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Atualização da "lista suja" traz reincidentes e grandes empresas

Os fazendeiros Joaquim Faria Daflon e Walderez Fernando Barbosa seriam excluídos da relação se não tivessem sido flagrados pelo grupo móvel de fiscalização utilizando novamente mão-de-obra escrava nas mesmas propriedades. Leitbom, Grupo Soares Penido e Agroserra entraram na lista

A reincidência que acompanha a prática do trabalho escravo contemporâneo no Brasil aparece com destaque na atualização da "lista suja" de empregadores flagrados pela utilização criminosa de mão-de-obra escrava, divulgada nesta sexta-feira (14) pelo Ministério do Trabalho e Emprego (MTE).

Ao todo são 189 empregadores relacionados – nesta atualização 13 novos nomes entraram e seis saíram, após dois anos de permanência e a regularização da situação na propriedade.

O fazendeiro Joaquim Faria Daflon – que sofre, juntamente com seu filho, acusação de prática de trabalho escravo pelo Ministério Público Federal (MPF), foi absolvido em decisão de primeira instância pela Justiça do Tocantins, mas ainda terá o caso julgado em segunda instância pela Justiça Federal – constava na "lista suja" em decorrência das fiscalizações ocorridas em duas de suas propriedades em Ananás (TO): Fazenda Castanhal (incluída duas vezes, em junho e em dezembro de 2004 por casos relacionados, respectivamente, a 23 e 72 trabalhadores libertados) e Fazenda Floresta, também adicionada em dezembro de 2004, envolvendo 43 pessoas.

Na relação atualizada, Joaquim Faria Daflon está novamente presente na "lista suja", desta vez pela operação realizada em março do ano passado, na mesma Fazenda Castanhal, que resultou na libertação de 201 trabalhadores. Esta foi a terceira vez que o grupo móvel de fiscalização do governo federal constatou a exploração criminosa na mesma propriedade de Daflon.

Caso semelhante envolve Walderez Fernando Resende Barbosa. O nome dele estava na "lista suja" desde dezembro de 2004 por causa de uma libertação de 15 pessoas ocorrida na Fazenda Boa Esperança, no município de Carmolândia (TO). Na relação atualizada do MTE, Walderez continua presente, mas agora por causa de uma operação que encontrou em 2005 dois trabalhadores em condição análoga à de escravo na Fazenda Jardim, em Arapoema (TO).

Neste mesmo ano de 2005, a Fazenda Santa Maria, em Brejo Grande do Araguaia (PA), também de propriedade de Walderez, foi fiscalizada pelo grupo móvel, que lavrou 30 autos de infração contra o fazendeiro por descumprimento da legislação trabalhista. O procurador do Trabalho José Heraldo de Sousa, da 22º Região (Piauí), protocolou ação civil pública exigindo uma multa de R$ 790 mil por dano moral coletivo contra Walderez no Tribunal Regional do Trabalho (TRT) da 8a Região, em Belém. A ação já foi julgada e acolhida em segunda instância, mas o acusado apresentou um agravo de instrumento no último dia 20 de novembro.

O processo contra Walderez será dado como encerrado se o pedido para julgamento em instância superior for recusado pelo ministro-relator do Tribunal Superior do Trabalho (TST) de Brasília designado para avaliar o caso.

A "lista suja" tem sido um instrumento efetivo de combate à escravidão, uma vez que o próprio ministério tem verificado através de seu monitoramento que há proprietários rurais que se adequam à legislação trabalhista após os danos causados por figurar nessa relação. Mas a insistente reincidência de casos de trabalho escravo em algumas fazendas, envolvendo os mesmos proprietários, traz à baila mais uma vez a importância da aprovação da Proposta de Emenda Constitucional (PEC) 438/2001, que prevê a expropriação da área onde houver exploração do trabalho escravo. Aprovada no Senado, a PEC está parada desde 2004 à espera de apreciação em segundo turno no plenário da Câmara dos Deputados.

Entradas
Corporações economicamente expressivas como a empresa Laticínios Morrinhos Indústria e Comércio (Leitbom), a Agropecuária Roncador S.A, do Grupo Soares Penido – que também é proprietário da empreiteira Serveng Civilsan e da viação Pássaro Marron, entre outros empreendimentos – e a Agropecuária e Industrial Serra Grande Ltda (Agroserra), dona de usinas de álcool e produtora de soja – entraram para a "lista suja".

De acordo com a própria empresa, a Leitbom está "entre os dez maiores do país no segmento de produtos lácteos". Tem quatro unidades industriais em Goiás e uma no Pará, empregando diretamente cerca de mil pessoas. A fiscalização que determinou a entrada da companhia de laticínios na "lista suja" ocorreu em novembro de 2005 no município de Minaçu (GO). Contudo, os 63 trabalhadores libertados, que viviam em situação precária de trabalho, acomodação, higiene e segurança, não atuavam com derivados de lei e sim na extração de eucalipto em área controlada pela Leitbom.

A Fazenda Roncador, propriedade flagrada com exploração de mão-de-obra escrava que pertence à Agropecuária Roncador, está localizada em Querência (MT), na região Nordeste do estado. A propriedade, de 154 mil hectares, foi fiscalizada em agosto de 2004, quando foram libertados 28 trabalhadores. A Roncador produz soja, milho, arroz e mantém 100 mil cabeças de gado nelore. Há um aeroporto na propriedade, que também possui 697 quilômetros de estradas e uma usina hidrelétrica.

A fazenda da usina de álcool Agropecuária e Industrial Serra Grande Ltda (Agroserra) fica em São Raimundo das Mangabeiras (MA). Além da produção de álcool, a fazenda também produz soja. A propriedade foi fiscalizada pelo grupo móvel em 2005, quando um contingente de 652 trabalhadores foi resgatado de condições análogas à de escravo. Eles trabalhavam no corte e plantio da cana sem registro em carteira de trabalho.

O Ministério Público Federal (MPF) apresentou denúncia contra a empresa sob a acusação de submeter os trabalhadores a jornadas de até 14 horas, sem conceder descansos semanais. Do total de 139 mil metros cúbicos de álcool produzido no Maranhão na safra 2005/2006, a empresa respondeu por 83 mil metros cúbicos e atendeu mercados do próprio estado, Pará e Piauí, segundo levantamento do Pólo Nacional de Biocombustíveis da Escola de Agronomia Luiz de Queiroz da Universidade de São Paulo (Esalq/USP).

Outra empresa com participação relevante no mercado que entrou na "lista suja" é a Itamarati Indústria de Compensados, que tem sede na cidade de Palmas (PR). A empresa faz compensados (lâminas de madeira aglomeradas) para exportação e chega a produzir 12 mil m³ de madeira mensalmente. A verificação de trabalho escravo se deu na plantação de pinus que a Itamarati possui no município de Tunas do Paraná (PR), em maio de 2005. A empresa contratou um empreiteiro para intermediar a contratação de 82 trabalhadores, que foram alojados em barracos de pau-a-pique e lona preta, de chão batido, sem água potável e sem local adequado para as refeições.

A inclusão de um empregador na "lista suja" se dá após a conclusão do processo administrativo instalado por conta da fiscalização do grupo móvel, sendo garantido o direito de defesa.

Segundo as regras da portaria nº 540/2004, que regulamenta a "lista suja", o nome do infrator só entra na relação após o final de um processo administrativo gerado pelos autos da equipe de fiscalização do MTE que libertou os trabalhadores, com garantia de direito de defesa ao empregador. A exclusão, por sua vez, depende do monitoramento da fazenda por dois anos. O nome só será retirado da lista se, após esse tempo, não houver reincidência no crime, se todas as multas resultantes da ação de fiscalização forem pagas, se forem garantidas condições dignas de trabalho e se as pendências trabalhistas forem quitadas. A atualização é divulgada semestralmente desde novembro de 2003.

O monitoramento inclui novas fiscalizações ao local onde foram libertados os trabalhadores, além de informações fornecidas por órgãos governamentais e entidades da sociedade civil. Dos empregadores rurais que permaneceram por pelo menos dois anos na lista, seis saíram do cadastro nesta atualização. O restante não quitou as pendências com o Ministério do Trabalho e Emprego ou foi reincidente no crime.

De 1995 até hoje, mais de 26 mil trabalhadores foram resgatados da escravidão pelos grupos móveis de fiscalização do governo federal, integrados pelo Ministério do Trabalho e Emprego, Ministério Público do Trabalho e Polícia Federal, além das equipes de fiscalização rural das Delegacias Regionais do Trabalho.

Saídas
O fenômeno da reincidência também fica claro no exame das exclusões da "lista suja". Dois proprietários – Gilberto Andrade, dono da Fazenda Boa-Fé/Caru, que fica dentro da Reserva Biológica (Rebio) de Gurupi, em Buriticupu (MA), e Jorge Mutran, da Fazenda e Castanhal Cabaceiras, em Marabá (PA) – foram excluídos apenas parcialmente, pois apenas uma das autuações de cada um deles completou dois anos e saíram da relação. Outras fiscalizações nas mesmas propriedades mantêm os nomes de Andrade e Mutran no grupo.

No último dia 30 de novembro, também haviam sido excluídos os seguintes empregadores: Viena Siderúrgica do Maranhão S/A, Laci Martins da Silva, Benivaldo Alves de Azevedo e Eustáquio Soares Maia. Todos tiveram sua situação trabalhista monitorada pela Secretaria de Inspeção de Trabalho (SIT), comprovaram o pagamento de todas as multas referentes aos processos e cumpriram o prazo de dois anos na "lista suja".

Estão fora da relação divulgada nesta quarta-feira empresas que conseguiram liminar na Justiça para tanto.

Empregadores incluídos na última edição da "lista suja"

Antônio Nascimento de Souza
Agropecuária e Industrial Serra Grande Ltda
Agropecuária Roncador S/A
Antônio Fernandes Camilo Filho
Antônio Tadão Shirabe
Calsete Empreendimentos Ltda.
Eunarto Claristino de Resende
Eustáquio Barbosa Silveira
Fazenda Paloma S/A
Itamarati Indústria de Compensados Ltda.
Laminados e Compensados Santa Catarina Ltda.
Laticínios Morrinhos Ind. e Com. Ltda.
Leandro Volter Laurindo de Castilho

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Veja a "lista suja" publicada pelo Ministério do Trabalho e Emprego


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12 Comentários

  1. Hélio Leite Silva

    Muito bom , mas acho que é bom se preocupar também com empregados mal caráter e iniciar também uma lista suja, pois a CLT faculta muitos litigantes de má fé, sendo assim temos que manter os direitos do empregados, mas devemos também punir os de má fé.

  2. alfio

    A quem serve Hélio Leite? Êta comentário infeliz: Quer dizer que a CLT encoberta trabalhador mal caráter? Será que os cães rastreadores, mateiros, feitores e demais asseclas são contratados pela CLT? São gente de bom caráter?
    Ora ora, estão provocando reações extremistas esses senhores donos de senzalas 2007.

  3. Claudio

    Lamentável a postura do congresso nacional que não se decide a votar a PEC 438/2001 que Prevê a expropriação para os reincidentes… O simples pagamento de multas se torna vantagioso para os criminosos empresários praticantes do trabalho escravo. Eles têm que sentir no bolso que trabalho escravo não compensa. Os líderes do governo parecem concordar com a omissão parlamentar em não querer pôr fim a práticas que nos envergonham como cidadãos brasileiros.

  4. rhô lima

    O Sr. Hélio é mais um dos muitos SAUDOSISTAS que tentam resistir…
    A QUEM serve e POR QUAL MOTIVO, o Congresso Nacional não encontrou TEMPO para a votação da 438/2001????

  5. jose  alexandre

    se naõ houver leis duras para os infratores eles continuarão a pratricar o que eles acham certo. O ministerio tem que puni-los severamente essas pessoas que teimam em escravizar os seres humanos. não é possivel viver desse jeito no nosso brasil tão querido. é preciso colocar um popnto final nisso principalmente nos infratores reincidentes que não pensão nas pessoas somente nos lucros facil, com a palavra senhores deputados que façam leis duras para que possam ser usadas contra aqueles que só pensam em escravisar os outros de todas as formas.

  6. Auricélia Costa

    Bem feito, quem manda dar trabalho para esses trabalhadores fantásticos: cultos, produtivos e treinados. Pau neles!

  7. Hermes Batista Soares

    O problema é que no Brasil não se pune quem tem dinheiro, e acaba se esquecendo, talvez por isso o alto nível de reincidencia.Só se combate o trabalho escravo de forma eficaz, com educação das populações mais pobres.

  8. RNGF

    É preciso se ter cautela e extrema prudência na divulgação de informações dessa natureza. Afinal, a questão do trabalho escravo é assunto tormentoso dada à sua importância e necessidade de combate efetivo, gerando grande repercussão na opinião pública. É salutar que o poder público, a par de divulgar a "lista suja", explicite também os meandros do processo de investigação, possibilitando o acesso às investigações pelo cidadão comum.

  9. Elias Lourenço Ferreira

    Infelizmente temos pessoas que se colocam a favor do escravismo e contra os direitos humanos, e o pior, pessoas que foram eleitas para defender aqueles que os outorgaram o direito de representa-los. Será que é por covardia ou por receio de na próxima campanha lhes faltar algo?

  10. Elias Lourenço Ferreira

    A cada mensagem que vejo sobre a atuação do MTE, através do grupo especial de combate ao trabalho escravo, me trás um alento. Pois é tanta crueldade contra os trabalhadores que as vezes acho que não terá fim tanta injustiça. É preciso que o governo dê cada vez mais suporte econômico, físico e humano, objetivando dar condições de trabalho para este grupo. Também se faz necessária medidas que venham tornar mais duras as punições para quem comete este tipo de crime. Crime de escravismo envergonham nosso povo.

  11. Hélio Leite da Silva

    Sirvo a VERDADE. Agora a quem serve o idealizador da lista suja. Ora qdo. falei da CLT não disse que acobertava e sim havia um excesso de protecionismo que destrói o bom empregador, aquele que recohe e cumpre com a lei. Agora dizer que advogados qdo. desonestos se aproveitam do excesso para montar a suas fazendas mandando bons empregadores como bois ao matadouro, ESTA É A VERDADE. SOU A FAVOR DOS DIREITOS DO TRABALHADOR, mas todos temos direitos e deveres e felizmente todos devemos respeitar a CF onde no art. 5o. diz que todos somos iguais perante a lei. Mostre a igualdade nos direitos dentro da JT? É, soclialismo mente.

  12. Marinho

    Todos os comentários possuem valores imensurável, no entanto, “data maxima venha” aqueles que pretendem fazer comentários sem o devido conhecimento de cada caso é um ato suicida, e de extrema falta de caráter. Não estou aqui fazendo defesa de nenhum dos citados, no entanto deixando um alerta para os aproveitadores de oportunidades. O Sr. Valderez F. Barbosa, ja falecido, que descanse em paz, foi vítima de trabalhadores com o perdão da palavra “vagabundos”. Pois no ato da fiscalização eu estava presente e vi o tamanho da falsidade daqueles “trabalhadores” que parecia um bando de abutres, inventava horrores, e todos que chegavam e que dizia ser trabalhador da fazenda, o seu nome já ia imediatamente para a lista de acertos. Você ai que só sabe falar mal dos empregadores, vire um empregador e verás o tamanho da safadeza de certos trabalhadores. Não estou contra a CLT, só temos que colocar na balança as duas partes e ver o peso de cada uma delas. Só assim a justiça estará sendo justa.

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