Repórter Brasil ajuda em investigação suíça sobre violações trabalhistas de fornecedores da Nescafé

Estudo da organização de mídia Public Eye detalhou casos de violações trabalhistas, acidentes de trabalho e baixa remuneração de fornecedoras de café para marca da multinacional suíça Nestlé
Por Repórter Brasil
 26/06/2024

Uma investigação publicada pela organização suíça Public Eye mostrou como trabalhadores que colhem o grão de fazendas fornecedoras de Nescafé, principal café solúvel do mundo, estão expostos a acidentes de trabalho e más condições de alojamento durante a safra. Parte desse trabalho foi realizado pela equipe da Repórter Brasil, que visitou fazendas brasileiras que fazem parte do “Cultivado com Respeito”, programa de sustentabilidade para fornecimento de café conilon para a Nescafé.

O Brasil está entre os 7 países responsáveis por 90% do fornecimento de café para a Nescafé. Segundo estimativas da empresa, 5,5 mil xícaras de Nescafé são consumidas a cada segundo nos mais de 175 países onde o produto é vendido. O grão do tipo conilon, mais barato e com mais cafeína que o arábica, é a matéria-prima base para a produção desse tipo de café solúvel. Em 2022, a produção de café conilon no Brasil chegou a 18 milhões de sacas. Desse total, 67% da produção foi colhida no Espírito Santo, que responde por 20% da produção mundial.

A investigação da Public Eye também detalhou a baixa remuneração dos cafeicultores que fornecem para a companhia suíça. Produtores mexicanos ouvidos pela organização afirmam que o preço pago pela saca de café, definido nas bolsas de valores de Nova York e Londres, é suficiente apenas para cobrir os custos de produção da commodity. Para a Public Eye, o programa de aquisição da Nescafé no México, onde o tamanho médio da propriedade é de 5 hectares, “está levando produtores de café à ruínas”. 

Trabalho de safristas

No Brasil, durante os meses de maio e julho, a colheita de café conilon atrai milhares de trabalhadores temporários para o Espírito Santo. O grupo é formado sobretudo por migrantes de municípios do sul da Bahia e do Vale do Jequitinhonha, no norte de  Minas Gerais. Dados de 2022 da Superintendência Regional do Trabalho no Espírito Santo estimam que 24 a 30 mil trabalhadores migrantes seriam contratados para a colheita do grão naquele ano.

Nesse período, homens e mulheres, por vezes famílias inteiras, ficam longe de suas casas para tentar ganhar um dinheiro que, em alguns casos, será a única fonte de renda fixa durante todo o ano. O pagamento é calculado a partir da produção, o que gera incertezas sobre quanto o trabalhador irá efetivamente receber ao final da safra.

A Repórter Brasil visitou o alojamento de diversas fazendas fornecedoras da Nescafé. Em Vila Valério (ES), um alojamento construído às margens da rodovia possuía 32 dormitórios, que contavam com um pequeno espaço para preparo das refeições com fogão, uma mesa, geladeira e armários. Cada quarto era dividido por 6 a 8 trabalhadores. 

Baixa remuneração aos produtores

A investigação da Public Eye também destacou o descontentamento com o preço pago pela saca de café aos produtores que forneceram para a Nescafé. Nem mesmo a bonificação paga pelo café com certificação – atualmente de R$ 3 por saca de 60 kg – tem sido um incentivo para os cafeicultores. 

Além dos fornecedores brasileiros, a Public Eye também contou com a colaboração de jornalistas do México, que mostraram as condições de vida e trabalho dos pequenos produtores de café fornecedores da gigante suíça.

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Acidentes com máquinas

Nas fazendas brasileiras maiores e com o relevo mais plano, uma máquina recolhedora de café auxilia na colheita. O equipamento puxa as lonas colocadas nas fileiras entre as os pés de café. Com um facão, o trabalhador corta os galhos da planta e os joga em cima do plástico. A recolhedora puxa a lona, que passa por três cilindros horizontais, responsáveis por jogar os galhos dentro do triturador. Nesse processo, os grãos de café são separados.

A investigação da Public Eye também mostrou a ocorrência de acidentes com as máquinas utilizadas para acelerar a colheita de café conilon nas fazendas capixabas. Reportagem publicada em março pela Repórter Brasil mostrou que, nos últimos dois anos, ao menos nove amputações e duas mortes foram registradas decorrentes de acidentes com a recolhedora de café. Em um dos casos, um jovem de 24 anos foi puxado para dentro do maquinário e não resistiu aos ferimentos. 

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