Síntese das Atividades da Repórter Brasil em 2018

Desde 2001, quando foi fundada, a Repórter Brasil busca fomentar a reflexão e ação sobre violações dos direitos fundamentais dos povos e trabalhadores no Brasil. Suas reportagens, investigações jornalísticas, pesquisas e metodologias educacionais têm sido usadas por lideranças do poder público, do setor empresarial e da sociedade civil como instrumentos para combater a escravidão contemporânea, um problema que afeta milhares de pessoas. Pelo trabalho que vem executando, tornou-se uma das mais importantes fontes de informação sobre trabalho escravo e tráfico de pessoas no país.

A organização se divide em três áreas de atuação: Jornalismo e Pesquisa, responsáveis pela produção de informação e análises que subsidiam lideranças sociais, políticas e econômicas; e Metodologia Educacional, voltada para difusão de informações sobre direitos e intercâmbio de conhecimento, envolvendo acadêmicos, educadores, trabalhadores e lideranças comunitárias. É importante destacar que o trabalho de todos os programas e projetos da organização atravessa uma mesma agenda temática, com diálogos e trocas constantes entre suas diversas atividades.

A instituição fortalece o trabalho desenvolvido pelas equipes de Educação, Jornalismo e Pesquisa através de articulação e representação em diferentes espaços. A Repórter Brasil tem suas contas analisadas anualmente por auditoria independente anualmente, que fica disponível na página de Transparência da organização.

Além disso, todas as informações sobre a entidade, sua estrutura, atividades e contas estão disponíveis em reporterbrasil.org.br/quem-somos.

ÁREA I: METODOLOGIA EDUCACIONAL

O Escravo, nem pensar! é um programa dedicado à prevenção do trabalho escravo, por meio da Educação, em locais do país com grande concentração de casos de trabalho escravo e de aliciamento de trabalhadores.

O programa se dedica principalmente à realização de formações para servidores públicos, como aqueles da Educação e da Assistência Social, a partir da elaboração e execução de metodologias específicas para abordar o tema do trabalho escravo e assuntos correlatos, como migração, tráfico de pessoas e trabalho infantil.  É importante ressaltar que as parcerias do programa não envolvem repasse de dinheiro para a organização por parte dos governos federal, estadual e municipal.

Ademais, o programa produz conteúdos didático-pedagógicos sobre essas temáticas em formatos diversificados, que são utilizados como referenciais por atores do poder público e da sociedade civil envolvidos com o combate ao trabalho escravo. O Escravo, nem pensar! também se dedica à produção acadêmica por meio da elaboração de artigos e participação em fóruns, debates, dentre outros.

Em 2018, após 14 anos de atuação, o programa alcançou mais de um milhão de pessoas prevenidas do trabalho escravo no Brasil. Ao longo de sua existência, seus projetos de educação foram implementados em 465 municípios em dez estados brasileiros: Bahia, Ceará, Goiás, Mato Grosso, Maranhão, Minas Gerais, Pará, Piauí, São Paulo, Tocantins.Para mais informações sobre o ENP! e seus projetos, acesse: escravonempensar.org.br.

I. Formações

1) Escravo, nem pensar! no Maranhão 2018

Dados técnicos:

  • 227.900 pessoas prevenidas do trabalho escravo
  • 72 municípios abrangidos
  • 271 escolas envolvidas
  • Parceria: Secretaria de Estado da Educação do Maranhão (Seduc-MA)
  • Status: Concluído
  • Mais sobre a formação

Nesta fase, o programa realizou formações servidores de unidades descentralizadas da Secretaria de Estado da Educação, chamadas Unidades Regionais de Educação (URE), sobre trabalho escravo e assuntos correlatos. O objetivo foi inserir a discussão sobre aliciamento e trabalho escravo na rede estadual de ensino. A ação foi distribuída em três encontros formativos, realizados ao longo de 2018, totalizando 56 horas presenciais. Foram selecionadas as UREs Bacabal, Barra do Corda, Caxias, Presidente Dutra, São Luís, Timon, Viana e Zé Doca, escolhidas por abrangerem comunidades vulneráveis ao aliciamento e à exploração de trabalhadores, bem como pelo elevado número de matrículas das escolas que administram.

Uma vez formados, os servidores foram responsáveis por multiplicar os conteúdos para os educadores das escolas, que, por sua vez, elaboraram projetos pedagógicos sobre o tema do trabalho escravo com estudantes. Por meio do desenvolvimento de experiências educacionais em 271 escolas em 72 municípios, mais de 227 mil pessoas foram prevenidas do problema no Maranhão em 2018. 

Esta é a segunda edição do macroprojeto de prevenção ao trabalho escravo do Escravo, nem pensar! realizado no estado. Na primeira, empreendida em 2015 e 2016, mais de 130 mil pessoas foram alcançadas. O fortalecimento da prevenção ao trabalho escravo é fundamental para reverter os atuais índices dessa violação no estado: o Maranhão é hoje a principal origem dos trabalhadores escravizados no país.

2) Escravo, nem pensar! no Tocantins 2018

Dados técnicos:

  • 181.024 pessoas prevenidas do trabalho escravo
  • 92 municípios abrangidos
  • 287 escolas envolvidas
  • Parceria: Secretaria de Estado de Educação, Juventude e Esporte do Tocantins (Seduc-TO)
  • Status: Concluído
  • Mais informações sobre o projeto

Seguindo a mesma estrutura metodológica do projeto realizado no Maranhão, foram formados profissionais da Secretaria de Estado de Educação, Juventude e Esporte do Tocantins, alocados em Diretorias Regionais de Educação (DRE) — unidades responsáveis pela administração das escolas no âmbito regional. Foram selecionadas as DREs Araguaína, Araguatins, Colinas do Tocantins, Gurupi, Palmas, Paraíso do Tocantins, Porto Nacional e Tocantinópolis. 

A formação foi realizada nas áreas onde o problema do trabalho escravo é historicamente presente, bem como em outras regiões vulneráveis ao aliciamento e à exploração de trabalhadores. A ação resultou na prevenção de 181.024 pessoas do trabalho escravo, por meio do desenvolvimento de projetos educacionais em 287 escolas em 92 municípios. O expressivo alcance territorial do projeto é de especial importância para o Tocantins, dado que 82 dos 139 municípios do estado já registraram resgate de trabalhadores.

3) Escravo, nem pensar! em Minas Gerais 2018

Dados técnicos:

  • 183.508 pessoas prevenidas do trabalho escravo
  • 91 municípios abrangidos
  • 258 escolas envolvidas
  • Parceria: Secretaria de Estado de Educação de Minas Gerais (SEE-MG)
  • Status: Concluído
  • Mais informações sobre o projeto

O Escravo, nem pensar! firmou uma parceria com a Secretaria de Estado de Educação de Minas Gerais para a formação de servidores da rede estadual alocados em Superintendências Regionais de Ensino (SRE), unidades descentralizadas da SEE. Assim como no Maranhão e no Tocantins, foram realizados três encontros presenciais distribuídos ao longo do ano, totalizando 56 horas de atividades formativas. Participaram da ação SREs da região metropolitana de Belo Horizonte e do interior, sediadas em Araçuaí, Paracatu, Patrocínio, Unaí e Varginha.

Os critérios de seleção dessas unidades foram os altos índices de vulnerabilidade socioeconômica das áreas que abrangem e o expressivo número de matrículas de suas escolas. A iniciativa alcançou 183.508 pessoas, entre alunos, educadores, demais funcionários de escolas e comunidades. No total, 258 escolas em 91 municípios mineiros desenvolveram projetos educacionais sobre o tema do trabalho escravo.

4) São Paulo (SP)

Esse projeto é dedicado às áreas da Assistência Social e da Educação. Abaixo, descrevemos as ações desenvolvidas com cada uma delas. 

Dados técnicos:

  • 66 pessoas prevenidas do trabalho escravo
  • Município: São Paulo
  • 35 escolas envolvidas
  • Unidades socioassistenciais: 14 CRAS, 12 CREAS, 2 CREAS Pop.
  • Parceria: Secretaria Municipal de Assistência e Desenvolvimento Social (SMADS) e Secretaria Municipal de Educação (SME) de São Paulo
  • Status: em andamento até o final de 2019

4.1. Assistência Social

Em 2018, o Escravo, nem pensar! deu continuidade ao projeto de formação continuada sobre migração e trabalho escravo para profissionais da Assistência Social do município de São Paulo iniciado em 2017 (vide item 1.3b da Área I: Metodologia Educacional na síntese das atividades da Repórter Brasil em 2017). Entre março e setembro, foram realizados três encontros formativos presenciais, com carga horária total de 18 horas, para servidores de Centros de Referência de Assistência Social (CRAS) e Centros de Referência Especializado de Assistência Social (CREAS) da capital paulista localizados nas regiões com as maiores concentrações de comunidades migrantes.

As atividades tiveram como objetivo aprofundar a discussão sobre o direito à migração e sobre trabalho escravo contemporâneo, bem como abordar assuntos correlatos a  esse crime, como recorte de gênero e trabalho infantil. Além disso, foram sistematizadas e avaliadas as experiências de multiplicação dos conteúdos abordados para os demais agentes das unidades participantes. Com a ação, foram formados 66 profissionais da área, de 14 CRAS e 12 CREAS, além de dois CREAS Pop (unidade destinada ao atendimento de população em situação de rua).

Com as referências obtidas na formação, profissionais da Assistência Social se tornaram preparados para identificar situações de trabalho escravo, encaminhar denúncias para as autoridades competentes, e atender as vítimas dessa violação de maneira qualificada. Ademais, a formação fortaleceu o atendimento dos servidores a migrantes internacionais, especialmente aqueles em situação de vulnerabilidade socioeconômica. Mais sobre o projeto aqui.

4.2. Educação

Neste ano, o Escravo, nem pensar! deu início à formação continuada sobre os temas do direito à migração e do trabalho escravo para coordenadores pedagógicos de escolas da rede municipal de ensino de São Paulo. Foram selecionadas as escolas que concentram o maior número de estudantes migrantes e descendentes de migrantes.

Em 2018, foram realizados cinco encontros formativos, divididos em dois módulos. No primeiro, distribuído em quatro encontros no mês de agosto, educadores participaram de atividades e dinâmicas e receberam referências e materiais relacionados aos temas do projeto. Para propiciar o estabelecimento de laços entre as escolas e a rede de entidades ligada às temáticas, o ENP! convidou entidades do poder público e da sociedade civil que realizam atendimento ao migrante e que combatem o trabalho escravo.

Após o primeiro módulo, coordenadores pedagógicos foram responsáveis por multiplicar os conteúdos para demais educadores de suas escolas, que, por sua vez, abordaram as temáticas com estudantes em sala de aula. No quinto encontro, em dezembro, foram apresentados os resultados parciais do processo de multiplicação e aprofundados assuntos dentro dos temas da migração e do trabalho escravo. Até o final de 2018, foram formados 51 educadores de 35 escolas, pertencentes a 13 Diretorias Regionais de Educação (unidades administrativas descentralizadas da SME). O processo formativo terá continuidade em 2019.

Estudantes migrantes e descendentes de migrantes sofrem com práticas discriminatórias e isolamento por parte de alunos brasileiros. Além disso, em muitos casos, esse público faz parte de famílias em condição de vulnerabilidade socioeconômica. Diante desse quadro, a iniciativa tem como objetivo reafirmar o direito à migração e ao trabalho decente, de maneira a coibir o estigma e o preconceito contra a população migrante e prevenir situações de exploração no trabalho, como o trabalho escravo. Mais sobre o projeto aqui.

4.3. Educação e Assistência Social

Em maio de 2018, a Repórter Brasil iniciou uma articulação entre o Centro de Integração de Educação de Jovens e Adultos Perus (Cieja), CRAS e CREAS do território de Perus, e o Centro de Referência e Atendimento para Imigrantes (CRAI). O Cieja é uma escola, administrada pela Secretaria Municipal de Educação, que atende a população adulta. Em 2016, seu corpo docente foi formado pela equipe do programa Escravo, nem pensar! no contexto do projeto “Migração como um Direito Humano: Rompendo o vínculo com o trabalho escravo”, em parceria com a SME. À época, a escola contava com quatro alunos haitianos; passados dois anos, estão matriculados mais de 500 alunos do Haiti.

As entidades perceberam que desempenhavam ações complementares e que o atendimento cotidiano poderia ser potencializado, qualificando o trabalho que Educação e Assistência Social desempenham para a comunidade haitiana na cidade.

Assim, a Repórter Brasil indicou a realização de um mutirão de atendimento para a população haitiana como forma de reunir em uma só atividade as principais ações de cada uma das entidades dessa articulação. Esse mutirão foi sediado no Cieja por este ser o local de referência da comunidade haitiana. Além de estudarem lá, os haitianos têm nesse espaço um ponto de sociabilidade importante. No mutirão, organizado em 29 de novembro, foram atendidas 99 pessoas pelos serviços públicos presentes. O evento contou ainda com as diversas atividades, dentre as quais oficinas, palestras, mostras de filmes e atendimentos sociais, como indicado na programação.

5) Carapicuíba (SP)

Dados técnicos:

  • 10 pessoas prevenidas do trabalho escravo
  • Município: Carapicuíba
  • Unidades socioassistenciais: três CRAS e um CREAS
  • Status: Concluído

No dia 10 de julho de 2018, o Escravo, nem pensar! realizou uma oficina para profissionais de CRAS e CREAS de Carapicuíba (SP) sobre os temas da migração e do trabalho escravo. O município concentra oficinas de costura nas quais migrantes sul-americanos já foram encontrados em situação de trabalho escravo. Diante disso, surgiu a necessidade de capacitar servidores da Assistência Social para proporcionar atendimento qualificado para a população migrante vulnerável à exploração no trabalho. A atividade teve duração de cinco horas e contou com a participação de dez pessoas.

II. Materiais

1) Publicações

As publicações impressas ficam disponíveis em versão digital tanto na seção Publicações, do site da Repórter Brasil, quanto na Biblioteca do Escravo, nem pensar!. Em 2018, foram elas:

Além desses materiais, todos os projetos de formação contam com publicações específicas dedicadas a educadores e profissionais da Assistência Social participantes. “Mão na Massa” e “Caderno do Educador” são publicações que servem como referência metodológica para replicação do conteúdo nas unidades escolares e de assistência social.

2) Audiovisual

2.1. Quem não é migrante? – Migração e educação em São Paulo

Em 2016, o ENP! formou educadores da rede municipal de ensino de São Paulo sobre os temas da migração e do trabalho escravo por meio do projeto “Migração como direito humano: rompendo o vínculo com o trabalho escravo”. 

A partir dessa ação, uma das escolas participantes — a Escola Municipal Infante Dom Henrique — desenvolveu o projeto “O migrante mora em minha casa”. A iniciativa trabalhou questões como a retomada de casos de migração na história familiar dos alunos, identidade cultural e os atuais fluxos migratórios para São Paulo. Já sobre o tema do trabalho escravo, estudantes e professores realizaram pesquisa e panfletagem no bairro do Pari, que possui registros de trabalho escravo em oficinas de costura.

Por causa do projeto, a professora de História Rosely Marchetti Honório recebeu o prêmio “Educador nota 10 – 2017”, da Fundação Victor Civita.

2.2. Haitianos: migração e educação em São Paulo (SP)

O vídeo apresenta o trabalho de integração de migrantes realizado pelo Centro de Educação de Jovens e Adultos (Cieja) Perus I. A escola, localizada na zona norte de São Paulo, recebeu e matriculou mais de 400 migrantes haitianos nos últimos dois anos. Para atender esse público, o Cieja oferece aulas de português e provê orientações para a utilização de serviços públicos na cidade, além de desenvolver atividades culturais para promover a integração com a comunidade local.

A iniciativa do Cieja Perus I de acolher e elaborar processos de aprendizagem específicos para haitianos é resultado da formação que educadores da escola tiveram com o projeto “Migração como direito humano: rompendo o vínculo com o trabalho escravo”, realizado pelo ENP!, em parceria com a Secretaria Municipal de Educação, em 2016.

A escola recebeu o prêmio “Territórios Educativos 2017”, do Instituto Tomie Ohtake, pelo trabalho que desenvolve atualmente.

III. Incidência política e pesquisa acadêmica

O Escravo, nem pensar! participa de fóruns de elaboração de políticas públicas de combate ao trabalho escravo e fomenta a articulação entre entidades do poder público e da sociedade civil em favor do combate ao trabalho escravo. O programa faz parte da representação da ONG na Comissão Nacional para a Erradicação do Trabalho Escravo (Conatrae) e nas Comissões Estadual e Municipal de Erradicação do Trabalho Escravo — a Coetrae-SP e a Comtrae-SP.

Em 2018, o ENP! participou de diversos eventos, como debates, palestras e discussões sobre trabalho escravo e temas correlatos, com o intuito de disseminar os conteúdos e metodologias do programa, bem como trocar ideias, experiências e desafios. Essa participação visa ainda sensibilizar membros da sociedade civil organizada, do poder público, da academia, do setor privado, e a sociedade como um todo para a temática.

Como exemplo, vale mencionar a XI Reunião Científica Trabalho Escravo Contemporâneo e Questões Correlatas, organizada pelo Grupo de Pesquisa Trabalho Escravo Contemporâneo (GPTEC), da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), sediada em Belo Horizonte (MG) entre os dias 23 e 25 de outubro. Natália Suzuki, coordenadora do programa, debateu a representação política de trabalhadores nas políticas públicas de combate do trabalho escravo.

ÁREA II: JORNALISMO E PESQUISA

Agência de notícias

Com 2,5 milhões visualizações no site, 7,8 milhões de interações e visualizações no Facebook, 61 reportagens publicadas e 7 mini-documentários produzidos, o programa de Jornalismo da Repórter Brasil manteve sua relevância no jornalismo investigativo brasileiro em 2018.

Além da tradicional cobertura de violações trabalhistas e socioambientais, a organização fez  importantes investigações relacionadas a políticos, financiamento de campanha e possíveis conflitos de interesses, considerando o contexto eleitoral. 

A característica investigação de cadeias produtivas do agronegócio brasileiro também foi mantida, denunciando desmatamento e trabalho escravo na cadeia de fornecedores de grandes empresas. Em dezembro, foi lançada uma cobertura investigativa sobre agrotóxicos em parceria com a Agência Pública, por meio da página Por Trás do Alimento.

Em 2018, a gama de parceiros republicadores foi ampliada: além do UOL, da Carta Capital e da Mongabay (Estados Unidos), republicaram conteúdos da Repórter Brasil a Folha de S.Paulo, o El País Brasil e a revista Cláudia. A organização noticiou que Tereza Cristina, então deputada federal e atual ministra da Agricultura do governo Bolsonaro, recebeu doações em 2014 de empresas ligadas a agrotóxicos, enquanto, ao mesmo tempo, desempenhou um dos principais papéis na defesa e na articulação do Projeto de Lei 6299/02, conhecido como PL do Veneno. A reportagem foi manchete no El País Brasil.

Além disso, o UOL deu como manchete a Escravos do Ouro, reportagem sobre exploração de mão de obra análoga à escravidão em um garimpo ilegal no Pará. A Folha de S.Paulo republicou reportagem sobre o ministro do Trabalho do governo Michel Temer, que foi multado por manter trabalhadores rurais sem carteira assinada. Já a revista Cláudia republicou artigo sobre as guardiãs da floresta, mulheres Guajajara que protegem seu território contra a destruição provocada por madeireiros, agricultores e caçadores. 

Em inglês, o site Mongabay publicou investigação exclusiva sobre Silvério Fernandes, principal acusador do padre Amaro, liderança da Comissão Pastoral da Terra (CPT) no Pará. Fernandes articulou com fazendeiros da região uma série de acusações ao religioso em um processo semelhante àquele feito com a missionária Dorothy Stang, antes dela ser assassinada em 2005. Em comum, ambos atuaram em Anapu, próximo a Altamira, uma das regiões mais violentas do Brasil. 

A parceria de investigação conjunta com o jornal britânico The Guardian também seguiu em 2018. Foi publicada uma investigação conjunta sobre a relação entre multinacionais de carros e fábrica de couro que utiliza gado do Chaco, região do Paraguai campeã em desmatamento ilegal e denúncias de trabalho escravo.

Todas as publicações do programa de Jornalismo estão disponíveis em reporterbrasil.org.br/jornalismo.

I. Ruralômetro e cobertura política

Em janeiro de 2018, foi lançado o Ruralômetro, ferramenta interativa e de utilidade pública que levanta a ficha socioambiental dos deputados federais brasileiros eleitos em 2014. Resultado de intenso trabalho de pesquisa, jornalismo investigativo e jornalismo de dados, ele oferece ao grande público uma importante ferramenta de consulta para o período eleitoral.  

Além de monitorar como esses políticos votaram em projetos de lei e medidas provisórias que têm impacto sobre meio ambiente, povos indígenas e trabalhadores rurais, o Ruralômetro revelou quais deles foram financiados por empresas que cometeram violações ambientais ou que foram flagradas com trabalho escravo.

Um mês antes das eleições, a ferramenta ganhou novas informações – como quais dos deputados eleitos em 2014 disputariam as eleições em 2018 e quais eram réus ou foram condenados pelo Supremo Tribunal Federal.

Ao longo do ano, o Ruralômetro gerou 10 reportagens sobre diferentes temas, dentre eles: comportamento da Câmara dos Deputados diante da agenda socioambiental; financiamento de campanha feito por empresas que já cometeram crimes ambientais ou que já foram flagradas com trabalho escravo; conflitos de interesses de alguns políticos e violações trabalhistas cometidas por alguns deles. Essas reportagens foram republicadas por alguns dos mais importantes veículos do país, como UOL e Folha de S.Paulo. 

Além disso, veículos como o britânico The Guardian, o norte-americano Mongabay, a sul-americana Telesur e o brasileiro Valor Econômico usaram o Ruralômetro para escreverem suas próprias reportagens, confirmando a vocação da ferramenta como fonte de informações.

Ainda na cobertura política, a Repórter Brasil se destacou com a denúncia exclusiva – posteriormente repercutida por todos os grandes jornais brasileiros – sobre o ministro do Trabalho do governo Temer, que pagou multa de R$ 46 mil por manter trabalhadores rurais sem carteira assinada.

O Jornalismo da Repórter Brasil revelou também que a ministra da Agricultura do governo Bolsonaro, que em 2018 era deputada, recebeu doações de empresas ligadas a agrotóxicos em 2014 ao mesmo tempo em que foi uma das maiores defensoras e articuladoras do projeto conhecido como PL do Veneno. Por fim, fez reportagens sobre o filho da atual senadora Kátia Abreu, Irajá Abreu, que legisla em benefício das empresas da família, e o filho do ex-governador de Minas Gerais, Newton Cardoso Jr., que também prioriza os negócios familiares.  

II. Violações trabalhistas e socioambientais

Na cobertura de trabalho escravo, área em que a organização é referência nacional e internacional, ela foi a primeira a denunciar o crime envolvendo venezuelanos em Roraima, em reportagem acompanhada por um mini-documentário

Além disso, a Repórter Brasil contou com exclusividade a história da fazenda de café certificada pela Starbucks que foi flagrada com trabalho escravo; acompanhou a história das filipinas escravizadas em um condomínio de luxo em São Paulo; viu de perto um garimpo de ouro no meio da Amazônia fazendo uso de mão de obra escrava; e revelou a relação próxima entre montadoras de automóveis europeias e fornecedores de couro paraguaios que exploram mão de obra em condições análogas à escravidão. Publicou as atualizações da lista suja do trabalho escravo, assim como as marcas da moda que foram autuadas mantendo, em sua rede de fornecedores, trabalhadores em situação análoga à escravidão.

No que tange à violência no campo, a Repórter Brasil foi a única agência de jornalismo presente no ato de um ano dos assassinatos na chacina de Pau D’Arco – a maior desde Eldorado de Carajás. Denunciou em vídeo as ameaças recebidas por lideranças rurais em diferentes estados brasileiros; contou a história de um dos maiores grileiros do país; e foi a primeira a entrevistar Padre Amaro, o sucessor de Dorothy Stang na luta pela reforma agrária no Pará, após sua saída da prisão.

Sobre a questão indígena, denunciou abusos da força policial diante do povo Guarani e Kaiowá; revelou como um deputado ruralista boicota uma dessas comunidades; e mostrou a batalha dos Ka’apor para expulsar madeireiros ilegais bem como a estratégia de diferentes comunidades para proteger seu território no especial multimídia Encurralados pelo Desmatamento. Em texto e vídeo, contou ainda como a indústria hoteleira pressiona e ameaça indígenas na Costa do Descobrimento, na Bahia.

Se, em 2017, foi feita uma relevante cobertura sobre a reforma trabalhista, em 2018 o Jornalismo da Repórter Brasil seguiu acompanhando o impacto gerado por essas mudanças na vida dos trabalhadores. Por exemplo, no campo, a Raízen – multinacional produtora de etanol – deixou de pagar a hora de deslocamento de seus cortadores de cana; a Justiça, entretanto, obrigou a empresa a manter o benefício. Denunciou como as condições de trabalho nos cafezais são as piores dos últimos 15 anos e revelou a multa que o banco Santander recebeu por violações trabalhistas. Um ano após a reforma, a Repórter Brasil mostrou como a nova CLT aumentou a informalidade, enfraqueceu os sindicatos e não gerou as prometidas vagas de emprego. 
A cobertura sobre agrotóxicos foi lançada em dezembro. O site especial Por Trás do Alimento reúne as investigações produzidas pela parceria entre Repórter Brasil e Agência Pública. A primeira da série de reportagens tratou dos agrotóxicos proibidos na União Europeia por danos causados à saúde humana e animal, mas que são campeões de venda no Brasil. Embora ainda no começo, a parceria produziu denúncias importantes em 2018, como a revelação da contaminação de mais de 50 crianças em escola do Paraná e o caso da multinacional norte-americana condenada por morte de trabalhador rural intoxicado em fazenda de abacaxi no Ceará.

III. As matérias e os especiais mais lidos em 2018

  1. Ruralômetro – medindo a febre ruralista dos deputados federais 
  2. Fazenda de café certificada pela Starbucks é flagrada com trabalho escravo 
  3. Deputado campeão de desmatamento, filho de Kátia Abreu legisla em defesa dos negócios da família 
  4. ‘Musa do veneno’: deputada Tereza Cristina recebe doações de empresários ligados a agrotóxicos   
  5. Pastelarias cariocas e empresas de alimentos do Rock in Rio estão em nova atualização da lista suja do trabalho escravo
  6. Exaustos, trabalhadores cortavam 22 toneladas de cana por dia para a Raízen 
  7. Agrotóxicos seriam causa de puberdade precoce em bebês, aponta pesquisa 
  8. Atuação da maioria dos deputados candidatos à reeleição é negativa ao meio ambiente e aos povos do campo 
  9. Deputado federal boicota programa de acesso a água para indígenas 
  10. Indígenas do Maranhão buscam romper com o resto da sociedade 

IV. Redes sociais

Em 2018, o Facebook alterou substancialmente o funcionamento de seus algoritmos, dificultando a disseminação de posts feitos por veículos de mídia. Com isso, o alcance dos posts da Repórter Brasil diminuiu, com maior impacto percebido na divulgação dos mini-documentários (veja a lista no item V. Audiovisual, a seguir).

Apesar dessas mudanças, o número de seguidores continuou a crescer. No início de 2018, a página da Repórter Brasil no Facebook contava com 130 mil curtidas e passou a 190 mil seguidores no final do ano. O Instagram da organização, por sua vez, chegou a 13,1 mil seguidores — 5,1 mil a mais do que no ano anterior. 

V. Audiovisual

A Repórter Brasil produziu sete mini-documentários em 2018 sobre diferentes temas: 

Todos os vídeos produzidos pela organização estão disponíveis em seu canal de Youtube e em sua página no Facebook.

Núcleo de Documentários

Ao longo de todo o ano de 2018, o Núcleo de Documentários se dedicou exclusivamente à produção do novo longa-metragem da Repórter Brasil. O filme aborda as transformações do mercado de trabalho geradas pelo surgimento de aplicativos e plataformas digitais que afirmam mediar a relação entre prestadores de serviço e consumidores finais. 

Dentre as categorias de trabalhadores retratadas no longa, encontram-se motofretistas, faxineiras, motoristas de aplicativo e profissionais de comunicação. Foram entrevistados vários especialistas, incluindo acadêmicos e autoridades, dentre os quais nomes de repercussão internacional. As filmagens se concentraram principalmente em São Paulo (SP), mas também foram feitas captações e gravações no Rio de Janeiro (RJ) e em Londrina (PR). 

A previsão de estreia do documentário é para o primeiro semestre de 2019. Assim como em outras produções da Repórter Brasil, o filme deve percorrer festivais dentro e fora do país e, num segundo momento, ter sua exibição negociada com canais de televisão fechada e plataformas de VOD (video-on-demand). O documentário deve ser veiculado publicamente na internet após essas exibições.

Centro de Monitoramento de Commodities e Agrocombustíveis

A Repórter Brasil desenvolveu e aplica uma metodologia para identificação e rastreamento de cadeias produtivas que permite revelar a conexão de empresas com problemas sociais, trabalhistas e ambientais. Essa metodologia permite que o Centro de Monitoramento de Commodities e Agrocombustíveis conduza investigações sobre as mais diversas áreas econômicas. 

Os resultados são publicados em reportagens e relatórios, ambos disponíveis no site da organização (www.reporterbrasil.org.br), e utilizados em atividades de advocacy junto a governos e empresas, a fim de pressionar por avanços nos padrões de sustentabilidade. Além disso, o Centro também realiza eventos temáticos para debater problemas de cadeias produtivas, reunindo representantes de empresas, associações de classe e trabalhadores, sociedade civil e Estado.

Em 2018, Centro de Monitoramento de Commodities e Agrocombustíveis produziu estudos, reportagens e vídeos, e atuou em diversos espaços, no Brasil e no exterior, para levar denúncias de violações aos direitos humanos e ao meio ambiente. 

Ao lado de parceiros de movimentos sociais, apresentou propostas de novas políticas públicas e corporativas a governos e empresas que apareceram mapeadas em seus levantamentos, como o ocorrido no congresso anual da Iseal Alliance, a associação global das certificadoras socioambientais.

Convidada pelos organizadores, a Repórter Brasil teve a oportunidade de apresentar suas denúncias sobre fornecedores de café da Starbucks no Brasil e alertar para o fato de a Cutrale, uma das maiores processadoras de suco de laranja do mundo, ter recebido um selo de sustentabilidade ao mesmo tempo em que fora incluída na lista suja do trabalho escravo

Na ocasião, a organização apresentou uma série de propostas para tornar mais efetivas as certificações, incluindo aceitar que a informalidade de trabalhadores deve impedir uma empresa de receber selo, reduzir o prazo entre as auditorias e incluir a lista suja como indicador de rompimento dos contratos. A principal conquista desse diálogo foi a decisão (ainda não oficializada) da Rainforest Alliance, um dos selos mais difundidos nas cadeias de exportação brasileira, de não mais certificar empresas citadas da lista suja.

A Repórter Brasil também lançou o primeiro site brasileiro que oferece gratuitamente conteúdos sobre temas sociais e ambientais relacionados à produção de suco de laranja, o Laranja Justa (www.laranjajusta.org.br). Nele encontram-se reportagens, vídeos e estudos produzidos pela organização e parceiros, discutindo os problemas da cadeia produtiva do suco desde a produção da fruta, passando pelo processamento pelas empresas até sua exportação. Parte dos materiais está disponível em dois idiomas: português e inglês. Seguindo o mesmo padrão, também foi lançado o site Café Justo (www.cafejusto.org.br). A ideia é que ele sirva como um hub para conteúdos que discutam questões sociais e ambientais relativas à produção do grão no Brasil, seu maior produtor e exportador global.

Além de pesquisas sobre suco de laranja e café, o Centro trabalhou em duas novas investigações sobre cadeias de suprimentos cujos produtos são exportados para o mercado europeu, especialmente o britânico. Os resultados foram base das discussões promovidas pela Nottingham University Business School. A investigação enfatiza as conexões das cadeias produtivas brasileiras com as empresas britânicas e as exportações para o Reino Unido. 

O primeiro estudo fornece dados sobre o impacto das leis antiescravagistas — principalmente a Lei de Escravidão Moderna do Reino Unido e a chamada “lista suja” do trabalho escravo no Brasil — no combate à escravidão moderna. As informações apresentadas incluem três subdivisões das indústrias florestal e madeireira, geralmente organizadas em diferentes cadeias produtivas: extração e beneficiamento de madeiras nobres tropicais na Amazônia; manejo de monoculturas de pinus e eucalipto para a indústria de compensados, especialmente no sul do Brasil; e manejo de monoculturas de eucalipto para suprir a indústria de celulose e papel – uma atividade presente em todo o centro-sul do Brasil.

Já o segundo relatório, sobre indústria da carne, aborda a realidade dos abusos dos direitos humanos na criação de gado no Brasil, enfatizando também suas conexões com empresas britânicas e exportações para o Reino Unido. A investigação oferece estudos de casos que ligam fazendas e empregadores flagrados com mão de obra escrava a empresas que exportam carne para o parceiro europeu. A Repórter Brasil encontrou várias empresas do Reino Unido – importadoras e varejistas – que mantêm relações comerciais com esses exportadores.

Os relatórios foram tema de dois seminários realizados no Rio de Janeiro, em parceria com a Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (PUC-RJ) e o BRICS Policy Center. Representantes de empresas e governos participaram do encontro, cujo objetivo foi a análise dos dados e a apresentação de recomendações para que os problemas fossem reduzidos.

Ainda em 2018, Centro de Monitoramento de Commodities e Agrocombustíveis organizou, em abril, uma atividade voltada à formação de jornalistas que atuam no movimento sindical rural; em maio, um evento internacional sobre a cadeia produtiva do suco de laranja; e, em novembro, um seminário de avaliação da Reforma Trabalhista.

Por fim, o Centro trabalhou na implantação do projeto Vozes da Moda, em Pernambuco, que visa melhorar das condições laborais dos trabalhadores da indústria da moda naquele estado. A Repórter Brasil produziu um estudo de rastreamento da cadeia produtiva e integrou a organização do Fórum de Diálogo Social, que levou representantes de governos, empresas e dos trabalhadores a debaterem soluções para o setor.

ÁREA III: ARTICULAÇÃO

A Repórter Brasil possui um conjunto de atividades com o objetivo de ampliar e aprofundar o combate ao trabalho escravo contemporâneo e ao tráfico de pessoas, juntamente com violações de direitos humanos correlatas. Para tanto, a organização desenvolve uma estratégia de articulação com os mais variados atores envolvidos nessas temáticas nos âmbitos municipal, estadual, nacional e internacional. Dessa forma, buscamos garantir a defesa dos direitos humanos e a dignidade a diversas populações, bem como evitar a utilização de justificativas sociais no erguimento de barreiras comerciais não tarifárias em mercadorias brasileiras vendidas no exterior. Nesse sentido, a organização tem contribuído com o desenvolvimento de políticas para a erradicação dessas violações.

A organização atua ainda junto ao setor empresarial para combater esse crime, através de diálogos com empresas e associações empresariais dentro e fora do país visando a sua mobilização e engajamento. Por fim, apoiamos as ações para a formação de atores públicos (como magistrados, auditores e procuradores), econômicos e sociais para o fortalecimento do combate ao trabalho escravo e ao tráfico de pessoas.

I. Comissões

A Repórter Brasil acompanha os debates sobre trabalho escravo nas comissões existentes, compostas por membros do setor público e do setor privado e por representantes da sociedade civil organizada. Em 2018, essa atividade se manteve.

1. Conatrae

Em 2018, A Comissão Nacional para a Erradicação do Trabalho Escravo (Conatrae) completou 15 anos de existência, contribuindo imensamente para a defesa da dignidade humana por meio do combate ao trabalho escravo no país. A Comissão realizou diversos encontros, entre reuniões ordinárias, extraordinárias e de grupos de trabalho sobre temáticas específicas. 

A Repórter Brasil integrou dois desses GTs. O primeiro foi o Grupo de Trabalho sobre Ações Penais, criado para levantar dados a respeito de condenações sobre trabalho escravo no âmbito penal em todo o Brasil. A pesquisa, inspirada no trabalho conduzido pela Clínica de Trabalho Escravo e Tráfico de Pessoas da Faculdade de Direito da Universidade Federal de Minas Gerais, visa a entender os desafios e as boas práticas no tratamento do tema no sistema judiciário.

A organização também fez parte do Grupo de Trabalho sobre Fluxo de Atendimento a Vítimas de Trabalho Escravo, criado a partir da demanda das comissões estaduais e de atores estaduais e federais presentes no Encontro das Coetraes de 2018. Realizado em outubro, no estado da Bahia, o evento apontou alguns desafios enfrentados no período após o resgate de trabalhadores em situações análogas à escravidão. O GT reúne entidades das duas esferas a fim de entender quais gargalos existem no atendimento a vítimas de trabalho escravo, procurando estabelecer um fluxo claro de encaminhamento. O grupo iniciou seus trabalhos no final de 2018 e continuará suas atividades em 2019. 

Ainda durante o Encontro, a Repórter Brasil discutiu o papel da sociedade civil na implementação do II Plano Nacional para Erradicação do Trabalho Escravo e os resultados parciais produzidos pelo programa Escravo, nem pensar! no âmbito das ações de prevenção. Os resultados finais serão sistematizados no começo de 2019 e apresentados ao colegiado da Conatrae.

Além disso, a Repórter Brasil participou ativamente de todas as reuniões convocadas pela Comissão. Destaca-se, por exemplo, as ações feitas em prol da manutenção das operações de fiscalização do trabalho. Em janeiro, uma dessas operações foi cancelada por falta de recursos para passagens. A preocupação com o orçamento para inspeções do trabalho já se apresentava em 2017, quando o setor sofreu redução de recursos. No âmbito da Conatrae, a Repórter Brasil, junto com outros membros, articulou pela não suspensão dos recursos para operações de fiscalização. Como resultado da pressão feita – pela Comissão, pela mídia e pela sociedade civil como um todo -, a Secretaria de Inspeção conseguiu recursos para não paralisar suas atividades ao longo do ano.

1.1. Carta-compromisso contra o trabalho escravo

A Carta-compromisso contra o trabalho escravo é uma iniciativa da Conatrae, executada pela Repórter Brasil. Desde 2006, ela serve como instrumentos de engajamento de candidatos a políticas públicas que abordam o tema da escravidão contemporânea. Em todo ano eleitoral, o documento é enviado a candidatos a cargos no Executivo. 

Em 2018, a Repórter Brasil entrou em contato com todos os candidatos à Presidência para que assinassem a carta. Dos principais nomes na disputa, apenas o presidente eleito Jair Bolsonaro não assinou o documento. Fernando Haddad, Ciro Gomes, Marina Silva, Geraldo Alckmin enviaram as cartas assinadas. 

Além disso, a organização acionou as Comissões Estaduais de Enfrentamento ao Trabalho Escravo (Coetraes) para que auxiliassem na distribuição da carta junto a candidatos aos governos estaduais. Destaca-se, nesse sentido, o fato de todos os candidatos ao governo do Tocantins terem enviado o documento assinado. 

Embora seu conteúdo foque em atividades ligadas ao poder Executivo, candidatos ao Legislativo manifestaram interesse no compromisso e também enviaram a carta assinada. Todas as assinaturas de 2018 foram publicizadas e estão disponíveis aqui.

1.2. Campanha Somos Livres

A campanha #SomosLivres, desenvolvida pela Ideal H+K Strategies e lançada em 2016, é uma realização da Comissão Nacional para a Erradicação do Trabalho Escravo (Conatrae), com o apoio do Ministério Público do Trabalho (MPT). A Repórter Brasil auxiliou no desenvolvimento da campanha, inclusive das fases seguintes ao lançamento. Em 2018, além fazer um monitoramento contínuo de projetos de lei que visassem a alterar o conceito brasileiro de trabalho escravo, a Somos Livres realizou ações em duas frentes principais. 

A primeira delas se conectou com os debates do período eleitoral, buscando pautar a questão do trabalho escravo antes do primeiro e do segundo turnos. Uma ferramenta de pressão pública foi colocada no site da campanha, permitindo que eleitores pudessem enviar um email solicitando que candidatas e candidatos aos governos estaduais e à Presidência assinassem a Carta-compromisso. Juntamente com a atuação da Repórter Brasil, a ferramenta foi essencial para que o documento fosse assinado por diversos desses candidatos. 

A segunda buscou aproveitar o momento da São Paulo Fashion Week para gerar conversas e discussões sobre as condições de trabalho na indústria da moda. Em parceria com a campanha #NãoSomosEscravosDaModa, do MPT, foi feita uma exposição em São Paulo, na Avenida Paulista, que mostrava algumas das condições enfrentadas por trabalhadores da indústria. No local, também foram realizados debates com importantes figuras do setor de moda e do enfrentamento ao trabalho escravo no Brasil. A Repórter Brasil participou do debate de lançamento da campanha do MPT e de inauguração do local. A Somos Livres também apoiou a campanha #NãoSomosEscravosDaModa com divulgação de vídeos e chamadas nas redes sociais.
Além disso, a Somos Livres desenvolveu a @Artigo149, em parceria com a Justa Trama e o Instituto Alinha. Por meio da marca fictícia, a campanha buscou defender o conceito de trabalho escravo e melhores condições de trabalho na indústria têxtil. Mensagens estampadas na camiseta traziam referências a memes de internet para chamar atenção do público nas redes sociais. Parte do trabalho desenvolvido com o Instituto Alinha foi gravado e incorporado no vídeo da campanha. A campanha procurou, ainda, conscientizar consumidores sobre como obter informações a respeito das condições de trabalho na indústria, divulgando o trabalho de organizações parceiras e iniciativas como o aplicativo Moda Livre.

2. Coetrae-SP

A Comissão Estadual para Erradicação do Trabalho Escravo de São Paulo (Coetrae-SP) retomou suas atividades em 2018, visando principalmente a assinatura do Plano Estadual para Erradicação do Trabalho Escravo. A Repórter Brasil aproveitou o momento para retomar sua participação na Comissão e acompanhar as novas atividades.

A organização esteve presente em duas das três reuniões realizadas em 2018. Na primeira, compartilhou algumas informações sobre a experiência de outras comissões estaduais com fundo para atividades de trabalho escravo e demonstrou preocupação, mais uma vez, com a demora na assinatura do plano. Em outro encontro, em setembro, a Repórter Brasil solicitou à Comissão a distribuição da carta-compromisso a candidatos ao governo do estado, conforme ocorrido em outros anos eleitorais. Não foram realizadas outras reuniões da Comissão Estadual em 2018.

3. Comtrae-SP

A Comissão Municipal para Erradicação do Trabalho Escravo de São Paulo (Comtrae-SP) realizou diversas reuniões ao longo de 2018, na maioria das quais a Repórter Brasil esteve presente. Ao longo do ano, as discussões centraram-se na alteração do decreto de regularização da Comissão, no seu regimento interno, e na criação de um fluxo de atendimento para vítimas. A primeira foi finalizada já em abril, com a publicação do novo decreto

A Repórter Brasil participou ativamente do grupo de trabalho para a oficina “Discussão de estratégias de prevenção do trabalho escravo na cidade de São Paulo”, realizada em junho. Seu objetivo foi mapear os fluxos de recebimento de demandas e de acolhimento e assistência a vítimas. A organização sistematizou os resultados da oficina, reunindo as atividades de cada membro e sugerindo maior aproximação da Comissão com a Secretaria Municipal de Assistência Social. Essa discussão foi fundamental para o colegiado refletir sobre o funcionamento do fluxo, desde o recebimento de denúncias até o acompanhamento de vítimas de trabalho escravo, e deve continuar em 2019. 

A questão do regimento interno seguiu por 2018 e deve ser finalizada no início de 2019. Além disso, a Comtrae também iniciou uma discussão sobre o processo de monitoramento do Plano Municipal, que deve começar de fato em 2019. Para tanto, contará com apoio da Organização Internacional do Trabalho, com base no piloto desenvolvido com a Repórter Brasil para o II Plano Nacional de Enfrentamento ao Trabalho Escravo. O plano municipal possui 58 ações divididas em cinco grandes áreas, cada qual com ao menos uma instituição responsável por sua execução. O colegiado debaterá e definirá os indicadores que nortearão esse monitoramento, bem como os prazos para sua realização.

II. Internacional

O desenvolvimento de redes internacionais e o fortalecimento da rede nacional são essenciais para combater o trabalho escravo. Daí a importância das atividades de articulação conduzidas pela ONG nesse âmbito, que visam fortalecer o diálogo entre sociedade civil, empresariado e administradores públicos e o monitoramento de suas ações nessa luta. A Repórter Brasil participa de reuniões com os mais diversos parceiros internacionais que buscam entender o contexto do combate ao trabalho escravo no Brasil.

A organização é considerada importante ator internacional no combate ao trabalho escravo e ao tráfico de pessoas, por isso, participa de ações globais coletivas, contribuindo com a elaboração de acordos e convenções internacionais e ministrando conferências sobre o desenvolvimento de políticas de combate a esse crime. É parte essencial do trabalho da organização a articulação com parceiros dos Estados Unidos, da América Latina, da Europa e da Ásia para o desenvolvimento da arena internacional de combate ao trabalho escravo e tráfico de pessoas e de monitoramento de cadeias globais de produção, inclusive compartilhando o modelo desenvolvido de pesquisa de cadeias produtivas.

Nesse sentido, a Repórter Brasil foi convidada a participar da edição de 2018 do Human Rights Defenders Forum, organizado por The Carter Center. O evento reuniu mais de 60 pessoas, dentre ativistas, defensores de direitos humanos e lideranças comunitárias de 25 países para discutir, dentre temas diversos, a defesa dos direitos econômicos e sociais e as diversas ameaças a direitos humanos. A Repórter Brasil buscou apresentar, dentro de uma perspectiva de direitos humanos e empresas, os problemas relativos a trabalho escravo e tráfico de pessoas nas cadeias produtivas globais, e a importância da transparência de dados para combater essas violações.

Além disso, a organização continua representada no conselho do Fundo Voluntário da ONU para Formas de Combate à Escravidão, na pessoa de seu diretor presidente, Leonardo Sakamoto. Em novembro de 2018, a Repórter Brasil participou da sessão ordinária anual, na qual o Fundo aloca recursos para projetos que atuem com vítimas de escravidão contemporânea. Para mais informações sobre as atividades do Fundo, clique aqui.
Nesse âmbito, vale destacar ainda a participação da Repórter Brasil na Liechtenstein Initiative for a Financial Sector Commission on Modern Slavery and Human Trafficking (FSC), uma parceria público-privada cujo objetivo é analisar o papel do setor financeiro na luta global contra a escravidão moderna e o tráfico de pessoas. Lançada em setembro de 2018, em evento na Assembleia Geral da ONU, a FSC realizará, ao longo de 2019, três consultas presenciais e vários encontros virtuais com especialistas do mundo inteiro para discutir como o setor financeiro pode atuar de maneira mais ativa nesse combate. O diretor presidente da organização, Leonardo Sakamoto, é um desses especialistas.

III. Outras atividades

A Repórter Brasil também realiza ações de conscientização sobre escravidão moderna, buscando, para tanto, organizar e participar de debates, eventos e treinamentos. Essas ações podem ser divididas em duas áreas principais, descritas a seguir.

1. Formações a agentes públicos

A Repórter Brasil esteve presente no XXVIII e XXIX Curso de Formação Inicial para os 18 novos juízes que tomaram posse no Tribunal Regional do Trabalho da 15ª Região. No evento, organizado pela Escola Judicial do TRT15, em janeiro de 2018, a organização participou da mesa-redonda sobre Programa de Erradicação do Trabalho Escravo. 

As datas de combate à escravidão, como o 28 de janeiro, servem de mote para que muitas instituições organizem debates sobre o tema. Não raro, essas atividades têm finalidade de sensibilização e conscientização, atingindo agentes públicos envolvidos no sistema de combate. A Escola Superior do Ministério Público da União, por exemplo, organizou o simpósio “O Trabalho Escravo e a Dignidade Humana”, no qual a Repórter Brasil participou do painel I: Desafios e Perspectivas no Combate ao Trabalho Escravo. O público era composto por agentes públicos diversos – como membros do antigo Ministério do Trabalho e do Ministério Público do Trabalho – e representantes da sociedade civil organizada e de comissões para erradicação do trabalho escravo.

A organização também ministrou uma formação, em abril, em Brasília, na Escola Superior do Ministério Público da União sobre trabalho escravo contemporâneo e políticas para o seu combate. Participaram procuradores do Trabalho e da República. Em outubro, esteve presente no 4º Seminário Nacional de Combate ao Trabalho Infantil e de Estímulo à Aprendizagem, organizado pelo Tribunal Superior do Trabalho (TST) e pelo Conselho Superior da Justiça do Trabalho (CSJT), com uma apresentação sobre “Trabalho Escravo Infantil”. O público era composto por magistrados e membros do sistema judiciário que buscam aprender mais sobre o combate a violações de direitos humanos, particularmente no âmbito do direito trabalhista e dos direitos da criança e do adolescente. 

Já em dezembro, a organização participou de treinamento oferecido como parte do projeto Dragão do Mar, coordenado pela Divisão de Fiscalização para Erradicação do Trabalho Escravo (Detrae), em parceria com a Ação Global para Prevenir e Combater o Tráfico de Pessoas e o Tráfico Ilícito de Migrantes (GLO.ACT). Aproximadamente 40 fiscais e promotores do trabalho do Brasil e da Colômbia participaram do encontro sobre identificação, investigação e intervenção de casos análogos à escravidão e de tráfico de pessoas. A Repórter Brasil apresentou seu trabalho de investigação de cadeias produtivas e a metodologia que utiliza para identificar trabalho escravo, bem como a importância de considerar toda a cadeia na investigação dessas violações.

2. Demais eventos

O diálogo com o público geral, a fim de conscientizá-lo sobre o tema do trabalho escravo contemporâneo no Brasil e torná-lo aliado no combate ao trabalho escravo, é também essencial nesse trabalho de disseminação. Para tanto, a Repórter Brasil procura ampliar seu alcance também realizando palestras e participando de eventos sobre trabalho escravo e temas correlatos. 

A edição de 2018 Conferência Ethos, organizada pelo Instituto Ethos, contou com participação da Repórter Brasil no painel “A trajetória dos compromissos e iniciativas para erradicação do trabalho escravo e infantil no Brasil”, no dia 26 de novembro, em São Paulo. A organização abordou o histórico e a situação atual do combate ao trabalho escravo no Brasil para um público diverso, com representantes dos setores empresariais e financeiros e da sociedade civil.

A organização apresentou o Ruralômetro no painel “Como transformar dados em reportagens de engajamento” durante a edição de 2018 do Congresso da Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo (Abraji). O congresso tem como objetivo debater os rumos do jornalismo no Brasil e no mundo. A Repórter Brasil vem participando de suas últimas edições, abordando diferentes temáticas, a fim de manter o diálogo com profissionais da área sobre cobertura de temas de direitos humanos.

Com objetivo de divulgar a metodologia de pesquisa para monitoramento de cadeias produtivas, a Repórter Brasil foi convidada a dar uma palestra sobre o tema para estudantes da Fundação Getúlio Vargas, em São Paulo, em maio. Por fim, foram concedidas entrevistas a veículos de comunicação nacionais e estrangeiros e a pesquisadores de pós-graduação de diversas áreas de conhecimento.

ASSINE NOSSA NEWSLETTER

Receba nossas
investigações no seu email

APOIE

A REPÓRTER BRASIL

Sua contribuição permite que a gente continue revelando o que muita gente faz de tudo para esconder