Conferência Nacional do Trabalho Decente é um avanço importante

 11/05/2011

Em maio de 2012, será realizada em Brasília a 1ª Conferência Nacional do Trabalho Decente e Emprego, um marco importante na discussão de medidas mais efetivas que permitam a erradicação do trabalho escravo, infantil e em condições degradantes no país. Nesta entrevista ao Vermelho, o secretário do Trabalho da Bahia, Nilton Vasconcelos, fala dos avanços deste debate no país e da relevância da Conferência para o sucesso da Agenda do Trabalho Decente.
Nilton Vasconcelos

Vasconcelos é também presidente do Fórum Nacional de Secretarias do Trabalho (Fonset)
Vermelho: Qual a relevância da 1ª Conferência Nacional do Trabalho Decente e Emprego, que acontece em maio de 2012, em Brasília?
Nilton Vasconcelos: Esta é a primeira conferência que o Brasil faz sobre o tema. A Conferência Nacional corresponde a esta evolução que se tem desde o lançamento da Agenda do Trabalho Decente em 2003, mas agora buscando agregar um nível maior de participação. É uma conferência que tem uma característica diferente das outras que se realizam no país, em função de sua composição. Dos delegados que serão eleitos para esta conferência, 30% serão de empregadores, 30% de empregados, 30% de governos e 10% de entidades da sociedade civil. Então ela persegue esta compreensão de que o diálogo social é o caminho para conquistar avanços trabalhistas.

Vermelho: O calendário de mobilização para a Conferência já foi definido?
NV: Sim. Embora a Conferência Nacional do Trabalho Decente e Emprego aconteça apenas em maio de 2012, as conferências municipais começam a ser realizadas em maio de 2011. Em seguida, acontecem as conferências intermunicipais e regionais, até que as conferências estaduais estejam realizadas até o mês de novembro de 2011. É um processo de mobilização importantíssimo. Cada prefeito deve estar estimulado a convocar suas conferências municipais, a partir dos decretos dos governadores que convocaram as suas etapas estaduais. Então é indispensável esta mobilização. A Bahia realiza sua Conferência estadual nos dias 22 e 23 de setembro. As conferências municipais acontecerão em junho. Nós demos um prazo até o final de maio para que os prefeitos convoquem as conferências municipais e caso não o façam até 15 de junho, as comissões municipais de emprego e renda poderão fazê-lo e a partir da quantidade de conferências municipais que ocorram, vamos tentar através de conferências regionais suprir algumas regiões que não tenham debates deste tipo.

Vermelho: Qual é mesmo o conceito de trabalho decente?
NV: O conceito de trabalho decente foi desenvolvido pela Organização Internacional do Trabalho (OIT) ainda nos anos 1990, no contexto de crise mundial do emprego, com um número exorbitante de taxa de desemprego, em todos os países, especialmente nos países centrais. A ideia de trabalho decente é um trabalho realizado em condições adequadas de saúde, segurança, liberdade e com remuneração digna. É um conceito bastante abrangente, que permite ser adaptado à realidade de cada país. Então, para alguns países é preciso começar estabelecendo parâmetros sobre a Organização e a Justiça do Trabalho, o que aparentemente nós já superamos. Outros estão dedicados à necessária erradicação do trabalho escravo e infantil. Outros países ainda têm o problema da geração de empregos, como questão chave, mas empregos de qualidade. Daí a noção de trabalho decente.

Vermelho: Qual a situação do Brasil na questão do trabalho decente?
NV: Bom. Enquanto adoção de estratégia, o Brasil é um dos países que estão mais avançados. Tem uma Agenda Nacional do Trabalho decente desde 2003 e desenvolve dois dos programas mais conceituados internacionalmente, relacionados à erradicação do trabalho infantil e do trabalho escravo. Participa, inclusive, dos fórum internacionais dentro da própria OIT, que dirigem esta luta pela erradicação do trabalho infantil. Nós temos esta posição, mas identificamos que há muito que avançar. Nós temos uma Justiça do Trabalho estruturada, uma Procuradoria do Trabalho, um Ministério, com uma série de políticas públicas, um sistema público de emprego, garantias asseguradas para o grande contingente da população, mas temos ainda quase 50% dos trabalhadores na informalidade e pouca cobertura previdenciária, comparativamente. A luta pela erradicação do trabalho infantil e no combate ao trabalho escravo estão avançando, mas ainda há muito que se fazer também. Acidente de trabalho também é um dado que é bastante preocupante, mas comparativamente, no cenário internacional o que se destaca do Brasil é o seu esforço e seu avanço com vista a isto que se chama de trabalho decente.

Vermelho: Qual a região ou estado brasileiro com maior incidência de trabalho em condições inadequadas, ou seja, mais longe de ser decente?
NV: Isso depende do aspecto que se analise. Quanto mais desenvolvida a atividade econômica, maior o grau de formalização das relações de trabalho e com formalização, a garantia de direitos. Temos estados, por exemplo, que oferecem taxas altas de trabalho escravo. Tradicionalmente o Pará tem números expressivos em relação a isso, mas também o Mato Grosso. São exatamente as fronteiras agrícolas que enfrentam problemas de trabalho escravo. Em relação a acidentes de trabalho, alguns estados, proporcionalmente, aparecem com taxas mais expressivas. O Mato Grosso é um deles também. Então os dois pontos constam na Agenda Estadual do Trabalho Decente do Mato Grosso, como pontos a serem atacados. E, dentro dos próprios estados, no caso da Bahia, por exemplo, temos o resgate de trabalho escravo, que normalmente acontece no Oeste, zona de fronteira, ainda que a Bahia não tenha esta projeção negativa nacionalmente, em termos de grande quantidade de trabalhadores resgatados do trabalho escravo. Tem ainda o trabalho doméstico, que é um tema importantíssimo, objeto inclusive da Conferência Internacional do Trabalho, que acontece em Genebra, em junho. Este tema do trabalho doméstico será tema de uma convenção ou uma recomendação. Aqui no Brasil nós temos muitos aspectos a superar, principalmente no que diz respeito à formalização, que está na casa dos 30% em geral, caindo para 17% em algumas regiões. Temos muito que avançar em relação a isso.

Vermelho: A Bahia foi um dos primeiros estados a adotar uma Agenda de Trabalho Decente. O que em pé está esta Agenda hoje?
NV: Nós temos um reconhecimento internacional, em função do que eles chamam de ser primeiro subente nacional a adotar um Agenda do Trabalho Decente. Porque, até então, as agendas tinham caráter hemisférico, no
caso das Américas, ou nacionais: Brasil, Argentina e outros países. E nós inovamos criando uma Agenda no estado. Depois disso, o Mato Grosso também já criou e algumas experiências, como a cidade de Curitiba e a região do ABC, também criaram agendas locais. Nossa Agenda foi lançada em 2007 e de lá para cá, avançamos em diversos pontos. Temos um conjunto de prioridades – um total de oito – definidas através e a partir das conferências. Nós tivemos duas conferências estaduais do Trabalho Decente, uma em 2007 e outra em 2010. Entre estas prioridades, além da erradicação do trabalho escravo e do trabalho infantil, temos a igualdade no trabalho, em caso de gênero e raça, item importante a ser atacado. Tem também as frentes de juventude, trabalho doméstico, emprego verde. Então, são várias frentes em que nós atuamos. Estas frentes todas constituíram câmaras específicas, cada uma com objetivos e planos de trabalho definidos. E chegamos a um Programa de Trabalho Decente, que é conduzido por um Comitê Gestor, integrado por 27 instituições públicas e privadas. Públicas, nos âmbitos federal e estadual e privadas, no âmbito dos empregadores, empregados e entidades da sociedade civil, como a Associação de Magistrados do Trabalho. Ou seja, um conjunto de instituições da maior importância, que convergem suas ações para redução do que chamamos de déficit do trabalho decente. Portanto, melhorando os indicadores.

Vermelho: O secretário poderia citar algumas ações da Agenda Bahia do Trabalho Decente?
NV: Nós temos uma iniciativa com a OIT em duas regiões da Bahia: a Bacia do Rio Corrente e o Semiárido aqui do Nordeste. Nestas regiões acontecem um conjunto de iniciativas visando a erradicação do trabalho infantil. Estas eram regiões com as taxas mais altas. É feito todo um trabalho de mobilização junto às prefeituras e à sociedade, para garantir que não só estas crianças se afastem do trabalho infantil, como para dar suporte às famílias, através de políticas de transferência de renda, para que elas tenham condições de não demandar do trabalho infantil no complemento de renda. Há outras iniciativas relacionadas ao trabalho doméstico em diversas frentes, como um programa piloto habitacional para trabalhadoras domésticas, já que, vivendo no local de trabalho, ela é alvo do assédio moral e sexual. Por isso, é importante que se tenha um programa de financiamento habitacional especialmente para elas. Também desenvolvemos políticas de formalização, ações de comunicação e rádio, demonstrando que existem mecanismos de redução e desconto de imposto de renda para quem recolhe a contribuição previdenciária para a trabalhadora doméstica. Tem ainda as ações para que a categoria melhore a sua organização, eleve sua autoestima e qualificação profissional.

Vermelho: O que favoreceu este pioneirismo da Bahia na questão da Agenda do Trabalho Decente?
NV: A meu ver, uma compreensão do governador Jaques Wagner, que já foi ministro do Trabalho, que desde o primeiro momento apoiou e estimulou que a Agenda fosse desenvolvida. É preciso ressaltar que cabe à Secretaria do Trabalho a coordenação, mas se não fossem as secretarias de Administração, Saúde, Promoção da Igualdade, Justiça, Desenvolvimento Social e todas elas se comprometerem com as frentes que têm responsabilidade, nós não teríamos o êxito que temos até agora.

De Salvador,
Eliane Costa

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