendo associado ao massacre de Eldorado dos Carajás – disse a senadora, fazendo alusão ao episódio na localidade do estado que resultou no assassinato de 19 sem-terras há 15 anos.
De acordo com o procurador da República José Eleares Marques Teixeira, o Pará registrou 219 assassinatos no campo nos últimos dez anos, mas apenas quatro condenações. Em pelo menos 37 casos, nem sequer foram abertos inquéritos. Pelos dados, a segunda posição ficou com Rondônia, com 71 mortes e apenas seis condenações.
A manifestação de Marinor Brito ocorreu após depoimento do diretor do Departamento de Polícia do Interior da Secretaria de Segurança do Pará, delegado Silvio Cezar Maués Batista. Ele destacou o empenho do estado no enfrentamento à violência no campo, mas salientou preocupação com o risco de o Pará ficar estigmatizado por questão que, no seu entendimento, exige respostas abrangentes e que vão além das forças dos governos locais.
Numa avaliação geral, Marinor Brito considerou um "fracasso" as políticas federais de reforma agrária nas duas últimas décadas, apoiadas nos mesmos pilares: um modelo de desenvolvimento que excluiu o direito à terra e não protege os que são ameaçados, inclusive povos tradicionais da região amazônica. Seu colega João Pedro (PT-AM) sugeriu a designação de comitiva da CDH para visitar o Tribunal de Justiça do Estado. O objetivo seria pedir celeridade no julgamento de criminosos e mandantes de mortes no campo.
– Não podemos nos calar frente às ameaças e aos assassinatos. É uma afronta aos movimentos sociais, à sociedade brasileira e própria vida – apelou João Pedro.
Cristovam Buarque (PDT-DF) lamentou que o governo, por meio da titular da Secretaria Nacional dos Direitos Humanos, a ministra Maria do Rosário, para ele uma "figura formidável", tenha dito ser incapaz de proteger todos os trabalhadores do campo incluídos em listas de morte.
– Não é possível um número tão grande de pessoas que usam armas e ainda assim não consigamos proteger essas pessoas – observou, depois de citar a existências das polícias militares e civis dos estados e os corpos das Forças Armadas.
Ataídes de Oliveira (PSDB-TO) lembrou que viveu no Pará em parte da sua infância e ali aprendeu que ameaça de morte era sempre cumprida. Se nada mudou, conforme o senador, a resposta é a permanência da impunidade. Para Inácio Arruda (PCdoB-CE), o problema se explica pelo "conluio" entre latifundiários, capatazes, Polícia e parcelas do Judiciário.
A audiência foi coordenada pelo presidente da CDH, senador Paulo Paim. Ele defendeu que a comissão se manifeste, perante todos os órgãos responsáveis, pela proteção da vida de todos os trabalhadores ameaçados.
Gorette Brandão / Agência Senado