Descoberta do pré-sal fez Brasil enfrentar interesse de petroleiras

Por conta das grandes reservas, a ideia do governo Lula foi mudar as regras sobre o setor de óleo e gás, com aumento da participação da Petrobras e maior peso da União nas licitações a serem realizadas na camada pré-sal.
Por Roberto Rockmann
 22/05/2018

A descoberta do pré-sal fez o presidente Luiz Inácio Lula da Silva, em seu segundo mandato, suspender os leilões de oferta de blocos de petróleo ao mercado, que desde o fim da década de 1990 ocorriam anualmente e segundo um cronograma oferecido ao mercado meses antes dos certames, a fim de criar um grupo de trabalho para que uma nova legislação fosse lançada.

Por conta dos grandes volumes, a ideia do governo federal foi mudar as regras sobre o setor de óleo e gás, com aumento da participação da Petrobras e maior peso da União nas licitações a serem realizadas na camada pré-sal.

Em dezembro de 2010, após aprovação na Câmara e no Senado, sancionou-se a lei 12.351, que alterou o regime de exploração e concessão no pré-sal. De agosto de 1997, quando se sancionou o fim do monopólio da Petrobras, a dezembro de 2010, vigorou no país apenas o regime de concessão, que garantiu às empresas vencedoras o direito de propriedade do petróleo e do gás natural extraídos após o pagamento das taxações, como os tributos incidentes sobre a renda (imposto de renda, contribuições etc.), participações governamentais e a taxa de ocupação da área.

Ou seja, após o pagamento dos tributos devidos, a empresa privada possuía direito sob todo o óleo produzido. Com a lei 12.351, alterou-se o regime de contratos na camada pré-sal e áreas consideradas estratégicas pelo governo federal.

A lei 12.351 estabeleceu o regime de partilha da produção somente para as áreas do pré-sal e aquelas tidas como estratégicas. No modelo de partilha, cabe à empresa contratante explorar e extrair o petróleo, em troca de uma parte de petróleo extraído. As reservas que não são extraídas continuam propriedade do Estado.

Nesse caso, o contratante é o único a fazer a exploração e assume todos os custos e riscos da operação. Como não tem qualquer direito de indenização por parte do Estado caso o campo explorado não seja comerciável, o contratante assume custos e riscos em troca de partilha da produção.

A lei também criou um Fundo Social e uma empresa pública (Pré-Sal Petróleo S.A. – PPSA) para gerir o excedente de óleo dos contratos de partilha da produção do petróleo. Também foi feita a exigência para que a Petrobras fosse operadora de todos os contratos na área do pré-sal com uma participação de no mínimo 30% sobre as áreas licitadas.

Nesse novo modelo regulatório, definiu-se como critério de decisão do leilão a parcela do petróleo excedente destinado à União, descontado o percentual da Petrobras (no mínimo 30%) e as taxações incidentes sobre a produção (royalties e impostos).

A nova legislação estabeleceu para 2013 o primeiro leilão sob essas novas regras. Em outubro de 2013, o governo realizou a primeira rodada de licitação do pré-sal, com poços do megacampo de Libra, na Bacia de Santos. O volume de barris recuperáveis é estimado entre 8 bilhões e 12 bilhões, o que representaria de 44% a 66% das reservas brasileiras.

As estatais chinesas CNPC e Cnooc, a Shell e a francesa Total foram vencedoras da licitação ao lado da Petrobras, que detém 40% do consórcio e, segundo regra do governo federal, sancionada em 2010, tinha de ser sempre a operadora e deter participação de ao menos 30% nos blocos ofertados.

Petrobras em crise: Dilma inicia venda de ativos

O cenário, no entanto, sofreu mudanças a partir do início do segundo mandato da presidente Dilma Rousseff. O controle dos preços de derivados, vigente entre 2009 a 2014, o preço do petróleo em queda para cerca de US$ 40, a crise econômica apertando as contas de várias fornecedoras e empresas do setor, como o Grupo EBX do empresário Eike Batista, as primeiras denúncias da Operação Lava Jato e dificuldades para rolar sua dívida, tudo somado posicionou a empresa como uma das mais endividadas do mundo.

No auge do pré-sal, na metade da década de 2000, a estatal tinha anunciado um programa de US$ 220 bilhões em investimentos e meta de chegar a quatro milhões de barris por dia em 2019, duas previsões que nunca se concretizaram. A ideia – produzir dois milhões de barris a mais por dia – era fazer em dez anos o que a empresa tinha demorado quatro décadas (a Petrobras atingiu em 2017 produção de 2,65 milhões de barris de óleo equivalente por dia, seu recorde).

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A Petrobras chegou a 2015 com uma alavancagem de 52% (acima dos 30% considerados adequados para uma empresa), com dívida líquida sobre a geração de caixa superior a cinco vezes (o ideal é abaixo de três vezes). Com isso, a presidente Dilma Rousseff e o conselho de administração da empresa iniciaram um plano de desinvestimento. Naquele momento, a empresa previa abrir o capital da BR Distribuidora, maior comercializadora de combustíveis do país, o que acabou ocorrendo em 2017, no governo Michel Temer.

No fim de 2015, a Petrobras anunciou a venda da participação de 49% na Gaspetro (que reúne distribuidoras de gás que respondem por cerca de metade do gás usado em residências e indústrias no Brasil) para a Mitsui Gás e Energia do Brasil, por R$ 1,93 bilhão. Em setembro de 2016, em negociação que tinha sido iniciada no governo Dilma Rousseff, mas foi concretizada nos primeiros dias do governo Temer (o impeachment foi sacramentado em 31 de agosto de 2016), a canadense Brookfield acertou por US$ 5,2 bilhões a compra da malha de gasodutos do sudeste da Petrobras.

Nos resultados da empresa anunciados em março de 2018, a alavancagem da petroleira chegou a 3,67 vezes em dezembro de 2017, ante 3,16 vezes em setembro do ano passado. A meta da companhia é atingir alavancagem inferior a 2,5 vezes em 2018. Nesse contexto, a empresa deverá continuar vendendo ativos e se concentrando em atividades mais rentáveis.

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