Pelo segundo ano consecutivo, irregularidades colocam JBS entre piores frigoríficos para MPF

Auditoria do Ministério Público Federal do Pará, que monitora se abatedouros compram gado de fazendas desmatadas, encontra 136.172 animais com "procedência duvidosa", dos quais 93.734 eram da JBS
Por Catarina Barbosa
 15/12/2022

A JBS lidera o ranking de frigoríficos com maiores irregularidades no abate de animais no Pará, segundo auditoria do Ministério Público Federal divulgada nesta quarta-feira, 15 de dezembro. Os dados da instituição mostram que a maior produtora de proteína animal do mundo abateu 93.734 animais com “procedência duvidosa” – o maior volume entre as 16 empresas que foram alvo de auditoria, que é um procedimento previsto pelo chamado TAC da Carne (sigla para Termo de Ajustamento de Conduta).

É o segundo ano consecutivo que a JBS fica em destaque negativo no levantamento. Em 2021, ela foi, além da empresa com maior volume de cabeças com origem questionável, também a que apresentou maior percentual de irregularidades: na ocasião 31,99% do total de suas compras apresentaram problemas. Em 2022, esse índice caiu para 16,73%.

JBS teve mais de 90 mil animais com “procedência duvidosa” nos abates feitos entre julho de 2019 e junho de 2020 (Reprodução MPF/PA)

A JBS contesta a metodologia do MPF, que utiliza como critério desmatamentos sem licença verificados pelo sistema Prodes, do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE), a partir de julho de 2008 — em linha com o que preconiza o Código Florestal. A JBS, porém, considerava como data de corte o ano de 2009. A diferença entre os critérios também foi a causa da irregularidade elevada detectada na auditoria de 2021.

“Esse descompasso já havia sido explicado na divulgação do ciclo anterior de auditoria. Desde então, a JBS passou a usar o Prodes 2008 como referência para suas compras para o bioma Amazônia”, garante a JBS. O MPF, porém, sublinhou que mesmo se o critério da companhia fosse utilizado na auditoria (Prodes 2009), a JBS teria 8,85% de compras irregulares, o que a manteria na liderança do ranking das piores do Pará. “A discussão acaba não mudando muito”, pondera o procurador da República do Pará, Ricardo Negrini.

Em nota enviada à Repórter Brasil, a JBS diz que “lidera os esforços do setor pecuária brasileiro para impulsionar o fim do desmatamento ilegal e a proteção da vegetação nativa em todos os biomas brasileiros” e reafirma “seu compromisso com o desmate zero na Amazônia até 2025”. A íntegra dos esclarecimentos pode ser lida aqui.

Auditoria de 2022 do MPF encontrou 16,73% de irregularidades em abates da JBS. Volume é alto, mas é menor do que o percentual do ano passado, que ficou em 31,99% (Foto: Fernando Martinho/Repórter Brasil)

Marfrig pode ser punida

Dezesseis empresas foram auditadas, mas 11 empresas consideradas relevantes pelo MPF do Pará não passaram pela auditoria, o que é motivo de preocupação. Além disso, 13 frigoríficos com elevado volume de abate não assinaram o TAC e portanto, também não são auditadas por esta iniciativa. Entre elas está a Marfrig, outra gigante da pecuária brasileira.

“Algumas empresas auditadas ainda precisam melhorar, mas todas estão sendo transparentes, o que é muito melhor do que aquelas que não apresentam auditoria”, condenou Ricardo Negrini.

MPF do Pará promete ser rigoroso com empresas que não assinam o TAC no estado ou não cumprem o compromisso de auditar suas compras (Foto: Catarina Barbosa/Repórter Brasil)

A partir de janeiro de 2023, essas empresas serão punidas, anunciou o MPF. As não signatárias, como a Marfrig, poderão ser processadas pelo MPF, que pretende ainda fazer recomendações aos supermercados para que evitem fazer negócios com os frigoríficos que não aderem aos protocolos do TAC. Já as empresas que estão no acordo, mas não fazem auditorias poderão ser alvo de maior fiscalização dos órgãos ambientais, além de correrem o risco de execução judicial dos termos do TAC — quando a justiça obriga o cumprimento do pacto. “Pode ser cobrada multa ou indenização”, afirma Negrini, esclarecendo que os valores ainda serão analisados.

No caso da Marfrig, a empresa encerrou as atividades no Pará durante o ciclo 2020/2021, mas como o período compreendido pela auditoria de 2022 contempla o tempo em que ela ainda operava no estado, o MPF solicitou que a empresa fosse incluída na auditoria. Em nota à Repórter Brasil, a empresa confirmou que “não vai assinar o TAC da Carne no Pará” porque já não tem mais atividades no estado. Entretanto, confirma que está passando por uma auditoria “junto ao Ministério Público Federal do Pará” que deve durar ainda 90 dias.

A empresa ressalta que assinou o TAC da pecuária em Mato Grosso e também o Compromisso Público da Pecuária, que é um acordo setorial com critérios semelhantes ao TAC e que os aplica para todas as suas unidades na Amazônia. “É importante ressaltar que esses acordos passaram por auditorias de terceira parte, realizadas anualmente desde suas assinaturas. Os relatórios das auditorias são públicos e estão disponíveis no website da Marfrig”, completa. A íntegra das respostas pode ser lida aqui.

Cobrança dos varejistas

O Ministério Público do Pará também está cobrando maior envolvimento dos supermercados na melhoria da conformidade ambiental da cadeia da carne. “Já existem em andamento recomendações do MPF ao setor, mas vamos estreitar o diálogo”, resume Negrini.

O procurador informou que os donos de supermercado foram chamados para a mesa, mas nem todos responderam. Entre os varejistas nacionais, apenas 6 de 13 redes estão dialogando com o MPF. “É preciso levar essa responsabilidade do desmatamento zero também ao mercado varejista. Afinal, eles estão preocupados com o desmatamento?”, questiona.

MPF acredita que supermercados podem ajudar a melhorar situação ambiental da cadeia da pecuária e estão encorajando redes a negociarem só com frigoríficos integrantes do TAC (Reprodução MPF)

A quarta edição das auditorias do TAC da Carne analisou transações feitas por empresas do setor frigorífico no Pará entre julho de 2019 e junho de 2020. O total de animais comercializados para abate ou exportação foi de 3.502.566, sendo que o volume auditado foi de 2.333.642, o que corresponde a 67% da produção do estado. Considerando esse total, o MPF encontrou 6,04% de inconformidades nas transações analisadas.

“Os números falam por si só, o grau de inconformidades está caindo e nesta edição temos o menor percentual, em termos absolutos, desde o início do processo”, celebrou Nergini.

Desde 2009, o MPF-PA monitora a cadeia produtiva da carne. Além do desmatamento ilegal, outras irregularidades apontadas pelas auditorias são ausência do Cadastro Ambiental Rural (CAR) ou licença ambiental rural vencida, por exemplo.


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