Fermino Fecchio, ex-ouvidor das polícias civil e militar Foto por Marcio Kameoka |
Um comboio de supostos membros do Primeiro Comando da Capital (PCC) foi parado próximo a um pedágio na rodovia Castelinho, em Sorocaba – a 100 quilômetros de São Paulo –, por um bloqueio com mais de cem PMs em 5 de março do ano passado. Após tiroteio, não houve baixas entre os policiais e 12 criminosos morreram. Por incrível que pareça, na época a "Operação Castelinho" serviu para melhorar a imagem da área de segurança pública perante a opinião pública. No centro dos holofotes estava o Grupo de Repressão e Análise dos Delitos de Intolerância (Gradi), fundado em 2000, responsável pela ação.
O grupo teria monitorado a quadrilha, descoberto sua ligação com o PCC e a intenção de assaltar um avião pagador em Sorocaba. Contudo, o aeroporto do município informou que não recebe esse tipo de vôo há muito tempo. Em agosto de 2002, a seção São Paulo da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB-SP) denunciou o Gradi por usar presos condenados para se infiltrar nos grupos criminosos sob investigação – o que é ilegal. A denúncia se estendeu aos juízes Octávio Augusto Machado de Barros Filho e Maurício Lemos Porto Alves, por autorizarem a liberação dos presos, e ao secretário de Segurança Pública de São Paulo, Saulo de Castro Abreu Filho, a quem o grupo responde diretamente.
Segundo a OAB, esses informantes teriam se infiltrado no bando, plantado a notícia do avião, ajudado no planejamento e conduzido o comboio até a Castelinho. "A prova irrefutável que temos é um relatório reservado da própria polícia, em que os PMs contam toda a ação, como se encontravam com os condenados, onde, quantas vezes", afirma João José Sady, vice-presidente da Comissão de Direitos Humanos da entidade. Participantes da operação disseram que os criminosos se entregaram, mas, mesmo assim, foram executados. "A cena do crime não foi preservada, e o laudo oficial não fez as análises de manchas de pólvora nem estudou a trajetória das balas", completa Sady. A Ouvidoria da Polícia, órgão autônomo e independente da Secretaria de Segurança Pública, investigou os antecedentes de 22 policiais envolvidos em quatro operações do Gradi e descobriu que juntos eles respondem por 162 inquéritos policiais por homicídio.
Saulo de Castro disse desconhecer os métodos do grupo. No entanto, Fermino Fecchio, que na época das denúncias era ouvidor da polícia, discorda. "São subordinados diretamente ao gabinete do secretário. O fato de dizer que não sabia o que estavam fazendo revela ou incompetência ou conivência." O secretário de Segurança Pública e o comandante-geral da PM, coronel Alberto Silveira Rodrigues, não quiseram dar entrevistas. O juiz Maurício Lemos, ex-corregedor do Departamento de Inquéritos Policiais, negou envolvimento.
O Tribunal de Justiça de São Paulo decretou que as investigações seguiriam em sigilo, por envolver um secretário de Estado e dois juízes. "A partir do momento em que é decretado segredo de Justiça, ninguém mais se pronuncia sobre o caso. Daí essa impressão de impunidade", analisa Isabel Figueiredo, assessora da ouvidoria.
"As investigações estão em fase final. O inquérito vai examinar se houve armação dos policiais, mas ainda não foi concluído", explica o promotor Carlos Cardoso, assessor de Direitos Humanos da Procuradoria Geral de Justiça. Porém, o Gradi continua existindo, mesmo com todas essas denúncias, lamenta o presidente da Comissão de Direitos Humanos da Assembléia Legislativa de São Paulo, Renato Simões (PT).