Confira a íntegra do roteiro do episódio Trabalheira #3

Trabalheira é um programa da Rádio Batente, a central de podcasts da Repórter Brasil, cujo objetivo é discutir o futuro do trabalho
 26/08/2020

Roteiro referente ao programa Trabalheira #3: Será que um dia vamos trabalhar menos?.

Carlos Juliano Barros

Ana, você já ouviu falar do Elon Musk, certo?

Ana Aranha

Claro, pô! É o fundador da SpaceX e da Tesla, aquela montadora de carros elétricos e super tecnológicos. Num dia, as ações sobem. No outro, despencam. Uma loucura… Inclusive, o nosso presidente disse até que vai tentar trazer uma fábrica da Tesla pro Brasil.

Carlos Juliano Barros

O nosso presidente fala bastante mesmo. Mas, voltando ao Elon Musk, quantas horas por semana você acha que ele trabalha?

Ana Aranha

Vixe… aí você me pegou. Mas imagino que ele trabalhe bastante. Até porque a imagem do empreendedor de sucesso tá ligada a um certo “culto ao trabalho”.

Carlos Juliano Barros

Verdade. Aliás, “culto ao trabalho” é uma ótima expressão, hein? O Elon Musk diz nessa entrevista – que a gente tá ouvindo aqui no fundo – que ele trabalha de 80 a 100 horas por semana. Lembrando que aqui no Brasil, por lei, a nossa jornada de trabalho semanal padrão é de 44 horas. 

Ana

Essa fala do Elon Musk me lembrou o governador de São Paulo, o João Dória. Ele também adora dizer que trabalha sem parar.

Carlos Juliano Barros

Bem lembrado, Ana! Pra quem não lembra, o slogan da campanha dele pra prefeitura de São Paulo, em 2016, era “João Trabalhador”. Mas só pra não deixar passar: esse lance de “culto ao trabalho”, como você definiu bem, vai da direita à esquerda, né? É só lembrar que no portão do campo de concentração de Auschwitz tá escrito: “O trabalho liberta”. E, na antiga União Soviética, um mito muito difundido pelo próprio governo era o do “stakhanovismo”.

Ana Aranha

Stakha-o-quê?

Carlos Juliano Barros

Stakhanovismo. É uma referência ao Alexei Stakhanov, um operário que trabalhava numa mina de carvão. Na década de 30, ele foi condecorado pelo Stálin como símbolo do trabalhador soviético “produtivo”. Isso porque ele conseguiu retirar em um único turno mais de 100 toneladas de carvão numa mina na Ucrânia. A produtividade do Stakhanov foi 14 vezes maior que a média dos trabalhadores.  

Ana Aranha

Caramba! Esse assunto dá pano pra manga mesmo. Mas essa introdução já tá ficando longa… Então, sejam bem-vindos e bem-vindas a mais um episódio do Trabalheira, um programa da Rádio Batente . O mote do podcast de hoje é: será que algum dia a gente vai trabalhar menos? Eu sou a Ana Aranha. 

Carlos Juliano Barros

Eu sou o Carlos Juliano Barros, o Caju. A Rádio Batente é a central de podcasts da Repórter Brasil. Se você se interessa por assuntos relacionados ao mundo do trabalho, dá uma conferida no nosso site e nas nossas redes sociais pra conhecer mais! 

Aqui no Trabalheira o que a gente discute é o futuro do trabalho. 

[Vinheta]

Ricardo Abramovay 

O mais importante economista de todos os tempos, John Maynard Keynes, ele fez uma conferência em 1928 sobre o que vai ser a economia dos nossos netos. Nessa conferência, tinha duas previsões importantes. Primeira: a riqueza vai crescer de forma impressionante com o progresso técnico. Segunda: exatamente porque a riqueza vai crescer muito, haverá satisfação das necessidades das pessoas. E as pessoas, como elas terão suas necessidades satisfeitas, o processo de trabalho vai passar por uma redução de jornada drástica. Ele previa algo como 15 horas de trabalho (semanal). Ele acertou no que se refere ao aumento da riqueza e errou feio no que se refere à redução da jornada de trabalho. É interessante observar também que, do outro lado do espectro político, Marx também mostrava que o capitalismo tem uma capacidade cada vez menor de absorver trabalho.

Carlos Juliano Barros

Esse é o Ricardo Abramovay, economista e professor da Universidade de São Paulo.

Ricardo Abramovay

Essas duas referências são muito importantes para mostrar uma espécie de irracionalidade que existe no mundo contemporâneo que é esse paradoxo de que, apesar do impressionante aumento da riqueza, a queda na jornada de trabalho é muito pouco significativa diante do que ela poderia ter sido.

Ana Aranha

Keynes, Marx… É muito curioso mesmo como vários pensadores clássicos já refletiram sobre essa questão do tempo de trabalho. Parece que a humanidade tem um sonho, que nunca foi alcançado, mas que atravessa gerações e gerações, de trabalhar menos, né? 

Carlos Juliano Barros

Olha, Ana, se o limite de oito horas diárias valesse de fato, já taria de ótimo tamanho. (Risos)

Ana Aranha

Com certeza! Aliás, Caju, você sabe de onde vem essa convenção de que a jornada de trabalho deve ter oito horas?

Carlos Juliano Barros

Não faço a mínima ideia.

Ana Aranha

Então, no século XIX, durante a Revolução Industrial na Inglaterra, um ativista – se é que naquela época existia essa figura do “ativista” – chamado Robert Owen propôs uma divisão das 24 horas do dia em três momentos de oito horas. O Owen tinha um lema: “oito horas de trabalho, oito horas de lazer e oito horas de descanso.”

Carlos Juliano Barros

Entendi. Eu fico pensando no que o Robert Owen diria pro Jack Ma, o fundador do Alibaba – aquela plataforma digital chinesa que rivaliza com a Amazon. O Jack Ma é um entusiasta do regime 9-9-6, muito popular na China. 

Ana Aranha

9-9-6? Não captei a mensagem…

Carlos Juliano Barros

9-9-6 é o regime de trabalho que vai das 9 da manhã às 9 da noite, seis dias por semana. Tá bom pra você, Ana?   

Ana Aranha

Nossa! Na China, o culto ao trabalho foi levado a outro patamar, né? Mas já que a gente falou de Revolução Industrial, e a gente tá nessa pegada histórica, eu vou te  contar um causo da Primeira Guerra Mundial.

Carlos Juliano Barros

Primeira Guerra Mundial? Que bom! Fico feliz! As pessoas só falam da Segunda Guerra Mundial, né? Eu confesso que não tenho muita paciência pra esses filmes sobre a Segunda Guerra – “A Lista de Schindler”, “O Resgate do Soldado Ryan”. Se bem que “A vida é bela” é um filme bonito. Enfim,  só um desabafo rápido. Não espalha, Ana, por favor!

Ana Aranha

Pode deixar, Caju. É um segredo nosso… Vamos voltar ao nosso assunto. Eu li um artigo científico que é referência nesse tema, escrito por um pesquisador da Universidade de Stanford, chamado John Pencavel. Esse artigo analisa uma experiência muito interessante sobre jornada de trabalho e produtividade nas fábricas de munição da Inglaterra, durante a Primeira Guerra Mundial.

Carlos Juliano Barros

Eu imagino que durante a guerra a jornada de trabalho deva ter aumentado bastante, né?

Ana Aranha

Exato! Era comum que as pessoas trabalhassem 90, 100 horas por semana. 

Carlos Juliano Barros

Então, esse papo aí do nosso amigo Elon Musk não tem nada de novo! O povo já trabalhava que nem doido na Primeira Guerra Mundial.

Ana Aranha

E principalmente a mulherada! O John Pencavel escreve que, em 1918, cerca de 77% da mão de obra na indústria de munição era de mulheres. Mas o ponto central do artigo dele nem é esse. Ele conta que o governo inglês montou uma comissão pra estudar o impacto da jornada de trabalho na produção. E a conclusão foi a seguinte: pros homens, as jornadas deveriam ser de, no máximo, 65 horas por semana. Já pras mulheres (e crianças e adolescentes), a jornada não poderia superar 60 horas.

Carlos Juliano Barros

Caramba… 12 horas por dia! Basicamente, o que eles apontaram foi, na verdade, o limite da exaustão. 

Ana Aranha

Isso, a recomendação de diminuir a jornada de trabalho foi porque limitar as horas trabalhadas não faria diferença nenhuma em termos de produção. Ou seja, depois de um tempo, o trabalhador trava – e a produtividade desaba.   

Carlos Juliano Barros

Essa história me fez lembrar de um outro caso importante da indústria. Vamos sair da Inglaterra e partir pra Alemanha. Em 2018, o IG Metall, um sindicato bastante forte que representa cerca de 4 milhões de trabalhadores da indústria metalúrgica e eletrônica, anunciou um acordo com as empresas pra reduzir a jornada de trabalho de 35 para 28 horas semanais.

Ana Aranha

Uau! Jornada de 28 horas por semana – o que daria um pouco mais de 5 horas por dia, de segunda a sexta – é um sonho.

Carlos Juliano Barros

Na verdade, o acordo não impõe esse limite pra todos os trabalhadores. Ele abre a possibilidade de que os funcionários escolham uma jornada reduzida, de 28 horas, com uma redução proporcional de salário. Mas, se o trabalhador depois quiser voltar ao regime original de 35 horas, ele pode fazer isso. Agora, a gente tá falando dessa alternativa para quem quer trabalhar menos, mas o acordo também cria uma possibilidade para quem quer trabalhar mais. O limite máximo de 35 horas, que existiu na indústria metalúrgica e eletrônica por mais de três décadas, foi esticado pra até 40 horas.  

Ana Aranha

Entendi. Mas ainda que a Alemanha seja um país muito desenvolvido, essa possibilidade de redução de jornada conquistada pelo IG Metall não é a realidade de todo o mercado de trabalho por lá, certo? 

Carlos Juliano Barros

Certíssimo. Eu conversei sobre isso com o Ruy Braga, professor de sociologia do trabalho da USP, e ele fez uma análise bem interessante sobre as contradições do mercado de trabalho alemão. 

Ruy Braga 

Mesmo na Alemanha, que é um exemplo bastante contraditório. Porque por um lado você tem nesse setor, controlado pelo IG Metall, uma diminuição bastante drástica da jornada. Evidentemente, levando-se em conta o fato de que é um setor bastante qualificado, um grupo muito protegido de trabalhadores e que tem conseguido conquistas, tendo em vista o seu nível de organização sindical. Mas, mesmo na Alemanha, quando você observa o mercado de trabalho alemão, um contingente muito expressivo dos empregos na Alemanha são empregos precários e submetidos àquelas regras de contratação intermitente. 

Carlos Juliano Barros

Só um comentário rápido: o professor Ruy Braga tá descrevendo a dinâmica dos chamados “mini jobs”, aqueles trabalhos sem jornada fixa. Na prática, a pessoa pode até trabalhar pouco durante a semana, mas perde muito tempo à disposição, à espera da convocação pra um trabalho.

Ruy Braga 

Então, o jovem trabalhador alemão fica mais ou menos em casa, esperando ser acionado para cumprir algum tipo de serviço, para desempenhar algum tipo de papel no setor industrial ou no setor de serviços. E isso faz com que a vida dele passe a ser basicamente uma vida de trabalhos precários, de inserções muito precárias no mercado de trabalho, ou uma vida de espera por essas inserções, de aumento da insegurança. Os trabalhos de 500 euros na Alemanha se tornaram uma verdadeira febre. Se você desconta esses trabalhos de 500 euros, a taxa de desemprego na Alemanha é igual à do sul da Europa, ou seja, uma taxa bastante alta.

Ana Aranha

Fundamental essa discussão, hein? Precarização, insegurança… Daí a gente volta pro  mote deste programa: será que algum dia a gente vai trabalhar menos? Se a gente olhar pras estatísticas oficiais, dá pra perceber que, de forma geral, as jornadas de trabalho diminuíram no mundo todo, ao longo das últimas décadas. No site da Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Econômico, a OCDE, por exemplo, existem estatísticas nesse sentido. 

Carlos Juliano Barros

Então… Mas, como dizia um grande professor que eu tive, “estatística é a arte de torturar os números pra que eles confessem”, né, Ana?

Ana Aranha

Você adora essa frase, né, Caju? Parece disco riscado (Risos). Mas é por aí mesmo: o problema é que as estatísticas captam bem a realidade do trabalho formal e do chamado “main job”, o emprego principal das pessoas. Mas num mundo em que as pessoas têm cada vez menos um único trabalho, e gastam um tempão correndo atrás de várias ocupações, a gente precisa ter um pé atrás com esses dados que apontam pra  redução de jornada.

Carlos Juliano Barros

No caso do Brasil, então, em que 40% dos trabalhadores estão na informalidade, e com uma crise econômica que não passa nem por decreto divino, é ainda mais difícil acreditar que as pessoas estejam trabalhando menos. E também fica quase impossível medir, mensurar quanto tempo as pessoas estão de fato trabalhando porque não existe nenhum tipo de controle sobre o tempo de trabalho informal.       

Ana Aranha

Pois é… Eu queria trazer outro ponto importante pra essa discussão: a questão da produtividade. O professor Ruy Braga já adiantou o assunto quando ele disse que os trabalhadores do IG Metall – aqueles, que conquistaram redução da jornada pra 28 horas semanais – são altamente “qualificados”. Na Alemanha, país de primeiro mundo, com um bom sistema educacional, etc e tal, as pessoas na média têm uma formação melhor, uma qualificação maior que a da média do Brasil. E a lógica é a seguinte: uma maior qualificação permite um aumento de produtividade e, em tese, o aumento de produtividade possibilita que as pessoas trabalhem menos. Mas esse é justamente um dos nossos principais “gargalos”, como dizem os economistas: a nossa baixa produtividade.

Carlos Juliano Barros

Quem publica muitos dados e análises bacanas sobre produtividade é o Ibre – o Instituto Brasileiro de Economia, da Fundação Getúlio Vargas. 

Ana Aranha

Isso, o Ibre é que faz o “Observatório da Produtividade”, né?

Carlos Juliano Barros

Exato. E os dados mais recentes sobre a produtividade do trabalho no Brasil não são nada animadores. A produtividade ficou estagnada em 2018 e caiu nos três primeiros trimestres de 2019. O Ibre diz que aumentar a produtividade do trabalho é um dos mais – senão o mais – importante desafio da nossa economia.

Ana Aranha

Só um adendo rápido: produtividade é uma fórmula matemática, bem fácil de entender. É uma divisão do valor do que é produzido (seja um produto ou um serviço) pelo número de horas trabalhadas. Fica fácil entender esse conceito quando a gente assiste àquele filme – bastante dramático, por sinal – que já se tornou um clássico destes nossos tempos: “O engenheiro que virou Uber”.

Carlos Juliano Barros

(Risos) Ótimo exemplo!

Ana Aranha

É um exemplo bobo, mas é bastante didático: um engenheiro trabalhando dez horas numa empreiteira gera muito mais valor do que um engenheiro desempregado dirigindo dez horas pra um aplicativo. Sem falar que, quando ele fica fora da área de trabalho, ele não se atualiza e não evolui como profissional. Quer dizer: fica pra trás.

Carlos Juliano Barros

É um ótimo exemplo mesmo, Ana. A gente ouviu o Renato da Fonseca, economista da Confederação Nacional da Indústria, a CNI, que também pesquisa esse tema da produtividade há muito tempo.  

Renato da Fonseca

Eu diria que é um tripé que determina a produtividade de uma empresa: a gestão da empresa; a qualificação e motivação dos seus trabalhadores (o trabalhador tem que estar qualificado e tem que estar motivado); e a inovação, que é o investimento que essa empresa está fazendo em novas tecnologias. 

Carlos Juliano Barros

O Renato bate na tecla da “gestão”. Ele até deu um exemplo do dia a dia pra ilustrar  a importância de organizar melhor o trabalho.

Renato da Fonseca 

Eu lembro que eu estava exatamente falando sobre produtividade num evento, numa convenção, a gente parou pra almoçar. E aí tem aquele banquete de self-service, e o cara colocava o azeite no início do banquete. E aí depois vinha a salada. Então, a fila primeiro passava no azeite e depois na salada. E aí você botava a salada, você queria botar o azeite, você tinha que voltar pra fila. Ou seja, a fila não andava. É uma coisa que vc olha e fala: “pô, é o mínimo que um cara de um restaurante tinha que pensar”. Mas ele não pensou nisso.

Sem uma gestão adequada é difícil você aumentar a produtividade e é difícil introduzir as tecnologias digitais. Você coloca computador no seu trabalho, mas se seu trabalho é mal organizado, você está digitalizando a desorganização. Então, você não tem ganho de produtividade.

Ana Aranha

Além da “gestão”, que o  Renato da Fonseca explicou, é importante falar também das outras duas pernas desse tripé: investimento em tecnologia e qualificação dos trabalhadores. O que que é mais importante? Essa é uma pergunta difícil de responder, claro. E o debate corre o risco de virar uma espécie de “Dilema de Tostines”: é fresquinho porque vende mais ou vende mais porque é fresquinho?

Carlos Juliano Barros

Ana, você acabou de entregar sua idade pros ouvintes aqui do Trabalheira. Para quem não sabe, o “Dilema de Tostines” era o slogan de uma propaganda famosa das bolachas Tostines nos idos de… quando mesmo, Ana?

Ana Aranha

Deixa pra lá, faz tempo! Eu era criança e adorava bolacha de maisena… Mas voltando ao raciocínio: em geral, a gente tá  acostumado a ouvir que a nossa produtividade é baixa porque faltam trabalhadores qualificados, porque o nosso sistema de educação é ruim, etc e tal. É claro que não dá pra discordar dessa análise. Só que a gente tem também uma taxa muito baixa de investimento. E a crise piorou esse cenário. Mas vamos dar uma viajada, na verdade, uma sonhada aqui… será que se a gente tivesse um bom sistema de ensino, e uma mão de obra super qualificada, isso seria suficiente pra colocar a gente num outro patamar de produtividade? O Ruy Braga, que a gente ouviu há pouco analisando o mercado de trabalho na Alemanha, arrisca uma resposta pro Dilema de Tostines.    

Ruy Braga O problema da produtividade brasileira é uma coisa chamada formação bruta de capital fixo. A nossa taxa de investimento em equipamento é muito baixa, 13% do PIB, isso é nada. Os chineses estão há 40 anos investindo 40% do PIB em formação bruta de capital fixo. Aí é impossível. A produtividade brasileira sempre vai ser baixa, comparativamente. Por mais que o trabalhador se esforce.

A nossa taxa de educação era baixa na década de 50 e o país nunca cresceu tanto. Por quê? Porque você tinha investimento. Se você tem investimento, você tem educação. 

Qual é a diferença do Brasil para a Coreia? Não é o que se investiu em educação nos últimos 40, 50 anos. É que lá eles têm investimento para absorver essa massa de gente qualificada, que vai se requalificando. 

Você faz as coisas em paralelo. Você investe e qualifica. Investe e qualifica. E aí sim a economia se desenvolve.

Carlos Juliano Barros

Ou seja, o que o professor Ruy Braga tá dizendo é que a produtividade depende, fundamentalmente, de mais investimento. É claro que não dá pra descuidar da educação. Mas, se houver um investimento robusto, a própria demanda por trabalhadores bem formados vai elevar a qualificação da mão de obra. 

Ana Aranha

Exato. Em resumo, acho que essa é a opinião do Ruy Braga. 

Carlos Juliano Barros

Isso me trouxe à mente os exemplos dessas grandes obras de infraestrutura que acontecem, ou pelo menos aconteciam, no Brasil até um tempo atrás – hidrelétrica, por exemplo. Nas cidades que recebem os trabalhadores dessas obras, sempre tem um centro de treinamento do Senai, o Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial, pra qualificar a mão de obra. Fazendo reportagens pelo Brasil, eu já visitei algumas escolas do Senai. E eu me lembro bem dos papos com os professores: muita gente entra com sérias dificuldade pra ler e escrever, mas termina se formando em uma boa profissão, que o mercado de trabalho demanda. Aliás, Ana, um operador de guindaste super modernoso na hidrelétrica de Jirau, lá no rio Madeira, em Rondônia, me disse um dia – meio que brincando, meio que falando sério – que ganhava melhor do que muito jornalista por aí…     

Ana Aranha

Ah… mas não tenha dúvida, né, Caju! Bom, mas a xis da questão aí que o Ruy Braga colocou é como fazer girar essa roda de investimentos que vai provocar essa demanda por trabalhadores e estimular a qualificação da mão de obra. Tem os economistas chamados de “ortodoxos” que acreditam que o Estado precisa enxugar seus gastos pra atrair investimentos privados. Mas tem também aqueles que acreditam que o Estado precisa participar mais ativamente, usando recursos públicos pra alavancar a economia.

Carlos Juliano Barros

É, mas esse é um debate hiper complexo, que foge aos nossos objetivos aqui no Trabalheira, e que é feito todos os dias nas universidades, nos jornais, nas redes sociais. Bom… a gente já tá chegando ao final, e eu queria aproveitar pra dar uma dica cultural: é o documentário que ganhou o Oscar desse ano, o “American Factory”, que tá no Netflix. É bem legal ver como os chineses e os americanos enxergam esse lance do “culto ao trabalho”. 

Ana Aranha

Dando um cavalo de pau aqui na conversa, Caju, antes de terminar esse episódio do Trabalheira eu queria soltar o áudio de uma entrevista de uma modelo que uns três anos atrás estrelou uma campanha na internet da Fiverr. Pra quem nunca ouviu falar, Fiverr é uma plataforma americana de freelancers que oferece serviços de design, locução e edição a partir de módicos 5 dólares!      

Carlos Juliano Barros

Olha! Ela começa dizendo que, abre aspas, “todo mundo é um empreendedor” e termina falando que “você não tem nada a perder. Então faça!” 

E essa campanha tinha um outdoor bastante… polêmico, né? Polêmico, pra dizer o mínimo… 

Ana Aranha

“Polêmico” é bondade sua, Caju! O outdoor tinha o rosto dessa modelo com a mensagem: “Seu almoço é um café. Você faz o que precisa ser feito. Privação de sono é a sua droga preferida. Talvez você seja um fazedor”. Ou seja, se depender de empresas como a Fiverr, acho a gente não vai trabalhar menos, de jeito nenhum!

Carlos Juliano Barros

E que deixa pra falar do próximo episódio aqui do Trabalheira, hein? A ideia do nosso quarto programa é brincar com aquele célebre chavão de que “o trabalho dignifica”. E aí a gente vai responder se no fim das contas o trabalho realmente dignifica ou… danifica as pessoas. 

Ana Aranha

Parece que não foi nenhum estudioso das questões do trabalho quem fez essa troca aí do “dignifica” pelo “danifica”. Isso foi obra de um peso-pesado do boxe brasileiro. Mas a gente conta no próximo programa… 

Carlos Juliano Barros

O Trabalheira é uma produção da Rádio Novelo pra Rádio Batente, a central de podcasts da Repórter Brasil. A coordenação geral é da Paula Scarpin.

O roteiro original é de minha autoria, Carlos Juliano Barros, com a colaboração da Ana Aranha. O tratamento de roteiro é do Vitor Hugo Brandalise.

A edição e a montagem são da Juliana Santana, da Clara Rellstab e da Mari Romano. A música do programa é composta pela Mari Romano e pelo João Jabace, que também faz a finalização e a mixagem do programa. A coordenação digital é da Juliana Jaeger, e a distribuição é da Bia Ribeiro.

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Procura lá no feed da Rádio Batente, no seu tocador de podcasts preferido.

Valeu, Ana! Obrigado pelo papo, mais uma vez. Até o próximo episódio. 

Ana Aranha

Valeu, Caju. Até a próxima!

FIM

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