O amianto ou asbesto é um mineral fibroso reconhecidamente cancerígeno para os seres humanos. Uma vasta literatura médica mundial sustenta que não há maneira segura de se trabalhar com amianto ou utilizar produtos que o contenham, de modo que única forma de se eliminar as doenças provocadas por esta fibra mineral é o seu banimento.
O Brasil tem sete estados e dezenas de municípios com leis que vetam a utilização do amianto, incluindo o estado de São Paulo (lei 12.684/2007 de autoria do Deputado Marcos Martins do PT) e a capital paulistana (lei 13.113/2001, do ex-vereador do PMDB Antonio Goulart, atual deputado federal pelo PSD).
Desde longa data, porém, o lobby do amianto, capitaneado e financiado pela ETERNIT, tenta junto ao Supremo Tribunal Federal (STF), revogar estas leis estaduais e a do município de São Paulo. Tanto que, no dia 23 de novembro, ocorrerá o julgamento destas duas leis, que estão em vigor há mais de uma década em nosso estado e município.
A empresa busca, no mínimo, alterar a sua vigência para daqui a 5 anos para as fábricas de telhas de cimento-amianto e para mais 10 anos para a mineração, dando sobrevida a esta indústria mortal. Diante de tamanho retrocesso, cabe a nós defendê-las a qualquer custo, de forma a evitar mais um retrocesso socioambiental em nosso país, como temos assistido ultimamente.
Para se ter ideia do que está em jogo, a Organização Mundial da Saúde (OMS) estima que 125 milhões de trabalhadores e trabalhadoras em todo o mundo estão expostos ao amianto em seus locais de trabalho. Segundo estas estimativas, mais de 107 mil trabalhadores morrem por ano pelas doenças relacionadas ao material.
Por exemplo, o câncer de pulmão como o mesotelioma (um tumor maligno raro e incurável) é causado pelo amianto e leva ao óbito a maioria de suas vítimas em menos de 1 ano após o diagnóstico. A asbestose (enrijecimento do tecido pulmonar, que conduz à falta de ar acentuada e progressiva, podendo matar por asfixia) é outra doença associada ao material. Uma em cada três mortes por câncer ocupacional está associada ao amianto.
Mas o amianto não é um problema só dos trabalhadores e trabalhadoras, que se expõem às suas fibras microscópicas e letais. Pode atingir indistintamente familiares destes trabalhadores, vizinhos de minerações e de instalações industriais onde se produz e o manipula. Ainda estão expostos seus consumidores de mais de 3 mil produtos, confeccionados à base deste mineral, entre os quais os materiais de construção (telhas, caixas d’água, painéis, divisórias de cimentoamianto), e produtos de fricção para veículos automotivos (freios, juntas de cabeçote, massas antirruído, revestimento de disco de embreagem) e para vedação e isolamento térmico.
A OMS vai além e afirma que milhares de mortes podem ser atribuídas anualmente à exposição ambiental ao amianto, a qual todos nós seres humanos estamos sujeitos. Diante do alerta, 69 países já decidiram pela proibição da produção e utilização de produtos à base de amianto, inclusive nossos vizinhos Argentina, Chile e Uruguai.
No Brasil, por sua vez, Goiás é o único estado produtor do chamado amianto branco ou crisotila, do qual o país é o terceiro maior produtor mundial, com 284 mil toneladas/ano (dados de 2014), o terceiro exportador e o quarto principal utilizador.
Por aqui, embora as estatísticas brasileiras não reflitam o verdadeiro quadro de adoecimento da população, exposta profissional ou ambientalmente ao amianto, alguns indicadores já prenunciam que teremos por aqui em muito pouco tempo um quadro semelhante ao que se encontra nos países desenvolvidos economicamente e onde há registros confiáveis da epidemia de doenças provocadas pelo amianto, como é o caso da Austrália, Inglaterra, França, países escandinavos e Itália.
A falácia do desemprego
Sob uma perspectiva socioeconômica do emprego, a proibição total e definitiva do amianto salvará o estado de São Paulo da eliminação de 10.500 postos de trabalho nas empresas que já se adequaram às leis de banimento e substituíram o amianto por materiais menos tóxicos. Se esta lei não for mantida, as empresas paulistas sucumbirão aos produtos similares com amianto livremente importados da China. E mais: as empresas não suportarão a concorrência desleal dos produtos nacionais fabricados com a fibra mortal.
Os riscos por exposição ao amianto não são aceitáveis nem em nações desenvolvidas, nem naquelas de industrialização mais recente. Uma proibição ampla e imediata da produção e uso do amianto é de há muito esperada, completamente justificada e absolutamente necessária. Digamos não às tentativas de retrocesso.
*Fernanda Giannasi é engenheira civil e auditora-fiscal do Trabalho aposentada pelo Ministério do Trabalho em 2013. Fundadora da ABREA (Associação Brasileira dos Expostos ao Amianto) e coordenadora da Rede Virtual-Cidadã pelo Banimento do Amianto na América Latina. Ganhou diversos prêmios, entre eles o internacional “Segurança e Saúde – Direito de todo Trabalhador” da American Public Health Association (APHA)