MMA cede e altera proposta de Imposto de Renda Ecológico

Ministério do Meio Ambiente aceita fórmula de gerenciamento híbrido da verba da proposta do Imposto de Renda (IR) Ecológico que abre brecha para a reprodução de distorção da Lei Rouanet que beneficia empresas com "marketing subsididado"
Maiana Diniz
 29/06/2006

Não é novidade que o meio ambiente brasileiro sempre foi historicamente negligenciado pelo Estado. Ao contrário de áreas como saúde e educação, o Orçamento Geral da União (OGU) não reserva um percentual obrigatório para os programas de meio ambiente. “É fundamental a criação de novos instrumentos que viabilizem o avanço da gestão ambiental no Brasil”, assinala Gerson Teixeira, diretor econômico da Secretaria de Desenvolvimento Sustentável do Ministério do Meio Ambiente (MMA).

Em busca de alternativas para o financiamento, o MMA e a Secretaria da Receita Federal formaram, em junho do ano passado, um grupo de trabalho que elaborou uma proposta de isenção do Imposto de Renda (IR) para quem destinar recursos a projetos de promoção do uso sustentável de recursos naturais e preservação do meio ambiente, com o intuito de incentivar os investimentos na área.

O IR Ecológico – seguindo o modelo da Lei Rouanet para cultura – permite que pessoas físicas e jurídicas deduzam do Imposto de Renda (IR) um percentual relativo aos valores doados para projetos ambientais. “Não se trata de renúncia fiscal, mas de um mecanismo que reverte em prol da sociedade”, garante o secretário-executivo do MMA, Cláudio Langone.

De acordo com proposta elaborada de forma preliminar pelo MMA, o dinheiro arrecadado por meio do IR ecológico seria encaminhado ao Fundo Nacional do Meio Ambiente (FNMA) e a gestão da verba ficaria por conta do Conselho Deliberativo do FNMA, formado por seis membros do governo federal, um representante das secretarias estaduais de meio ambiente e cinco integrantes de ONGs ambientalistas – um de cada região do País. “Dessa maneira seria possível dividir os recursos de forma democrática e transparente, com o controle do ministério, sem beneficiar somente projetos de grandes ONGs [organizações não-governamentais] ou fundações”, analisa o diretor Teixeira. Na proposta do MMA, o desembolso de recursos só seria possível mediante a aprovação prévia do projeto – obrigatoriamente enquadrado nas diretrizes, prioridades e normas do FNMA, instituído pela Lei Federal 7.797/89 – por parte do Conselho Deliberativo do fundo.

A exigência impediria as distorções verificadas na Lei Rouanet em vigor, criticada por permitir que as próprias empresas escolham como vão investir. Elas geralmente escolhem grandes projetos com grande projeção comercial que servem como marketing social, deixando pequenas iniciativas desamparadas (cerca de 70% dos recursos da Lei Rouanet são investidos no Sudeste e a maior parte dessa verba vem de fundações e institutos ligados a grandes empresas).

NEGOCIAÇÕES
Grandes ONGs, fundações e escritórios de lobby e de advocacia ligados à questão tributária – WWF-Brasil, The Nature Conservancy (TNC), Conservação Internacional (CI), SOS Mata Atlântica, Instituto Socioambiental (ISA), Instituto de Pesquisas Ecológicas (IPÊ), Fundação O Boticário, Fundação Biodiversitas, Instituto Bioatlântica, Pinheiro Neto Advogados, Patri e Grupo de Institutos, Fundações e Empresas (Gife), entre eles – não concordam com a proposta do MMA. Na mesma época em que o ministério buscava soluções, um grupo de entidades reuniu-se para analisar projetos de lei no Congresso Nacional que pudessem incorporar a idéia do IR Ecológico.

O grupo quer a aprovação da isenção, mas diverge quanto à necessidade de aprovação dos projetos pelo Conselho Deliberativo do MMA e prefere o modelo de captação direta dos recursos nas empresas doadoras, exatamente como a Lei Rouanet. Em defesa de medidas legislativas que garantam a captação direta, o deputado federal Carlos William (PTC-MG) afirmou que “os instrumentos tradicionais de política ambiental baseados nos chamados mecanismos de comando e controle são ineficientes”. “Entre os instrumentos econômicos de política ambiental, os incentivos fiscais a projetos ambientais tem tido posição de relevo nos países que estão mais avançados nesse campo”, complementa o parlamentar, sublimando os possíveis desvios de finalidade do IR ecológico.

Representantes desse grupo procuraram o Langone para contestar os planos do MMA e o secretário concordou em criar uma emenda que permita que o gerenciamento da verba do IR ecológico ganhe um caráter híbrido, isto é, com parte dos recursos para o Fundo Nacional do Meio Ambiente e outra porção diretamente captada junto às empresas doadoras e administrada por entidades sem fins lucrativos. Para o secretário geral da Gife, Fernando Rossetti, “a experiência internacional mostra que se você tem incentivos, mesmo que pequenos, isso tende a atrair mais recursos", e acredita que o governo, mesmo perdendo receita, terá maior chance de melhorar o meio ambiente brasileiro.

Na visão do presidente do Conselho Diretor do WWF-Brasil, Álvaro de Souza, o IR Ecológico abriria novos canais de financiamento para organizações que encontram dificuldades de recursos para desenvolver ações. Ele usa as áreas de cultura e responsabilidade social para justificar sua posição. “Criar o Imposto de Renda (IR) Ecológico seria uma ação inovadora nas leis de incentivo fiscal no Brasil. Além de dar uma nova dinâmica para as ONGs nacionais comprometidas com o meio ambiente, a lei seria essencial para ampliar ações de conservação da biodiversidade brasileira".

Para Langone, o acordo com não compromete a gestão democrática dos recursos. "Esses instrumentos permitem que a sociedade, empresas e instituições possam ser parceiros na implantação de projetos. É preciso que todas as forças se juntem”. O secretário critica o mito de que entidades sem fins lucrativos administram mal seus recursos e defende melhores condições para que elas possam atuar.

Ele lembra também que o IR Ecológico faz parte de uma série de medidas voltadas para engrossar o financiamento para a área ambiental, da qual fazem parte a criação do Fundo de Compensação Ambiental (que permitiu que empresas obrigadas por lei a compensar o impacto ambiental de um empreendimento podem investir os recursos dessa compensação num fundo, gerido pela Caixa Econômica Federal), do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) Ecológico e ainda destacou a aprovação, no âmbito da Convenção de Mudanças de Clima, de uma deliberação que reconhece a necessidade de remuneração para aqueles que preservam florestas nativas.

A proposta do IR Ecológico tramita no Congresso sob o projeto de lei 5974/05, que tramita na Comissão de Meio Ambiente da Câmara. O Ministério da Fazenda tambpém está estudando a possibilidade de editar uma medida provisória prevendo a isenção, para implementação imediata. Há ainda a possibi
lidade de incluir um substitutivo com os fundamentos do IR Ecológico em algum outro projeto de lei correlato que possa tramitar com maior celeridade no Congresso. A definição da parcela submetida ao Conselho do FNMA e o montante relativo à captação direta das empresas só deve ser estabelecido em legislação posterior de regulamentação da iniciativa.

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