Crianças exploradas

Justiça mineira censura publicação sobre trabalho infantil

Ação movida pelo Ministério Público levou ao recolhimento de revista do Observatório Social que denunciava trabalho de crianças na produção de talco na região de Ouro Preto (MG)
Por Iberê Thenório
 23/08/2006

A Vara da Infância e Juventude de Ouro Preto (MG) expediu liminar exigindo o recolhimento da revista "A Idade da Pedra", lançada pelo Instituto Observatório Social em março de 2006, que exibia a exploração de mão-de-obra infantil em minas de talco no distrito de Mata dos Palmitos, município de Ouro Preto (MG).

O motivo da apreensão são as fotos de crianças trabalhando na mineração do talco. A liminar, assinada pela juíza Lúcia de Fátima Albuquerque Silva, foi recebida no último dia 15, e determina também a retirada das fotos do site do Observatório Social. A ação civil pública foi movida pelo Ministério Público de Minas Gerais. O órgão entendeu que o Instituto feria o artigo 247 do Estatuto da Criança e do Adolescente, que proíbe a veiculação de imagens de pessoas menores de 18 anos cometendo atos infracionais (que infrinjam a lei), em que seja possível identificar as crianças ou adolescentes.

A capa da revista exibia crianças carregando pedras de talco de dez quilos, que seriam processadas e utilizadas por empresas multinacionais para a fabricação de tintas, lápis escolares, cerâmica e cosméticos. De acordo com a reportagem do Instituto, muitas dessas crianças morrem mais cedo, pois não utilizam equipamentos de proteção e são contaminadas pela poeira tóxica que provém da rocha.

Marques Casara, autor da reportagem, argumenta que as imagens foram veiculadas em defesa dessas crianças, e que o intuito da revista era ecoar o problema do trabalho Infantil no Brasil. "As fotos mostravam o rostos das crianças porque acreditamos que as elas não são infratoras, mas trabalhadoras. Publicamos o rosto para que a sociedade olhe nos olhos das crianças."

Mesmo que a reportagem estivesse infringindo o ECA, o recolhimento é uma atitude que caracteriza censura e não se justifica. O adequado seria uma ação contra o autor e o proprietário da publicação – como ocorre quando veículos de comunicação pertencentes a grandes empresas cometem infrações.

No documento enviado ao Observatório, Lúcia Silva afirma que as fotos foram forjadas, e que, quando foram tiradas, as crianças "estavam em casa ou brincando quando foram convidadas para tirarem as fotografias, mediante artifícios".

Casara contesta a afirmação, afirmando que as imagens são reais, e mostram algo que acontece há muitos anos e que, infelizmente, já faz parte da cultura da região: "existe uma tradição histórica das crianças trabalharem lá". Na reportagem, o jornalista afirma que a questão é, inclusive, de conhecimento do estado, pois o distrito de Mata dos Palmitos recebe ajuda do Programa de Erradicação do Trabalho Infantil (PETI).

Contatada, a juíza Lúcia de Fátima Albuquerque Silva não respondeu até o fechamento desta reportagem.

Clique para ler, em PDF, a revista "Idade da Pedra"

Saiba mais:
Multinacionais beneficiam-se da exploração de trabalho infantil

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