A Câmara de Vereadores de Ouro Preto anunciou nesta quinta 23/09 que promoverá, em parceria com a Assembléia Legislativa de Minas Gerais, uma audiência pública para debater e aprofundar as investigações sobre exploração de trabalho infantil nas minas de talco localizadas na região.
Como o problema não se limita à exploração de crianças, já que a mineração é feita de forma clandestina, a Câmara também quer levantar informações sobre a existência de crimes fiscais e ambientais. A audiência será realizada depois do carnaval, em data ainda a ser marcada.
A realização da audiência foi motivada pela denúncia de exploração de mão-de-obra infantil na cadeia produtiva do minério de talco, publicada pela revista do Observatório Social. A empresa Minas Talco explora o trabalho infantil em Ouro Preto e revende o minério processado para as multinacionais Basf, ICI Paints e Faber-Castell. A íntegra da reportagem pode ser lida em www.os.org.br
Serão convidados para participar da audiência representantes das empresas citadas, moradores da localidade, Promotoria e Juizado da Infância e Juventude, Ministério do Desenvolvimento Social, Secretaria de Assistência Social e Cidadania da Prefeitura de Ouro preto, Conselho Tutelar e Delegacia Regional do Trabalho.
Novas investigações
O presidente da Câmara, Wanderley Rossi Kuruzu (PT/MG), disse que muitas perguntas ainda estão em aberto: “O trabalho infantil é a ponta do problema. Empresas de fachada, exploração clandestina, crimes fiscais e ambientais precisam ser investigados”.
O vice-presidente da Assembléia Legislativa de Minas Gerais, deputado Rogério Correia (PT/MG), registrou a audiência pública em requerimento junto à Comissão de Direitos Humanos da Assembléia Legislativa. A assessoria do deputado informou que os resultados da audiência pública poderão determinar a instauração de uma CPI da Mineração, o que aprofundaria as investigações.
A implantação de uma Comissão Parlamentar de Inquérito, segundo o vereador Kuruzu, teria que ultrapassar o lobby do setor de mineração, um dos mais organizados e atuantes do país.
Minas Gerais responde por 35% da produção mineral brasileira. As maiores jazidas são de ferro, ouro, diamante, fosfato, zinco, alumínio, calcário e rochas ornamentais, dentre elas a pedra-sabão ou minério de talco, que em Ouro Preto é extraído pelas empresas Minas Talco e Minas Serpentinito, envolvidas na exploração de trabalho infantil e na mineração clandestina.
Fiscalização precária
Minas Talco e Minas Serpentinito não têm autorização de lavra. Elas são controladas por uma empresa de fachada, WB Mattos Transportes, cujo proprietário é sócio de dois alemães que vivem clandestinamente no país e controlam as jazidas ilegalmente.
Dia 10/02, o superintendente em Minas Gerais do DNPM (Departamento Nacional de Produção Mineral), geólogo Luiz Eduardo Machado de Castro, foi preso pela Polícia Federal, acusado de contrabando de diamantes e conivência com mineração ilegal. Caberia a ele ter fiscalizado as empresas que extraiam o talco clandestinamente.
Repercussão
Após a denúncia, o Ministério de Minas e Energias determinou a paralisação da atividade de mineração e encaminhou o caso à Polícia Federal, já que a atividade envolve empresas de fachada para maquiar o controle da jazida por estrangeiros que não têm autorização para trabalhar no país.
Também foi solicitada a intervenção da PF porque as atividades prosseguem na área da jazida, apesar da determinação de paralisação de lavra. Empresas que não têm autorização para retirar o talco continuam a trabalhar e exportar o produto para a Europa, via porto de Vitória (ES).
O Ministério de Desenvolvimento Social e de Combate à Fome intensificou em toda a região de Ouro Preto o Programa de Erradicação do Trabalho Infantil (Peti). Aumentou de 60 para 280 o número de crianças atendidas, o que deve contemplar todas as famílias na localidade de Mata dos Palmitos, onde a empresa Minas Talco explora a mão-de-obra infantil.
Posição das empresas
A Faber-Castell, tão logo tomou conhecimento do caso no início de dezembro, afirmou que suspenderia a compra da matéria-prima fornecida pela Minas Talco e divulgou uma nota informando estar “estarrecida” com a denúncia. A Faber-Castell também prometeu divulgar em breve uma série de iniciativas no que diz respeito ao controle de sua cadeia produtiva.
A Coral, controlada pela multinacional britânica ICI Paints, a maior fabricante de tintas do mundo, enviou ao Observatório Social uma nota. A empresa informou que interrompeu suas relações comerciais com a Minas Talco. Também anunciou que aguarda providências por parte do Ministério Público.
A Basf não interrompeu a compra do talco. Ainda aguarda informações que solicitou de diversos órgãos, tais como DNPM, Ministério Público do Trabalho, Ministério do Trabalho e Procuradoria Regional do Trabalho de Minas Gerais.
Dia 15, o vice-presidente da Basf para a América do Sul, Fernando Figueiredo, visitou o Observatório Social e foi recebido pelo presidente do Instituto, Kjeld Jakobsen. Figueiredo disse que o talco proveniente da Minas Talco não é usado pelas Tintas Suvinil, uma das empresas do grupo Basf, mas pelo setor de tintas industriais e automotivas.
O destino do talco, tinta para residências ou para automóveis, não altera a essência do problema, ou seja, a compra de matéria-prima de empresa que explora trabalho infantil em jazidas clandestinas.